Capítulo 1 - Desencantada...

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E novamente, via-se sorrindo sem estar realmente feliz, um sorriso ensaiado e perfeito a que fora condicionada a reproduzir desde a infância. Observou sua imagem diante do espelho, checou as longas madeixas louras acomodadas em uma trança que lhe custara três horas seguidas imóvel, retocou a maquiagem impecável e saiu do banheiro, sentindo os calos sendo maltratados pelos sapatos de salto um tanto menor que seus pés.

- "Mulheres usam tamanho 35 no máximo." – Lembrou-se das palavras da tia repassando por sua mente como um mantra, tentando dizer a si mesma que aquele esforço, de algum modo, valeria a pena.

Sorriu tristemente e caminhou de volta ao salão principal, se esforçando ao máximo para não demostrar desconforto. Respirou fundo, ou melhor, tentou, ao ponto em que o espartilho permitiu, e caminhou carregando consigo todo o peso daquele grande vestido cheio de anáguas e tecidos.

– Sophie!

Ouviu seu nome sendo chamado e se recompôs, perfeita, como tinha que ser. Voltou-se à senhora que a chamava e aproximou-se.

– Estes são o senhor Antoine, sócio do seu tio na filial francesa e seu filho Pierre! A tia Carmen apresentou o senhor que estava ao seu lado, acompanhado de um rapaz mais jovem:.

– Esta é minha sobrinha Sophie...

– Bonne nuit! Ravi de vous rencontrer... – A moça pronunciou em um francês perfeito e sorriu com cortesia, inclinando a cabeça para o lado e tendo apenas o cuidado de deixar os brincos longe do ombro para não dobrar os delicados fechos das joias.

– Je vois que tu étais três bien éduquée! - Antoine a elogiou sorrindo. – et três belle...

Não percebeu nenhum traço de malícia em suas palavras, diferente do rapaz, que sequer falara, distraído com o pequeno decote que mostrava o colo alvo de Sophie, que tentou evitar ao máximo retribuir seu olhar com repulsa.

– appréciez-vous l'evénement? - A voz do velho senhor a tirou de seus devaneios.

Sophie voltou sua atenção a ele e imaginou-se dando uma resposta bem malcriada sobre a hipocrisia ou chatice das pessoas ali presentes, ou sobre o olhar asqueroso de seu filho.

– magnifique! - Limitou-se a poucas palavras antes que não mais pudesse se controlar, mas resignou-se e sorriu docemente.

Enquanto comia canapés, pegou-se pensando na pequena quantidade de loucuras que sentiu vontade de fazer. Riu sozinha com seus pensamentos e imaginou que estivesse ficando embriagada pela única taça de champanhe que sua tia a deixara degustar. Imaginou-se ficando bêbada e riu novamente.

Quando finalmente a festa acabou, tomaram um táxi e retornaram à grandiosa casa onde vivia com os tios. Pediu licença, dizendo estar cansada, e rumou em direção ao seu próprio quarto no primeiro andar., Mal podia esperar para despir-se daquelas vestimentas.

Trancou a porta e pode ouvi-los discutindo sobre uma antiga traição do tio que retornou aos pensamentos da tia ao vê-lo fitar com interesse outra mulher no evento. Após o acontecimento, o casamento tornou-se um inferno, e mal conseguiam ficar no mesmo cômodo sem brigar, exceto em eventos, quando pareciam o casal perfeito, com duas décadas de união.

- "Como podem continuar, sendo tão infelizes?" –Sophie pensava consigo mesma, desvencilhando-se dos sapatos de seus pés, retirou o pesado vestido e o maldito espartilho, enfim podia respirar livremente.

Sentou-se sobre sua cama quase afundando no colchão macio e observou os curativos em seus pés e dedos. Na infância, achara que não precisaria mais lidar com isso, concluíra as aulas de balé. Mas enganara-se.

DesencantadaNơi câu chuyện tồn tại. Hãy khám phá bây giờ