Trinta: Confissões

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Eu não aguentava mais aquela angustia me consumindo. Talvez devesse tomar a frente e mostrar meu arrependimento por ter fugido.

Virei-me para ele e, mesmo observando sua postura tensa e a cara fechada, decidi não me acovardar. 

— Você não vai falar nada? — perguntei temerosa e, como previ, não obtive resposta verbal alguma, antes Josué pisou no acelerador aumentando levemente a velocidade com a qual dirigia. — Por favor, diga algo, Coelho! — implorei aumentando o tom de voz.

Ele virou-se levemente para mim e tomei um susto quando o velocímetro começou a oscilar entre setenta e oitenta quilômetros por hora.

— O que você quer que eu diga? — ele questionou aumentando o tom e a gravidade da voz. — Que você agiu como uma tola ao tentar fugir mesmo sem ter aonde cair morta?

Oitenta, oitenta e cinco, noventa quilômetros por hora.

Meu coração já saía pela boca e eu me segurava a Mabel com mais força.

— Coelho, mais devagar, por favor...

— Que ideia fantástica a sua! — ironizou, sem ouvir meus pedidos de clemência e percebi a ira deixando suas bochechas vermelhas. — Pegou dinheiro do Victor e, sem levar nem uma mala ou, sei lá, um casaco, saiu com a menina sem avisar ninguém e foi direto para a rodoviária. O que raios você faria em outra cidade, Sarah? Iria levar sua filha para morar debaixo de uma ponte? Ia matar ela de frio só porque não passa de uma garota imatura, covarde e irresponsável? 

Noventa e três, noventa e sete, cem, cento e dez quilômetros por hora.

As lágrimas começaram a inundar meus olhos e o desespero tomou conta do meu corpo, fazendo-me respirar rapidamente.

— Por favor...

— Você foi egoísta, Sarah! Só pensou nos seus problemas! Não se importou em deixar todos feridos em prol do seu bem-estar em segurança — berrou, me interrompendo. — E não me diga que estava agindo como uma mãe em apuros, porque você não pensou duas vezes em colocar Mabel em risco!

A bebê começou a chorar em pânico e eu também, ambas sentíamos pavor.

— Pare! Você vai nos matar, Josué! — implorei e fechei meus olhos esperando pelo pior.

E então, graças a Deus, ele atendeu meu pedido e foi desacelerando aos poucos, fez uma curva e parou. Quando abri meus olhos outra vez reparei que estávamos estacionados em um acostamento. Coelho ainda segurava no volante e seu tórax expandia-se rapidamente.

— Perdão, eu não quis assustar vocês duas — ele pediu, mostrando-se muito arrependido pelo momento de surto.

Eu continuei em prantos e, ainda assim, precisei acalmar Maria, que permaneceu muito assustada por algum tempo.

— Sarah, eu passei dos limites e...

— Você está certo. Eu sou uma pessoa horrível, Coelho — admiti ainda um pouco arfante e atraí os olhos dele para mim. — A pior de todas...

Inspirei o ar algumas vezes e, ainda que assustada, declarei-me pronta para desabafar tudo quanto vinha carregando em meu peito. Antes de começar, orei ao Senhor para que Josué não se recusasse a me ouvir e pudesse me ajudar de alguma forma.

— Antes de engravidar da Mabel tudo era diferente — comecei com a voz hesitante. — Eu sempre tive do bom e do melhor. Desde muito pequena o cargo de princesa perfeita da casa era meu. Você deve saber que minha mãe morreu com um tumor no cérebro quando eu tinha uns três anos, então eu nem me lembro dela direito. Em decorrência disso eu me apeguei muito ao meu pai que sempre fez de tudo e participou de todos os momentos da minha vida, sem exceção.

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