Deixe as Flores Queimarem

0.1| deixe as flores queimarem.

R A C E R

Florence continuava evitando me olhar. Não havia como voltar daqui. Estava perdendo-a — não que em algum momento eu já a tivesse tido —, mas aquele brilho feroz que me deixava embriagado quando a via ou encontrava suas íris de azul meia-noite não estava mais lá. Uma parte de mim queria puxá-la em minha direção, saber o que estava pensando, e eu me odiava por isso. A verdade nos sentenciou antes da hora; era fatal, em algum momento ela descobriria. Era isso que eu queria por um tempo: vê-la sangrar, erodir cicatrizes tão profundas quanto as minhas. Derramar o veneno que flui em minhas veias, deixá-la ver as sombras irascíveis que há dentro de mim. Transformar seu amor por mim em caos.

As trilhas instáveis do meu fluxo de pensamento se perderam — o que provocou uma onda gigantesca de frustração — quando assisti seu lábio tremer, sua pequena e delicada mão apertando a carne do pulso. Ela não iria chorar, mesmo que seus olhos estivessem cheios de lágrimas. Ela não daria a satisfação de quebrar na minha frente, embora tudo nela gritava. Alguns anos atrás, eu me saciaria do seu sofrimento, mas agora? Queria estilhaçar a merda dos meus próprios ossos.

Eu queria seu desprezo.

Eu usaria como uma coroa.

Isso me mantinha seguro. Invencível.

Eu precisava do seu ódio, porque tornava tudo mais fácil.

Mas, quando Florence ergueu seu rosto e olhou para mim, nossos olhos nivelados, o chão sob meus pés rachou. Porque seria a última vez. Eu era capaz de ver as nuvens se formando sobre sua cabeça, torcendo e virando quando a escuridão pareceu atingi-la. Eu sorri, sem humor, sentindo algo se movendo sorrateiramente dentro de mim. Enxerguei nas águas tempestuosas dos seus olhos que havia conseguido. Ela entendia agora.

Florence nunca poderia me amar.

E eu era o único arruinado.

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