Acordo em um sobressalto, gritando para que ela não faça o que fez. Sem conseguir controlar minha respiração, o ar me falta por certo tempo e desejo que falte para sempre.

O telefone toca, trazendo-me de volta para a realidade.

Que horas você chega, Hugo? — É Vic, minha irmãzinha.

— Devo chegar lá para uma da tarde.

Está tudo bem?

— Ótimo! — Limito-me a dizer isso. Não preciso encher a cabeça da minha irmã com mais problemas. Ela já parou boa parte da própria vida por muito tempo por minha causa. Eu deveria cuidar dela, não o contrário.

A nova empregada é ótima. Você vai adorar ela e...

— Não ligo para quem ela é. Só precisa fazer o trabalho dela e ficar fora do meu caminho.

De qualquer forma, Hugo, ela adorou o casebre e provavelmente é a única pessoa do mundo, além de mim, que vai aturar o seu mau humor.

— Preciso de você lá para...

Eu sei, Hugo, eu sei — suspira irritada, sou um dos poucos que consegue tirar a doutora Victoria Mendes do sério. — Até a tarde, irmãozinho. — Desliga.

Ignoro meus pensamentos que, inevitavelmente, me levam até o dia em que minha esposa simplesmente se atirou para a morte diante dos meus olhos e recolho todas as minhas coisas.

~*~

Felizmente o voo é rápido e o trânsito de São Paulo não está tão ruim como de costume, fazendo-me chegar em casa rapidamente. O táxi estaciona próximo da grande fonte redonda da entrada e então me lembro que Vic me avisou que tentaram entrar na casa e ela precisou trocar todas as fechaduras; tornando minhas chaves inúteis. O carro da minha irmã também não está em casa, o que significa que preciso que alguém abra a porta para mim fazendo com que o meu plano de não interagir com ninguém vá por água abaixo.

— Merda — praguejo já na porta, apertando insistentemente a campainha após um longo suspiro.

Uma mulher de cabelos escuros, de altura mediana e olhos indescritíveis abre a porta com um sorriso que, por um momento, consegue me desarmar, mas logo me recupero.

— Quem é você? — Ela se assusta com minha arrogância, mas não consigo evitar todas as palavras que passam a sair da minha boca, por mais que ela pareça que vai correr a qualquer momento de mim.

— Eu... e-eu...Meu nome é Helena. Cuido da limpeza — gagueja.

— Victoria! — chamo, mesmo sabendo que minha irmã não está em casa. Seus olhos curiosos e assustados me observam como se estivessem tentando me decifrar. — Victoria! Onde ela está?

Helena, com toda a educação que não estou tendo com ela explica-me e, antes que possa concluir, a interrompo mandando que peça para minha irmã subir quando chegar.

Subo as escadas irritado por tantos motivos que nem sei identificar qual deles é real. Entro no meu quarto batendo a porta, cada vez mais irritado, tiro minha roupa jogando em qualquer lugar e decido tomar um banho tentando, por um momento, ser menos o eu em que me transformei.

Sabendo que provavelmente minha irmã não vai demorar, tomo o banho rapidamente e volto para o quarto em busca de uma roupa. Olhando pela janela, consigo ver finalmente o carro de Victoria parado.

— Victoria!!! — Abro a porta e grito, quero resolver esse problema o quanto antes.

— Por que você tem de ser assim? — reclama logo que me vê.

— Aqui não. Vamos para o escritório.

— Então por que raios me chamou aqui em cima, seu idiota? — Minha irmã me dá um tapa na parte de trás da cabeça.

— Victoria!

— Toma! — Passa por mim e joga um pacote dos doces que Jaqueline adorava comer durante a gravidez e que acabou me viciando. — Não com paciência hoje, Hugo! — resmunga descendo as escadas.

A casa não é a mesma. Quando a comprei, a intenção era ter uma vida feliz com Jaque, um lugar onde nossos filhos pudessem crescer e onde viveríamos até o fim dos nossos dias.

Jaqueline odiou o lugar. Eu fiz errado ao não pedir sua opinião antes de fechar negócio e, somente quando voltamos da nossa lua de mel, apresentei o local a ela. Era nítida sua decepção quando chegamos.

Ela até tentou disfarçar, mas, antes de completarmos um mês vivendo no local, Jaque avisou que estava procurando um lugar novo para nós. Disse-me que não queria uma casa, ou filhos. Não sabia nem se queria ficar no país.

— Você me ouviu, Hugo? — Victoria chama minha atenção.

— Não, desculpa, eu estava...

— Lembrando dela?

— Conseguiu o comprador? — questiono.

Após a morte da minha esposa, os donos do apartamento começaram a me processar dizendo que "a situação é inconveniente e afasta potenciais compradores do imóvel devido às circunstâncias".

Tentando evitar mais problemas, decidi comprar o local contra a vontade da minha irmã, madrasta e advogado. E assim fiz. Porém agora estou completamente decidido a vendê-lo. O problema é conseguir um bom corretor, aliás, até um corretor mequetrefe, já que a família Santiago é dona de uma grande corretora de imóveis no país e ameaça qualquer um que tente me auxiliar neste problema.

— Você sabe que não é fácil, Hugo. Ainda mais agora... Eu estou tentando te contar já há um tempinho, porque eu quero que você seja o primeiro a saber.

— Vic, não me importa nada. Só me livrar daquele apartamento maldito. O anuncie por um real em jornalecos, que seja. Só quero me...

— Eu estou grávida — avisa me deixando sem palavras. — Eu... Eu te amo, Hugo, mas não posso mais adiar meus planos e minha vida por conta do que aconteceu com a Jaqueline. Também já tirei minhas coisas daqui. Estou voltando para casa.


Meu Viúvo - (COMPLETO)Onde histórias criam vida. Descubra agora