Maresia em Demasia

K

Julho, 2019

o azulejo do consultório
do banheiro do consultório
me lembra o desenho de uma vulva
e uma mulher pareceu falar comigo no ônibus
eu não tenho mais certeza
a música no fone de ouvido estava alta demais
e a sessão de terapia me convenceu de que minha libido traiçoeira está presa no objeto que não posso ter
antes disso eu quis dançar
dançar pra ele usando apenas
uma de minhas melhores calcinhas
e beijá-lo lentamente ao som de um R&B moderno
possivelmente reclamando caso seu perfume não estivesse forte o suficiente para senti-lo
eu observaria todo comportamento e expressão com cuidado
gostaria de ter certeza que aproveitamos a companhia um do outro de forma mútua
e eu bem sei que é pedir demais
estou no ápice de desejá-lo
quase abro mão de mim para deixa-lo usar-me
eu quero tanto ser usada e tirar proveito disso
beijá-lo até que seja impossível afogar meus gemidos
quase sinto seus dedos ao longo do meu pescoço e o comprimento de sua língua em minha bochecha
enquanto todo o resto de seu corpo implora por mais proximidade do meu
eu me pergunto se você dançaria comigo
me pergunto se você esperaria um sorriso
ou risada desorganizada
para anunciar o começo de outros movimentos
e apesar de não fazer questão de comandar a seleção de músicas
pergunto-me se você deixar-me-ia escolher
eu vejo uma disputa orgânica sobre quem ficaria por cima
vejo seus dentes cravados em minhas costas e o formato da sua mão marcado em minha cintura
você não terá tempo para pedir algo
ou proclamar palavra alguma
e eu não vou me importar com o tempo
ou com os arrepios causados pelo vento vindo da janela aberta
você não tentará aquecer minhas mãos
nem acender meu cigarro
pergunto-me se pensará em impedir minha saída
e se desenhará arabescos invisíveis em minha pele com a ponta do indicador
em quanto tempo eu deveria me despedir?