Doze

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Amanda ouviu vários barulhos na cozinha por um tempo, seguido de passos, então Malu apareceu na porta, segurando dois copos que antes eram embalagens de requeijão e a garrafa de vinho já aberta. Malu deu um copo para Amanda e serviu o vinho. Pegou um pouco para si e colocou a garrafa na escrivaninha, tomando cuidado para não deixar na beirada*.

- Eu vou te contar sobre a Eva, mas você tem que me prometer não contar para mais ninguém, você promete? - Malu esperou a resposta e recebeu um aceno dizendo para continuar - Eva era uma mulher que eu gostava muito, eu amava ela com todas as minhas forças...

- Uma ex? - Amanda interrompeu.

- Não, nós não chegamos a namorar - Malu falou olhando para o copo - Eu não estava pronta, ela queria alguém que fosse uma pessoa que eu não sou. Talvez alguém assim igual a você. 

Amanda ficou surpresa ao ouvir aquilo, sabia que não era bem um modelo de pessoa para se relacionar - e ela foi embora?

- Não, ela ficou. Ela foi ficando até que eu não conseguisse mais me ver sem ela - Malu disse relembrando - Eu me apaixonei perdidamente, mas não conseguia demonstrar, eu não conseguia ser o suficiente para ela. Ela queria mais, entende? Ela queria um amor tranquilo, alguém que levasse ela para sair, que fosse carinhosa e positiva. Eu não sou assim, eu nunca vou ser. 

Amanda prestava atenção em cada palavra, sentindo o peso que a história tinha para a outra, resolveu não interromper.

- No fim ela estava gostando de outra e não me falou, ela sempre me avisava que isso ia acontecer mas eu não acreditei. Eu continuei alimentando tudo o que sentia enquanto ela estava indo embora sem me avisar - Malu temia começar a chorar na frente de Amanda mas estava feliz em desabafar - Ela foi embora, de vez, não quis mais nenhum contato comigo e eu não suportaria ver ela com outra, de qualquer forma, foi o melhor. Agora eu acho que ela me odeia, nunca mais tive notícias.

Amanda se aproximou e pediu permissão para um abraço. Malu aceitou e viu Amanda se arrastando na cama em direção a ela, a abraçando pelos ombros. Malu apoiou seus braços na cintura da outra, sentiu o cabelo no seu rosto e pôde constatar o que já sabia, era extremamente cheiroso. O toque macio da camisa se misturava com o calor do corpo de Amanda, estava  confortável ali e ela quase havia esquecido de segurar as lágrimas, parecia seguro desabar.

- Esse deve ser o pior encontro da sua vida - Malu riu saindo do abraço e limpando uma lágrima no canto do olho.

- Eu já tive piores - Amanda disse brincando - sinto muito por ter tocado nesse assunto, não sabia que era difícil pra você.

- E foi por isso que Maria Luiza abandonou o amor romântico - deu risada parando apenas para observar Amanda enquanto ela também sorria, era uma visão e tanto, Malu quase não conseguia mais se conter - Será que é isso que a gente vê quando morre e vai para o céu? - pensou alto. Amanda juntou as sobrancelhas sem entender o que tinha ouvido e Malu pensou em um jeito de desconversar - Você sabia que tem covinhas quando sorri?

Malu enfiou o dedo na bochecha da outra para mostrar onde ficavam as covinhas. Continuou reparando no rosto dela pegando nas pontas do cabelo onde haviam alguns cachos se formando. Ela subiu o olhar, alternando entre a boca e os olhos de Amanda, que não piscavam.

Nesse momento Amanda já tinha parado de sorrir e estava com a boca semi aberta, tentando respirar em um ritmo normal mas falhando quando sentiu os dedos encostarem na sua nuca. Ela começou a se aproximar, sentindo o coração pular a cada milímetro que chegava mais perto da outra que também se aproximava, elas estavam indo devagar, o que era bom e ao mesmo tempo torturante. Quando finalmente conseguia sentir a respiração de Malu se misturar com a sua alguém buzinou lá fora. Malu soltou Amanda rapidamente como se tivesse saído de um transe e resmungou:

- Nossa pizza chegou.

Elas comeram em silêncio, talvez por vergonha, por medo, talvez porque queriam tentar de novo, mas nenhuma das duas tinha coragem de se pronunciar então apenas comeram, como se estivessem sozinhas com seus próprios pensamentos.

Malu resolveu pegar o notebook e colocou o primeiro filme que viu no catálogo. Elas estavam deitadas uma ao lado da outra, tomando cuidado para não encostar os braços. Malu estava tão concentrada em Amanda que não sabia o que estava acontecendo no filme, mas sabia cada vez que a respiração da outra mudava de velocidade.

Amanda estava em um impasse, não conseguia prestar atenção no filme. Pensou várias vezes em se aproximar, sentia o corpo pesado, como se estivesse lutando para não encostar no que queria, quase como um imã. Não sabia se Maria Luiza queria o mesmo que ela, elas tinham tido um momento antes da pizza chegar, ela sabia, mas agora Malu parecia distante e Amanda não queria ultrapassar nenhum limite. Ela sentiu o braço de Malu encostar no seu, olhou para ela que ainda olhava fixamente para a tela do computador, então empurrou mais o braço em direção ao braço esquerdo da outra, para criar um contato.

Maria Luiza estava dando risadas internas, nunca tinha sentido uma tensão tão grande, e elas estavam ali, deitadas uma com a outra em um encontro, mas não se atreviam a chegar perto. Sentiu o toque de Amanda, suspirou ao pensar no que ia fazer e em um ato de coragem colocou o braço direito por cima de Amanda, deitando em seu ombro.

Amanda soltou uma risadinha baixa enquanto colocava seu braço por baixo de Malu a envolvendo em um abraço. Deu um beijo de leve no topo da cabeça da outra e pôde sentir um aroma que parecia menta. Elas estavam ali, fingindo ver um filme que nem sequer lembrariam o nome depois, mas Amanda gostou disso, se sentia segura, em casa. Amanda sentiu seus olhos pesarem, vinho era quase um calmante para ela, mas ela não queria ir embora, não queria sair dali. Antes de se dar conta, acabou adormecendo.

Amanda e Maria LuizaOnde as histórias ganham vida. Descobre agora