O Novo Normal

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-Olá, Pedro!
-Oi Norma, tudo bem?
-Tudo!
-Paula vc já está aí?
-Sim
-Assim que Willian entrar vamos iniciar a reunião, ok?
-Já deve estar conectando. Pronto.
-Estamos todos aqui, iniciemos a reunião.
-Só um momento, meu microfone está bugado. Ok, tudo bem! Vamos lá!
E a reunião virtual começa, cada pessoa repassa a sua área, abre-se para o debate do projeto, decide-se,  despedem-se e se desconectam não sem antes confirmar o horário da próxima reunião.
Esse é o novo normal.

A mãe diz: Júnior venha que sua aula de inglês vai começar. E o garotinho sai do quarto acomoda-se em frente ao computador e assiste sua aula de inglês.

- Hoje vamos comer espetinho. Ok, então liga no delivery e faça o nosso pedido.

- Hoje as 17 hrs vamos fazer live geral. Vai entrar  seus avós lá de Florianópolis, os meus pais de São Paulo, mais sua  tia Rita do Rio Grande do Sul. -Atentem para o horário.
É no horário de Mato Grosso do Sul, OK?

- Mamãe, porque essas cadeiras estão marcadas com X, pergunta Aninha na ante-sala do pediatra.
- Porque esse é o espaçamento que tem que ter entre as pessoas diz sua mãe.

- Já lavou as mãos, pergunta Laura ao seu irmão de cinco anos. E ele responde naturalmente
- Sim, com bastante sabão, da ponta dos dedos até os pulsos, como o papai ensinou.
Há quatro meses atrás, em março de 2020 de um dia para outro o Júnior deixou de ir às aulas.
Ele não entendeu bem porque, mas como disseram que seria só por 15 dias aceitou numa boa.
Passados uns 30 dias perguntei
— E aí Júnior? O que vc está achando de ficar só em casa fazendo aula pelo computador?
Ele me respondeu
— No começo eu gostei mas agora já estou com tédio. Eu gosto do recreio, de brincar com meus amigos.
Pronto, uma resposta simples e verdadeira.

Estudar no sistema HomeSchooling era um tédio porque não há o que é essencial ao ser humano, tanto faz ter 9 ou 50 anos. A interação, o convívio, a socialização.
As aulas foram interrompidas desde a faculdade até a educação infantil.
Interessante que um pouco antes de 2020 houve um movimento dos pais pela educação domiciliar, pois já havia experiências dessa forma de educação por famílias americanas. Só que ninguém imaginava  que não seria por opção. Ninguém se preparou para isso. Foi rápido, de uma semana para outra as escolas fecharam suas portas e passaram a dar aulas on-line. Com certeza no ano de 2020 terá metade das crianças com aproveitamento escolar e passando de série. Haverá prejuízo sim na educação, pois uma grande parte da população não tem condições para assistir aulas via internet. E também tem pais que não tem conhecimento suficiente para ajudar nos estudos. Assim como há  professores que sequer tiveram tempo de se preparar para uma atividade que não fosse a de sala de
aula.
Quanto ao Home-Office qual tem sido a experiência?
— Oi mãe, diz a jovem senhora numa chamada de vídeo a sua mãe.
— Oi filha! Tudo bem? Tudo... estou fazendo um intervalinho aqui no trabalho e aproveitei pra saber de você.
— Mas vc já voltou ao trabalho?
— Eu não parei de trabalhar, mãe, eu apenas passei a fazer o meu serviço em casa.
— Ah sim, eu sabia. Mas é que você está arrumada como se fosse sair.
— Mãe, eu me arrumo como se fosse ao trabalho. É uma forma de me sentir no meu compromisso diário. Se eu vir para o computador de pijama, daqui a pouco me distraio, vou tomar uma água e já vou para o sofá ou volto para o quarto. A senhora não imagina como é difícil aprender a trabalhar nesse sistema.

Esse é outro exemplo de como as pessoas foram afetadas em suas ações mais corriqueiras em razão da pandemia do Covid-19 que ocorreu no início do ano.

As consultas médicas on-line talvez deram certo para psicólogos, pois a chamada de vídeo face a face, pode ter ajudado no sentido da melhor observação medico-paciente. As demais áreas médicas atuaram dessa forma o menor tempo possível. O paciente precisa da atenção pessoal e o médico de fazer o exame pessoal também.
As mudanças parecem sutis e pouco impactantes se olhadas superficialmente. Mas não são assim.
Percebe-se que as pessoas tem saudades da sua rotina, arrumar as crianças para a escola, tomar o café da manhã e saírem apressados cada um para seu compromisso, pois isso os faz sentir vivos, atuantes, com as rédeas da história, da vida.
Passar a tarde para tomar um café no shopping, passar na padaria para levar pão para casa, ir ao mercado, fazer a caminhada ou academia, ser livre.
A correria diária está fazendo falta. Enquanto parecia ser por pouco tempo, o ficar em casa foi o sonho, o oposto do que as pessoas viviam  e os momentos de curtir e "brincar" de casinha passou!
Quatro meses já e o que motivou tudo, a pandemia em si, não dá sinais de nenhum avanço positivo, só notícias de mortes, de aumento do contágio, não há prognóstico a curto e nem longo prazo e isso vai surtindo efeito sobre todos.
As pessoas estão valentes, isso é visível. Mas por quanto tempo mais?
O novo normal chegou para ficar, ao que parece. E não era sem tempo. Só não devia ter sido à custa de tantas vidas! E por outro lado, se não fosse a pandemia, a humanidade continuaria nessa busca desenfreada por progresso, com sacrifício dos recursos materiais, ambientais e pessoais?
Não saberemos. Mas que houve e está havendo mudanças no mundo pela desaceleração obrigatória que está acontecendo, isso é fato!
Os canais de Veneza com águas transparente e os cisnes nadando, a Torre Eiffel totalmente visível em seu esplendor, a cidade de São Paulo, sem sinal de poluição deixando  entrever o sol ... isso tudo nos mostram o quanto a quarentena da humanidade tem a ver com a recuperação da natureza, do meio ambiente e do planeta em que vivemos.
Infelizmente a um alto custo. Mas se não fosse assim, onde iríamos parar? Não sabemos.
Creio que este é um momento crucial, importante e único que nos está sendo dado para que repensemos  o mundo e o modo em que vivemos. Todos, sem exceção estão sendo convidados a olhar para a sua vida, sua casa, o modo que se relaciona com sua família, seu bairro, sua cidade, seu estado, o seu povo.
Tem muito a ser feito! Muito a ser estudado, a ser criado, modificado.
Governos terão que se desdobrar, se adequar, talvez venha uma época de novos homens serem os mandatários, homens e mulheres que encarem a vida pública como uma missão com compromisso e responsabilidade, como sempre deveria ter sido.
Até nas igrejas, como em todos os locais públicos também há regras de distanciamento, pessoas em todas as portas com o vidro de álcool gel  para passar nas mãos dos fieis, e tudo indica que esse será o novo normal. Aos poucos nos acostumaremos.
Os restaurantes estão criando novas formas de atendimento, já se vê mesas com barreiras que as separam umas das outras, todos os lugares públicos terão como um box privativo, para que não haja contato entre pessoas que não sejam da sua própria "bolha".
O novo normal afetará também a desigualdade social? Como fará a mãe que não tem como pagar internet para que seus filhos assistam aula à distância? Os jovens não terão acesso ao mercado de trabalho por não terem conhecimento suficiente nas tecnologias do mundo virtual?  O novo normal dividirá mais ainda os moradores de uma grande cidade? 
Quantas perguntas sem respostas!
Esperemos que a cura para a doença COVID-19 seja descoberta, que a vacina contra o coronavírus não demore a ser criada para que não precisemos nos acostumar ao NOVO NORMAL mas que a vida e suas alterações para melhor sejam para a humanidade, O NORMAL!

Contos da Quarentena 1- A pandemiaWhere stories live. Discover now