Os olhares de Murphy eram algo que eu também não conseguia compreender. Seus olhos sempre pareciam me seguir pela nave daquela sua maneira muda e séria. Agora era um desses momentos.

- O que foi? - questionei, na defensiva.

- Nada - ele deu de ombros, dando-se conta de que deveria comer sua gororoba também - É que você parece cansada.

- Eu não tive muito tempo para dormir tendo tantos reparos para fazer.

- Talvez se me deixasse ajudá-la - sugeriu - Eu não tenho muita coisa para fazer o dia todo além de ler e ficar observando os assassinos dorminhocos.

Eu também ficaria frustrada se toda a minha atividade consistisse de cuidar da vida de centenas de assassinos dormindo na criogenia.

- Se você soubesse conectar dois fios sem causar uma explosão eu até deixaria - dei uma risadinha.

Murphy resmungou, mas não podia discordar de mim.

Eu sempre pedia sua ajuda em tarefas que exigiam mais força e resistência, então, ele não estava sendo inútil de maneira alguma. Pelo contrário, eu detestava admitir, mas gostava da presença de Murphy. Ele tinha um jeito bem idiota de pensar, mas eu não podia negar sua genialidade em certos assuntos.

Terminei de comer e voltei para minha tarefa embaixo do painel de controle. Fiquei assim mais alguns minutos, até que um estrondo chacoalhou a nave toda. Foi tão rápido e violento que tudo o que senti no momento foi meu corpo sendo içado no ar por alguns poucos segundos, meu rosto quase acertando o painel acima de mim por centímetros e as mãos de Murphy agarrando minhas pernas fazendo meu corpo ser puxado para fora rapidamente. O painel no qual eu estava trabalhando rangeu e caiu no chão com um som alto de metal amassando.

Aquilo teria me esmagado se eu ainda estivesse embaixo dele.

Encarei Murphy impressionada e grata.

Com o movimento afobado, minhas pernas haviam ido parar de cada lado de seu quadril e ele havia caído por cima de mim, seu rosto pairando a poucos centímetros do meu.

- Você está bem? - perguntou, sua pele pálida estava corada pelo rompante súbito.

- Você está? - perguntei de volta, minha voz estava ofegante pelo susto e a proximidade súbita.

Ele não respondeu, tratando logo de procurar algum ferimento em meu rosto e deu-se por satisfeito quando não encontrou nada. Murphy também parecia bem.

- O que foi isso? - sussurrei, olhando em volta enquanto ele saía de cima de mim.

- Não faço a mínima ideia - deu de ombros e estendeu a mão para me ajudar a levantar.

Já de pé meu primeiro ato foi ir até os computadores acima do painel de controle arruinado. Avaliei a situação e soltei um palavrão logo em seguida.

- O que foi? - perguntou, Murphy se aproximando e olhando para a tela do computador como se estivesse vendo algum tipo de cálculo matemático impossível de solucionar.

- O sistema de aquecimento da nave está comprometido - falei quase gemendo de agonia.

- Mas não dá para consertar? - sugeriu, olhando para o meu rosto preocupado - Levar sua caixa de ferramentas para lá e trocar alguma peça quebrada?

Sacudi a cabeça.

- Pelo que estou vendo - murmurei, ainda olhando para a planta da nave e seus logaritmos - Toda essa área foi comprometida. Provavelmente foi algum pedaço de meteorito que perfurou o casco da nave e atingiu o maquinário.

ɪ ɴ ᴄ ᴇ ɴ ᴅ ɪ ᴀ | ᴍᴜʀᴠᴇɴWhere stories live. Discover now