Trinta e Quatro: Temor

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— Ei? Sarah? Você não vem? — Victor perguntou e eu percebi que o meu devaneio deu a ele tempo o bastante para deixar o carro e ainda tirar Mabel da cadeirinha sem que eu percebesse. Caindo em si, eu guardei todos os meus pertences, fiz e saí, levando comigo todas as coisa da bebê.

Victor trancou tudo e nós andamos em silêncio até o sobrado. Só naquele curto caminho, eu pensei várias vezes em desistir de tudo e voltar para o Instituto. Estremeci quando nós paramos em frente ao portão vermelho e contemplei primeiramente o quintal, meu cenário preferido quando costumava fantasiar que era uma princesa. Forçando a visão, notei a grama verdinha no chão, o carvalho frondoso e, pendurado em um de seus galhos grossos, o balanço feito por papai para mim em um de meus aniversários. Milhares de boas lembranças me encheram a mente e sorri um pouco.

"Como eu gostaria de não ter partido" pensei com pesar. "Agora nada será como antes".

— Pronta? — Victor mais uma vez invadiu meus pensamentos e quando o vi adiantando-se até a campanhia um novo desespero tomou conta de mim e eu puxei o braço dele.

Eu não sabia o porquê de tanto medo. Meu pai já havia me perdoado e aquele deveria ser um momento único em nossas vidas. O momento em que eu voltaria para casa. Mas eu me sentia insegura e não podia explicar a razão.

— Eu...

— Ei, me dê a sua mão — Victor pediu calmo ao contemplar meu estado de aflição e eu atendi a ele. — Vamos orar.

Ergui uma sobrancelha e observei o movimento de vizinhos passeando pra lá e pra cá.

— Aqui?

— Feche seus olhos — instruiu com firmeza. Ele foi o primeiro a seguir o comando e eu o acompanhei. — Senhor, nós estamos aqui desejosos em fazer aquilo que é correto, buscamos consertar nossos erros e honrar o seu nome com isso. O medo, no entanto, tem sido um inimigo e nós te pedimos ajuda para entregar nosso caminho a Ti, confiar na sua graça e descansar no seus cuidados. Esteja conosco nesse jantar e abençoe nossas famílias, conforme a tua Santa e perfeita vontade. Nós te amamos e oramos no nome de Jesus, amém. — Ao encerrar a oração, não fiquei tão calma quanto gostaria, mas senti paz o suficiente para ter certeza que o Senhor pastoreava minha alma. 

Victor, ligeiro, apertou o botão, fazendo soar um barulho enganiçado. Os cachorros no quintal apareceram, começaram a latir, chamando a atenção de seus donos e ficaram muito animados ao me verem, pois já me conheciam.

— Respira, Sarah — instruiu Vic, mantendo o tom de voz ameno.

Enchi os pulmões com uma grande quantidade de ar, soltei lentamente e estava prestes a repetir o movimento quando ouvi um barulho soando acima de nós.

— Oh! Vocês chegaram! — Eu ouvi uma voz eufórica e familiar e estranhei erguer a cabeça e ver minha amiga Gabi debruçada sobre o batente da sacada no andar superior. — Já desço com as chaves.

Ela voltou para dentro e, franzindo o cenho, encarei Vic em busca de respostas que explicassem o porquê de minha melhor amiga estar presente num jantar oferecido supostamente para a família. Eu não estava reclamando, afinal amava Gabriela, mas, sinceramente, algo não fez sentido na minha cabeça.

— Você logo entenderá — adiantou Vic e sorriu gentil.

A espera me deixou tensa, por isso dei um jeito de me acalmar, observando Victor fazendo a bebê gargalhar.

Minutos depois uma luz clareou o topo da escada principal e a porta que dava acesso a sala de estar foi aberta com força.

— É a Sarah! A Sarah chegou! — ouvi a inconfundível voz de Davi exclamar com grande euforia e não muito depois ele saiu e se adiantou para as escadas as quais desceu em grande velocidade.

Ensina-me amarWhere stories live. Discover now