Capítulo 2

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          Ao entrar na sala, Eloá se dirige prontamente ao seu lugar de costume, nem muito na frente, nem muito no fundo, no lugar onde as crianças que gostam de aprender mas que evitam chamar atenção sempre se sentam. Como de costume, todas as classes posicionadas em duplas foram ocupadas, exceto as três centrais da frente, onde uma menina com grossos óculos se sentava sozinha.

          Ofegante, Elô se senta e tira metodicamente seus materiais da mochila, os lápis de cor minuciosamente organizados e apontados ainda dentro da caixinha intacta que ela cuidava com zelo para não perder nenhuma de suas valiosas 24 cores, assim como suas 12 canetinhas, eram colocados no compartimento de baixo da classe junto do caderno de desenho e de um livro que ela tinha pego na biblioteca e que ela pretendia ler sempre que pudesse, até aquele momento, o livro parecia apenas uma loucura de acontecimentos escritos por uma criança que não faziam sentido algum, mas que era cheio de frases de efeito legais, chamava-se "Pequeno Príncipe", apesar de não entender nada, ela estava curiosíssima para saber o final daquele livro. Estojo e caderno diário eram organizados com perfeição sobre a mesa. Durante esse período em que os objetos eram alinhados sobre a classe como um valioso quadro seria alinhado em uma parede, as crianças passavam de olhos arregalados para ela e "cochichavam" (aquele típico cochicho de criança que qualquer um que queira pode ouvir à distância) sobre o que viam. Acontece que a corrida desesperada lomba e escada acima fizeram a pele do rosto de Elô, que era extremamente branca, ficar num tom assustador de vermelho. Imersa em sua organização, ela não percebe nada.

          Eloá sentava do lado de uma menina morena extremamente popular, tagarela e vaidosa chamada Mônica, cuja relação social era sempre intensa (ou era melhor amiga, ou uma mortal inimiga). Mônica gostava de Eloá, que explicava conteúdos difíceis com fluidez e sempre emprestava o caderno quando Mônica precisava, e Eloá gostava de Mônica, que falava por duas dispensando a necessidade de Elô ficar respondendo. Além disso, Mônica não se importava se Elô simplesmente saísse de perto dela a qualquer momento, já que ela sempre conhecia mais alguém para continuar a conversa. Eloá possuía uma grande admiração pela amiga, quase beirando a inveja, já que, além de extrovertida, a menina considerava a amiga extremamente bela e espontânea, coisa que ela não via em si mesma.

-Credo Elô! Achei que já tinha me acostumado com sua vermelhidão quando corre, mas hoje você se superou hein -Comenta Mônica, em um tom que era difícil identificar se era preocupação ou deboche. Elô, que finalmente sai de seu transe, coloca as mãos no rosto e sente ele inteiro queimar de calor contra suas palmas. Embora essa fosse uma situação comum de se ver, ninguém havia se acostumado completamente com isso. Percebendo a atenção indesejada dos colegas, Elô busca uma forma de resfriar seu rosto, respira fundo algumas vezes para se acalmar e busca uma garrafinha de água com gelo enrolada em um paninho que ela sempre levava para a aula. Enquanto pressionava repetidamente a garrafinha contra o rosto, a professora fazia a chamada e seus colegas respondiam. "Aqui", "Aqui", "Presente", "Presunto"...

          Esse era um dia importantíssimo para Eloá, que usava a água que escorria ao redor da garrafinha pra tentar ajeitar o cabelo volumoso. Ela era tomada pela ansiedade, logo a professora a chamaria na frente na turma e ela se sentia pavorosa, com nenhum espelho na mochila ela podia apenas imaginar como parecia para os outros, e que imaginação fértil e inoportuna! Hoje ela seria a Ajudante da Professora, título que todos podiam ter apenas uma vez no mês e se faltassem no dia perderiam a oportunidade no mês inteirinho. Essa era a função mais desejada na turma, buscar água, livros e chaves eram tarefas vistas como momentos incríveis de exploração e passeio pela escola, e ter o poder supremo de dedurar todos que fizessem bagunça na ausência da professora, podendo negociar a retirada de um nome da lista por um favor era impagável. 

          Terminada a chamada, a primeira grande tarefa foi designada à Elô: distribuir as atividades do dia anterior. Olhando para o chão e tentando esconder o rosto que ainda estava um pouco vermelho, ela pega as folhas e vai as distribuindo, até que ela chega no nome dos meninos do fundo. E agora? Elô não ficava olhando para trás, então ela havia associado inconscientemente todos aqueles cinco nomes a: meninos do fundo. Tinha apenas uma vaga ideia de quem era quem, e, enquanto pensava no que fazer, colocou essas folhas no final do bloco e continuou distribuindo as outras. Quando passou perto dos meninos, a uma fileira de distância, fingiu estar com preguiça de dar a volta nas classes, se debruçou sobre uma mesa que no momento estava vazia e entregou para o menino da ponta as folhas de todos os meninos do fundo, que não perceberam nada de estranho e entregaram as atividades uns para os outros. Mais uma missão concluída com êxito! - Pensa ela. Essa foi a coisa mais interessante que aconteceu naquela tarde. Incrivelmente, exclusivamente naquele dia, a professora não precisava de nada! No único momento que Eloá pensou que seria chamada novamente pagar pegar livros, a professora decidiu chamar três meninos. Elô se sentiu profundamente injustiçada, ela era bem mais forte que aquelas varetas! Pensava, mas não contestou. Era a preferida da professora e não queria correr o risco de perder esse título, mesmo que alguns colegas a zoassem por isso, ela sabia que ser a "queridinha" vinha com muitas vantagens, então só ignorava aqueles que ela chamava mentalmente de invejosos. Inclusive, chamar mentalmente pessoas por nomes depreciativos era uma coisa que ela fazia muito quando faziam algo pra ela, já que coragem e vontade para responder em voz alta estavam em falta. Na verdade, Elô conseguiria passar tranquilamente a tarde inteira sem falar nada, e ficava apavorada com a falta de capacidade das outras crianças de ficarem sequer uma hora inteira quietas. Odiava quando alguém ficava forçando ela a falar com perguntas idiotas que ela respondia apenas por educação, aliás, ela era muito educada, tanto que até ela mesma se sentia irritada consigo às vezes. -Você é tão calma que me irrita, sabia?- exclamava Mônica constantemente, enquanto Elô apenas ria da frase ingênua. "Não demonstrar irritação não significa que eu não esteja irritada, muitas pessoas raramente demonstram o que sentem" imaginou ela, pensando em sua família.

EloáWhere stories live. Discover now