Vinte e Cinco: Retorno

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Ele riu com a minha gracinha, mas logo em seguida ergueu o tronco se mostrando um pouco tenso.

— Você me assustou, dona Sarah. Quando vi seu desespero ao tentar sair da água, meu coração veio na boca — confessou, fixando o olhar aflito em mim. — Graças a Deus, eu te observava o tempo todo.

Segurei um pouco o ar, refletindo um pouco sobre o verdadeiro significado daquelas palavras.

— Eu também senti muito medo, garanto. — Fiz uma pausa. — Na verdade, não conseguia parar de pensar em Mabel. Foi muito doloroso imaginá-la vivendo uma realidade semelhante a qual eu vivi, talvez pior. — Ponderei, sentindo uma agonia dilacerante subindo do meu peito para minha garganta. — Ela não teria ninguém.

Ao ouvir aquilo Victor ergueu suas sobrancelhas e pareceu chocado. Ele adiantou um passo em minha direção, deixou as bolsas carregadas no chão, ajustou a bebê em seu colo e com a mão livre segurou a minha.

— Quantas vezes eu vou precisar repetir até você acreditar que não vou embora? — questionou com um tom grave e sério e me fez levar um pequeno susto. — Se acontecesse algo com você, e glória ao Senhor porque não aconteceu, eu seria o mais miserável dos homens. Sofreria muito de todas as formas. Mas jamais, repito, jamais deixaria minha filha sozinha. Ela teria a mim.

O coração disparou e eu precisei mirar um ponto distante no chão.

— Eu sei, mas...

— Não tem "mas" — interrompeu-me, fazendo com que eu me sentisse como uma criança levando bronca da mãe. — Sei o quanto deve ser duro pra você confiar em mim depois de eu tê-la magoado tanto. Contudo, por favor, passe a me enxergar como um novo homem, servo de Cristo que deseja fazer o certo, ser um amigo pra você e o melhor pai do mundo para a Maria.

Minha vista foi ficando embaçada devido ao excesso de lágrimas e precisei secar uma delas quando escorreu pela bochecha. 

— Seja paciente comigo, Victor — implorei com a voz falha. — Eu estou tentando bravamente lidar com meus conflitos e ser forte para engolir tudo isso acontecendo ao mesmo tempo. Não é assim tão fácil. — Umedeci os lábios, respirei fundo e o mirei. — Entretanto, você tem sido ótimo em tudo, mais até do que eu gostaria de admitir. Eu só preciso me acostumar.

Ele sorriu, acariciou meu braço com o polegar e logo se afastou. 

— Bem, você tem todo tempo do mundo para se acostumar. — Ponderou um pouco e coçou a cabeça. — Contudo, não minto, eu espero já ter ganhado pontos suficientes com você quando Maria estiver na fase de gritar "papai" por aí. 

Cruzei os braços e ergui as sobrancelhas, fingindo estar indignada.

— Está me pressionando, doutor? — perguntei em tom de zombaria, ele negou com a cabeça e ergueu uma mão em sinal de rendição. — Mais do que qualquer um, o senhor deveria saber como o tempo é o melhor remédio para cicatrizar algumas feridas.

Vic deu de ombros e fez uma careta. Conhecendo-o bem, deveria estar formulando algum modo científico de corrigir minha frase.

— Você pode estar certa. Mas se quiser eu posso te receitar boas pomadas que podem ajudar no processo — brincou e piscou com charme, o engraçadinho.

— Sua conduta terapêutica não diz respeito aos assuntos do coração ou a alma — corrigi, me exibindo com uma suposta sabedoria.

Ele inclinou-se em minha direção e colocou a mão ao lado da boca, agindo como uma criança prestes a contar um grande segredo.

— Existe um remédio para tal — sussurrou todo misterioso. — Entretanto, nem todos o conhecem.

Franzi o cenho, mantendo-me cética.

Ensina-me amarWhere stories live. Discover now