Capítulo 7

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Mamãe estava extremamente nervosa quando adentrei em casa. Ela não vira minha despedida no portão, mas sabia que a guerra havia sido declarada. Ela disse-me que de agora em diante, eu deveria estar mais atenta, pois não sabíamos no que o mundo se tornaria.

Papai quando chegou naquela noite disse-me a mesma coisa. Não sabia como os governos reagiriam, e tampouco as pessoas nas ruas. Ele falou que as guerras enegrecem as almas dos homens, e eu ainda era apenas uma jovem, despreparada para a vida.

Subitamente, senti falta da tarde anterior, quando o que estava em voga era um simples namorico de jovens.

Percebi que teria que amadurecer nos próximos tempos.

Pouco saí nos outros dias, mas quando fiquei sabendo, no dia 4 de agosto, que a Inglaterra havia entrado no conflito, fiquei verdadeiramente aflita. Isto significava que todo um continente estava em conflito e, por conseguinte, o país onde estavam os pais de João.

Fiquei pensando no que ele havia dito todos os momentos em que fiquei sozinha. Eu começava a entender o que ele havia dito, mas não acreditava completamente. Estaria ele realmente interessado em mim? Mas naquele momento, quando pensei em como estaria preocupado com seus pais, tive vontade de vê-lo e saber como estava. Achei que seria o certo há fazer.

Na primeira oportunidade que tive, rumei para a casa de sua avó na Avenida Paulista. Eu esperava que a Baronesa não estivesse em casa, ou que eu pudesse ao menos falar com ele sem constrangimentos. Temia que houvesse um escândalo, que eu fosse expulsa sem maiores considerações.

Mas meu anjo da guarda me protegia, pois assim que apareci no portão, vi que ele estava sentado num dos bancos do jardim, lendo um livro. Não sei bem a ousadia que me acometeu, mas abri o portão e entrei nos jardins, sorrateiramente.

- Oi.

Ele largou o livro e me olhou surpreso, mas feliz.

- Amélia! O que veio fazer aqui?

- Bem, eu fiquei sabendo sobre a Inglaterra, e pensei em ver como estava.

O ânimo dele murchou um pouco.

- Não foi exatamente uma boa notícia...

- Imaginei...

Ficamos em silêncio, até que ele percebeu que eu ainda estava de pé. João deslizou para o lado e me deixou sentar.

- Eu não posso demorar. – murmurei.

- Sua mãe não sabe que está aqui?

- Ninguém sabe, só você.

Ele riu.

- Nunca imaginei ter a casa invadida.

- Eu nunca imaginei invadir a casa de alguém. – eu ri.

Ficamos mais uma vez em silêncio.

- Fiquei feliz por ter vindo. – ele murmurou.

- Eu pensei sobre o que me disse... – minha voz foi morrendo. Respirei fundo antes de continuar. – Não pode ter falado sério. Pense, você mal chegou, nem conhece bem as moças daqui, certamente sua avó introduzirá em sua vida uma moça refinada, de boa família, que atenderá aos seus anseios bem melhor do que eu.

Esperei que João falasse algo, mas ele apenas se calou. Ele me olhou longamente nos olhos, sustentando em si qualquer sentimento que tivesse. Seus olhos azuis eram transparentes para mim, eu podia lê-los bem. Via um brilho no fundo de sua alma que eu ainda não tinha percebido, pareceu-me determinação, mas pontilhada de tristeza.

- Já ocorreu-lhe, Amélia, que conheci moças em demasia, e que me sinto subitamente confortável em ter, de acordo com seus parâmetros, uma moça de classe inferior em minha vida? – ele pegou minha mão. – Eu não acredito em classes, acredito em pessoas, e você é uma boa pessoa. A prova disso é ter vindo aqui, escondida, justamente num momento em que eu precisava sorrir.

- Era o mínimo que eu poderia fazer.

Ele sorriu abertamente.

- Eu sei. – João beijou minha mão. – Mas não quero mais que tenha que se esconder para nos vermos. Devemos fazer da maneira certa.

- João, eu não sei o que dizer...

E realmente não sabia. Ele era um bom rapaz, bem apessoado, de bom temperamento e de boa família. Mas eu o conhecia há pouco tempo para pensar nele dessa maneira. Talvez ele realmente soubesse o que dizia, mas eu não sabia o que deveria pensar ou sentir. Aquilo era novo para mim.

- Diga sim. – ele sorriu.

- Não quero ter que me esconder, mas tampouco sei se é o momento certo.

- O que quer dizer? – João estava confuso.

- Eu gostaria de conhecê-lo melhor antes de decidirmos o que quer que seja, compreende?

João sorriu e beijou-me os dedos novamente.

- Claro que compreendo o que me diz, e eu concordo. Vou hoje até a sua casa e conversarei com seus pais, para que pelo menos eu possa vê-la quando desejarmos.

Nos sorrimos um para o outro, e assim, como quem não quer nada, João adentrou meu coração com passos leves.

Aconteceu no Outono de 1914Όπου ζουν οι ιστορίες. Ανακάλυψε τώρα