Capítulo 4 - Modos, algodão e lascas

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– Não há de que.

Belman se virou para olhar a favela.

– Tem certeza de que quer ir lá? – perguntou a garota, ainda com receio, observando o grande complexo de casas sombrias que começava a crescer a partir dali.

– Claro, veja – Belman rodeou o corpo de modo teatral, mostrando suas novas vestes. – Escolhi as mais desbotadas que tinha, como você recomendou.

Ela olhou-o, estudando.

– Mas ainda está limpo de mais.

– Você também não está tão suja já faz alguns dias.

– Sua limpeza é natural – explicou. – Mesmo que alguém da favela se limpe, qualquer um pode notar os encardidos que o tempo deixou, em mãos, cotovelos e joelhos.

Ele deu de ombros, soltando o ar dos pulmões.

– Isso é mesmo um problema tão grande?

– Não – respondeu, cabisbaixa – Eu só não queria que você fosse lá.

Silêncio.

– Eu gostaria de ver a sua casa, e talvez sugerir se vale a pena continuar nela, ou pagar um aluguel no centro.

– Eu não chamaria bem de casa – disse, com um sorriso tímido.

– Seu lar, então?

Deu de ombros, sem olhar para ele, e partiram para as periferias.

O cenário já não era mais composto de prédios, o que se poderia chamar de "alto", seria devido às casas que eram construídas muito próximas e acima das outras. As ruas eram escuras por causa de grandes cortinas lançadas do topo de construções para o alto de outras, provavelmente, para tapar o sol. O lugar sofria por falta de planejamento, haviam ruas que terminavam em lugar nenhum, algumas que eram bem estreitas, outras muito íngremes e com falta de degraus nas partes de escadaria.

Depois de pensar um pouco, Belman pôde ver que Lifa dizia a verdade, apesar de usar suas piores roupas, ele ainda não parecia ser dali, e os olhares que se desviavam para o garoto eram como apunhaladas a distância. Tudo era decadente. Lifa parecia cabisbaixa, e não soltou uma palavra enquanto Belman a seguia por aquela zona de escuridão e fedor.

Caminharam por alguns minutos, dobrando esquinas e subindo escadarias, até o momento em que ela o mostrou onde morava.

– É aqui – disse, olhando para um muro entre duas casas, tampado por um avental sujo.

– Atrás da parede, você diz?

Lifa assentiu, e olhou para os lados de soslaio por algum motivo.

– O que foi?

– Ninguém sabe que eu moro aqui – sussurrou ela, aproximando-se do muro devagar. – E prefiro manter isso.

Agarrou o avental e abriu uma fresta, atrás, uma rachadura estreita se revelou. Ela a atravessou fazendo um gesto para que Belman a seguisse. Ele olhou os arredores de soslaio, e adentrou. Não foi fácil passar, teve que prender bem a respiração e, mesmo assim, sua camisa ficou deveras imunda ao se arrastar contra a parede.

O lugar era um pouco maior que o seu quarto. A luz tênue que havia ali, espiava pelas falhas do assoalho da casa de cima, e ele suspeitou que durante a noite seria um breu total. Era um quadrado totalmente fechado, a não ser pela mísera rachadura pela qual entraram, uma espécie de aposento que nunca fora terminado e que Lifa tivera a sorte de ter descoberto e se escondido ali. Havia um amontoado de cobertores e aventais num dos cantos, que provavelmente servia de cama, além de um baú pequeno, e um suporte de madeira comprido que guardava alguns utensílios de mão, os quais Belman só enxergava uma parte de cada.

A Caveira de LuzWhere stories live. Discover now