Um - Ácharanê

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- Não... Vamos ficar. Vocês estão se divertindo.

Daikin pede o colo de papai e eu aproveito o momento livre para abraçar Pili.

- Sei que não queria essa festa, mas não fique assim, os sublimes adoram você. - ele sussurra em meu ouvido.

Sorrio e olho em seus olhos.

- São hipócritas. Ele me temem. Só realizaram o festival porque Doçani insistiu. Eles não me querem aqui.

Pili respira fundo e beija meu ombro.

- Então, a mehor coisa que você fez foi construir uma casa fora daqui.

Olho para a colina onde ficava a casa que ruiu. A única que não foi reconstruída, a casa da minha mãe. Está vazia, então é só mais uma colina.

Eu não poderia continuar aqui, de qualquer forma. Não posso morar em um lugar que passou dias em luto por Chirevo, sem a conhecer. Um lugar que cultua a Zoí. Um lugar que agora me teme.

- Se pelo menos eles soubessem tudo o que ela fez. Se contasse a eles tudo o que me contou... - Pili sussurra.

Ele segura minhas mãos e me faz girar. Sorrio e entro na brincadeira, obedecendo a seus comandos, porque dançar não é exatamente meu ponto forte, ainda que seja o dele.

- Se eu aprendi alguma coisa nessa vida, é que precisamos entender o que nos cerca e não tentar controlar. - ele sussurra em meu ouvido e me faz girar mais uma vez.

Com tudo o que há dentro de mim, quero acreditar que ele tem razão. Não recebi esses poderes para controlar tudo.

Então não farei como Chirevo.

Não vou controlar tudo.

Já é bem tarde quando deixamos Kairon

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Já é bem tarde quando deixamos Kairon. Daikin está adormecido sobre o ombro direito de papai. Pili está sonolento, abraçado a mim. As crianças mais velhas carregam as menores. A caminhada é agradável apesar do cansaço do festival.

Mas antes que alcancemos a porta de casa, vejo alguém no meio das folhagens, próximo demais de onde vivemos. Deixo que todos entrem em casa e projeto um escudo para protegê-los.

- O que foi, Ali? - Pili pergunta.

- Tem alguém na floresta. Entra em casa! - espero que ele me obedeça entro no meio das árvores, tocando os troncos.

Elas brilham, iluminando a madrugada quente.

Por um momento desejo que seja Ragok. Desejo que ele tenha retornado.

Não muito longe da casa, percebo um garoto. Franzino, seus olhos brancos, parece com Ziul. Até mesmo se veste como um dos sublimes que foram escravos de Nigde.

Um mago nessas terras?

- Quem é você? - pergunto.

- Barak, senhora. Sirvo a Arva da Casa Samiot, a anciã dos magos livres.

De onde veio esse garoto? Os magos estão perto assim de Kairon? Ragok está com ele?

- O que querem? - questiono.

O que será que ele quer de mim que não poderia esperar até o dia amanhecer?

- Falar com a filha de Mistha.

- A essa hora? - pergunto.

Barak concorda com um gesto e sorri. Vejo outros magos aparecendo por entre as árvores. Tão magros como o primeiro e vestidos da mesma forma. Quem serão estes? Os nobres que foram libertos quando saí do Palácio no deserto ou os que libertei da montanha?

- São todos servos? - pergunto.

Eles sorriem e concordam com um gesto. Parecem felizes. Como um escravo pode ser feliz?

Esferas de luzes começam a surgir no chão, formando um caminho. Os magos se enfileiram atrás das esferas, esperando que eu avance.

- O que é isso? - questiono.

- O Acharané é uma comemoração que deve ser feita por todo o povo sublime. A filha de Mistha também nos libertou. Queremos que nos deixe celebrar sua chegada.

Respiro fundo. Estou cansada, com os pés doloridos, mas fiz muito mais por esses pequeninos do que por Kairon. A devoção deles é mais sincera do que os sublimes de Anśa natural. Então sigo o caminho que eles abrem para mim.

No fim do caminho há uma mulher baixinha rodeada de magos. Todos os magos estão aqui. De alguma forma, os ex exilados encontraram a corte de Nigde, que não está vestida ricamente como me lembrava. Todos eles vestem roupas de escravos.

Os olhos mudaram. Como os do Ragok, quando ele me ajudou a fugir. Parecem mais humanos. Parecem vivos. A obediência a antiga Nigde foi quebrada quando fugiram. Lembro que Ziul... Jamais teve a sombra de morte no olhar. Sempre acreditou que eu viria.

E eu falhei, sem conseguir ajudá-lo.

- Filha de Mistha, a casa Samiot celebra o Acharané em sua honra. - a mulher diz.

Todos eles ajoelham, inclusive ela. Sua pele é marrom em um tom mais claro que o de Pili. Seus cabelos são de um roxo incrivelmente claro e seus olhos brancos cheios de vida parecem sorrir. Ela é de baixa estatura e não aparenta ser velha.

No meio dos magos, avisto Ragok. Ele parece calmo, como quem sabia que isso aconteceria. Mais lindo do que podia me lembrar. Ele é o único que não está me olhando, mas ajoelha como todos os outros.

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