Capítulo L - Realiza-se o sonho de Mister Peggotty

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Havia, encostado à nossa casa, uma espécie de caramanchão de hera, ao longo de uma ramada, donde se descobria a estrada. Eu lançava os olhos para esse lado, pensando sempre numa infinidade de coisas, quando reparei em alguém que fazia menção de me chamar.

— Marta! — disse eu adiantando-me.

— Pode vir comigo? — perguntou-me ela com voz emocionada. — Fui a casa dele e não o encontrei. Escrevi num pedaço de papel o lugar aonde ele devia vir ter connosco e pousei o endereço em cima da mesa. Disseram-me que não tardaria a regressar. Tenho novidades a dar-lhe. Pode vir agora?

Respondi-lhe abrindo a grade para a seguir. Ela fez-me um sinal com a mão, como para prescrever paciência e silêncio e tomou o caminho de Londres; pela poeira que a cobria, via-se que tinha vindo a pé, a toda a pressa.

Perguntei-lhe se íamos a Londres. Fez-me sinal que sim. Tomei um carro que passava e seguimos nele os dois. Quando a interroguei aonde era preciso ir, respondeu-me: «Para o lado de Golden Square! E depressa! Depressa!» Depois encafuou-se a um canto, escondendo a cara com uma mão trémula e pediu-me de novo que guardasse silêncio, como se não pudesse suportar o som de uma voz.

Eu estava perturbado, sentia-me dividido entre a esperança e o receio; fitava-a para obter qualquer explicação; mas, evidentemente, ela queria permanecer calada e eu não estava disposto absolutamente a quebrar o silêncio. íamos avançando sem trocarmos uma palavra. Por vezes, Marta olhava pela portinhola, como se achasse que íamos muito vagarosamente, conquanto em verdade o carro fosse a bom passo, mas continuava a calar-se.

Apeámo-nos à esquina do square que ela indicara; disse ao cocheiro que esperasse, pensando que talvez tivéssemos necessidade dos seus serviços. Ela tomou-me o braço e arrastou-me rapidamente para uma dessas ruas escuras que serviam antigamente de residência a famílias nobres, mas onde agora se alugam, separadamente, quartos a um preço módico. Entrou numa dessas grandes casas, e, largando-me o braço, fez-me sinal para que a seguisse pela escada, que servia numerosos inquilinos e que despejava toda uma população de locatários na rua.

A casa estava cheia de gente. Enquanto subíamos a escada, as portas abriam-se à nossa passagem; outras pessoas cruzavam por nós a cada momento. Antes de entrarmos, eu tinha visto mulheres e crianças que espreitavam às janelas, por entre vasos de flores; tínhamos provavelmente excitado a sua curiosidade, porque eram as mesmas que vinham abrir as portas para nos verem passar. A escada era larga e comprida, com um corrimão maciço de madeira de talha; por cima das portas viam-se cornijas ornamentadas com flores e frutas; as janelas tinham grandes vãos. Mas todos esses restos de grandeza decaída estavam em ruínas; o tempo, a humidade e a podridão tinham atacado o soalho, que estremecia sob os nossos passos. Havia-se tentado fazer correr um pouco de sangue novo nesse corpo gasto peia idade; em diversos lugares, as lindas esculturas tinham sido reparadas com materiais mais grosseiros, mas era como o consórcio de um velho nobre arruinado com uma filha do povo: as duas partes pareciam não poder resolver-se a essa união mal combinada. Tinham-se tapado diversas janelas da escada. As que permaneciam abertas não tinham quase vidros nenhuns, e, através dos forros carunchosos que pareciam aspirar o mau ar sem nunca o expelirem, eu via outras casas no mesmo estado e mergulhava a vista num pátio acanhado e lôbrego, que parecia o depósito do lixo do velho solar.

Subimos quase até ao alto da casa. Duas ou três vezes julguei entrever na sombra as pregas de um vestido de mulher; alguém caminhava adiante de nós. Chegávamos ao último andar, quando eu vi essa pessoa parar defronte de uma porta, depois dar volta à chave e entrar.

— O que quer isto dizer? — murmurou Marta. — Então entra no meu quarto uma mulher que eu não conheço!

Eu conhecia-a. Com grande surpresa minha, tinha visto as feições de miss Dartle.

David Copperfield (1850)Opowieści tętniące życiem. Odkryj je teraz