XIII - A moça dos olhos ansiosos

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— A propósito — disse eu —, estou curioso para saber como foi que você soube do envolvimento entre aqueles dois.

— Mon ami... Conheço a natureza humana. Coloque um rapaz como o jovem Renauld diante de uma linda moça como mademoiselle Marthe e o resultado será praticamente inevitável. Além disso, pense na discussão entre pai e filho! Claro que só podia se tratar de dinheiro ou de mulher e, ao me lembrar de Léonie descrevendo o grau de raiva demonstrado pelo rapaz, decidi pelo segundo motivo. Foi uma aposta... e eu estava certo!

— Quer dizer que você já suspeitava de que ela amava o jovem Renauld?

Poirot sorriu.

— De qualquer modo, percebi que ela tinha olhos ansiosos. É assim que sempre penso em mademoiselle Daubreuil... a moça dos olhos ansiosos.

Seu tom de voz era tão grave que até me incomodou.

— O que você quer dizer com isso, Poirot?

— Imagino que muito em breve poderei explicar isto também. Bem, agora preciso ir.

— Vou levá-lo até a estação — ofereci, levantando-me.

— Nada disso. Proíbo você de me acompanhar.

Ele disse isso com tanta veemência que fiquei ali, atônito, olhando para ele. Ele reafirmou sua posição:

— Estou falando sério. Au revoir.

Depois que Poirot saiu, senti-me um tanto perdido. Acabei indo passear pela praia, observando os banhistas, porém sem ânimo de me unir a eles. Comecei a fantasiar que Cinderela podia estar por ali se exibindo num lindo traje de banho. Contudo, ela não estava entre aquelas pessoas. Prossegui caminhando sem rumo pela areia até o lado oposto da cidade. Foi então que me ocorreu que procurar pela garota seria uma atitude decente e cortês de minha parte, além de provavelmente me poupar aborrecimentos futuros. E, assim, o caso seria encerrado, sem haver necessidade de me preocupar com o que quer que acontecesse com ela depois de minha visita. Se eu não a procurasse naquele momento, certamente seria ela quem iria procurar por mim na villa.

Tendo isto em mente, deixei a praia e segui para a cidade. Logo encontrei o Hôtel du Phare. Era um prédio simples, sem muitas pretensões. Era extremamente estranho chegar naquele lugar sem saber o nome da moça. Assim, para poupar minha dignidade, resolvi dar uma olhada pelo saguão e ver se a encontrava por ali, mas não havia nem sinal dela. Esperei por algum tempo até ser vencido por minha própria impaciência. Chamei o recepcionista de lado e discretamente pus cinco francos em suas mãos.

— Gostaria de ver uma moça que está hospedada aqui. Uma garota inglesa, de baixa estatura, morena... Não sei bem como se chama.

O homem balançou a cabeça e parecia estar disfarçando um sorriso.

— Não há nenhuma moça com essa descrição no hotel.

— Mas ela me disse que estava hospedada aqui.

— O senhor deve estar enganado. Ou... a moça deve ter cometido um engano, pois outro cavalheiro também esteve aqui perguntando por ela.

— O que você está me dizendo? — exclamei, surpreso.

— Sim, monsieur. Um cavalheiro que deu esta mesma descrição da moça que o senhor está procurando.

— Qual a aparência dele?

— Um cavalheiro de pouca altura, bem-vestido, impecável mesmo, com um bigode muito afilado nas extremidades, a cabeça assim meio ovalada e de olhos verdes.

Poirot! Então era esta a razão por que ele não queria minha companhia até a estação. Que impertinente! Metendo-se na minha vida particular. Depois dessa, o que deve estar tramando? Será que pensa em arrumar uma enfermeira para tomar conta de mim?

O assassinato no campo de golfe (1923)Where stories live. Discover now