CAPÍTULO 2

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    Não era comum entrar em um colégio no meio do mês de março. A placa enferrujada escrita "Standart High School" era grande e chamativa, não seria despercebida por qualquer um que passasse ali.   
    Desdobrei o papel amassado que estava no bolso da minha calça e procurei o número da sala de aula. Comecei a andar um pouco mais rápido pois o sinal iria tocar em alguns minutos e eu não queria que todos os olhares fossem desviados para a aluna novata, que além de nova estava atrasada.   
    Assim que encontrei a sala, comecei a andar um pouco mais devagar. Passei pela porta e procurei pelos lugares vazios, que ficavam ao fundo da sala. No entanto, foi impossível não perceber os olhares tortos, garotas sussurrando umas com as outras e garotos rindo. A única carteira vazia, que ficava próxima à janela, era enferrujada, mas a vista que estava atrás do vidro me proporcionou um pouco mais de calma.   
    Algumas pessoas que estavam sentadas à minha frente, estavam olhando para meu pé, que estava calçado com um tênis preto, velho e desamarrado. Ok, tudo bem. Era certo que minhas roupas não eram adequadas para uma cidade fria, pois quando se mora em uma praia as pessoas procuram usar menos roupas possíveis. E era isso que eu fazia. E além disso, Tracy havia comentado por alto, em casa, que a temperatura estava mais alta do que nós últimos finais de inverno. Mas isso não me deixou menos constrangida com os olhares. Tracy prometeu que iríamos sair para comprar roupas novas assim que possível. 
    Em específico daquele dia, o professor demorou bastante para chegar na sala, o que me deixou mais nervosa. Sem saber o que fazer, peguei meu celular, coloquei os fones de ouvido e selecionei uma playlist qualquer. Depois de alguns minutos, senti alguém cutucar meu ombro. Tirei os fones e olhei para trás. Uma menina ruiva de cabelos curtos e óculos dourados estava olhando para mim e sorria amistosamente. Sua blusa amarela e seus brincos pratas combinavam com a cor castanha de seus olhos. 
     - Então... - disse a garota. - Você é a novata que o professor de biologia disse?
     - Sou? - respondi, sem graça.
     - Bom, você é a única pessoa nova na sala.
     Olhei ao redor daquela vastidão de pessoas procurando por alguém que estivesse tão desconfortável como eu.
     - Ahn... então sou. A menina deu um sorriso sem graça, mas caloroso. Aquilo me deixou um pouco mais animada.
     - Meu nome é Nicole Miller. - retomou a menina depois de sorrir. - Com dois L. As pessoas costumam errar muito.
     Ela estendeu sua mão para mim para que eu a apertasse. Assim o fiz.
     - Sou Eleanor. - eu disse, sorrindo também.
     - As pessoas me chamam de Nick.
     - As pessoas me chamam de Eleanor.
     - Mas Eleanor é um tanto quanto... Formal. Posso chamar você de Ellie?
   Achei aquilo engraçado e assenti com a cabeça. Nicole deu um sorrisinho e começamos a conversar.
     - Por que você se mudou pra cá? - perguntou ela. - E bem no meio do ano.
     Talvez ela fosse entrosada demais.
     - Problemas pessoais. - eu disse, tentando evitar de pensar no que aconteceu. - Não é nada demais.
    - Desculpe. - ela disse, colocando a mão na boca.
    - O dia que você se sentir confortável em conversar sobre... pode me chamar. Quase nunca fico ocupada.
     Dei um sorriso sincero e agradeci, sem jeito. Ainda estava um pouco arisca em relação as pessoas, mas decidi me abrir um pouco mais para ter pelo menos uma amiga. Eu estava cansada de estar sozinha.
     - Você pode me mostrar onde as pessoas almoçam por aqui? - perguntei, tentando deixá-la menos sem graça.
     - Claro! - disse Nicole, sorridente.
     - E eu também posso te mostrar o colégio, o campo de futebol, o vestiário... Enfim, tudo que torna isso aqui em uma escola. A cantina tem um burrito sensacional, acredite!
     Depois de me sentir disposta a ser amiga de Nicole, percebi que ela gostava muito de conversar. Ela aparentava ser uma pessoa muito carismática e engraçada. E era aquilo que eu precisava para espairecer.
    Assim que o professor entrou na classe, os olhares femininos foram diretamente redirecionados para ele. Ele era um homem grisalho, de uns quarenta anos, forte e usava camisas que mostravam seu peitoral definido.
    O típico homem que vive na academia, pensei.
    - Bom dia, professor! - disse uma menina morena, perto de mim. - Adorei a camisa!
    As meninas ao redor começaram a dar risadinhas e Nicole revirou os olhos.
   - O John detesta que elas façam isso. - disse Nicole. - Eu também iria odiar.
    Após o professor colocar suas coisas em cima da mesa, um garoto alto, com uma blusa preta polo e calça jeans entrou, segurando vários pacotes de folhas.
    - Turma! - disse John. - Prestem atenção, isso é importante. Esse é meu novo acompanhante nas aulas de Biologia, o senhor Jackson Campbell. Como ele está no último ano e seu horário está meio vazio, resolvi fazer essa caridade.
    - Vou fazer de tudo para deixar meu horário vago no próximo ano, então! - cochichou outra das meninas perto de mim e de Nicole.
   Novamente algumas risadinhas. E novamente Nicole revirava os olhos, balançando a cabeça negativamente.
    Jackson tinha olhos claros e cabelos castanhos. Seu cabelo tinha um corte típico popular. A blusa do time de futebol estava amarrada na cintura, mas após colocar os pacotes em cima da mesa, ele a desamarrou e a vestiu.
    Tentei prestar atenção nas explicações que o professor estava dando, mas abri o caderno e comecei a desenhar algumas flores na borda da folha. Minha cabeça definitivamente não estava concentrada.
    Após as explicações, John nos mandou fazer alguns exercícios do livro. Peguei-o dentro da mochila e procurei pela página que estava escrita no quadro. Após olhar o gigante número de questões, concluí que eu não estava com cabeça para aquilo. Voltei a desenhar as flores na folha.
   Jackson começou a caminhar pela sala, como se estivesse monitorando os alunos a fazerem as atividades. Nicole, que estava sentada atrás de mim, começou a dar chutes em minha cadeira para me alertar que ele estava se aproximando.
   - Então quer dizer que você gosta de Gérberas? - perguntou Jackson baixinho ao se aproximar de mim.
   Por algum momento, pensei que ele fosse exigir a atividade feita, mas felizmente me enganei.
   - Gosto. - respondi, sem olhar para ele, sem graça.
  Ouvi Nicole rir atrás de mim e fechei o caderno. 
   - Pode continuar. - disse Jackson. - Não vou dedurar você.
   O sinal tocou no exato momento em que Jackson terminou de falar. Ele foi até o professor John e ambos começaram a conversar. Juntei minhas coisas dentro da mochila e esperei até que Nicole juntasse as dela para irmos juntas ao refeitório. 

Fuga da RealidadeWhere stories live. Discover now