Chapter One

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Dizem que a dor nos faz mais forte... Papo furado, ela nos destrói, nos corrompe, nos faz pensar no pior, suicídio... Ah, pensei, remédios em quilos eram colocados na minha boca, nem que fosse a força. Ainda tentam salvar a minha vida, mesmo depois de cinco meses.

Glória está ao meu lado o tempo todo. Vive dizendo que não vai perder outra filha. Eu? Eu a amo, mas não ligo, não me importo em morrer. Emprego? Terei que voltar no mês que vem. Mas tenho certeza que isso não vai acontecer. Artur, o pai de Amanda se culpa. Ele deu a ideia de fazermos aquela viagem de surpresa. Quase não nos falamos, mas sempre que acontece apenas choramos, nos lamentamos, nos deixamos sentir a dor, o medo, a incerteza. Queria falar a verdade para ele, que não tem culpa, se existe um culpado é o motorista daquele outro carro, mas não consigo, não ainda.

Era assim que eu me sentia. Nunca fui dramática, sempre erguia minha cabeça. Sempre batalhei por minhas conquistas. Mas agora? Agora mal tenho forças para respirar. Se não fosse Glória meu desejo já tinha se concretizado, a morte. Morreria definhando em minha cama, na nossa cama. Mas ela não permitia. Minha sogra insistia. Naquele momento me perguntava se ela era meu Anjo ou meu Demônio, hoje tenho certeza do que ela foi, mas não vem ao caso, pois essa história vai além de um conto de amor.

- Michele...

Escuto a voz da minha sogra, ou sei lá como ainda a chamo. Viro-me, ela me encara, nem lembro a última vez que saí daquela cama. Definitivamente definhando lentamente. Ela sorri fraco. Está sendo forte por nós duas, mas nem ela consegue me fazer esquecer, eu nunca vou esquecer. Hoje sei que isso me ajudará para sempre.

- Estou sem fome. – Posso escutar o seu suspiro, mas que se dane, não sou mal-agradecida, mas ela insiste tanto que me irrita.

- Você precisa comer.

Com cuidado viro para ela, gemo, pois as pernas ainda doem, talvez por falta de movimentação, tenho certeza que sim. Preciso levantar e andar, mas não quero.

- Eu estou bem, Glória.

Ela se aproxima e senta na cama, pega minha mão e acaricia. Meus olhos já lacrimejam, pois ela faz isso sempre que vai falar da nossa Amanda.

- Você não está bem. Você está longe de bem e isso me mata por dentro.

- Eu só quero ficar sozinha. – Então puxo a minha mão.

- Eu também queria. Acha que eu não preferiria viver o meu luto sozinha? Sofrer pela perda da minha única filha de sangue? – Seus olhos estão vermelhos. Sei que chora todos os dias. – Mas eu não posso! Porque eu sei que onde quer que Amanda esteja ela nunca me perdoaria se eu te deixasse morrer. Eu te amo como filha, por isso estou aqui, por isso estou tentando ser forte por você. Mas não se engane, Michele... – Ela levanta e me encara. – Você a amava, eu sei disso, mas nem o seu amor se compara ao meu. Ela era minha filha, mas estou sendo firme por ela. Não por mim, não por você, não por Artur, mas por ela. Sua memória merece o melhor. E se você a ama tanto, deveria pensar dessa forma. – Meu coração está disparado. – Porque ela nunca nos perdoará se fizermos da sua existência e morte algo para merecer sofrimento. Nós a perdemos, isso não vai mudar, mas ainda estamos aqui. Não ouse desonrar a existência da minha filha, nem ela e nem você merecem isso.

E lá estava o meu choque de realidade. Talvez não o suficiente para me fazer ter forças, mas o necessário para me fazer repensar minhas atitudes. Ela é meu Anjo disfarçado de Demônio, porque foi ela, essa mulher que me fez ver as coisas de outra forma. Mas nem Glória foi capaz de fazer me esquecer de algo, minha vingança... Eu precisava de um motivo para levantar, além de honra, o encontrei, aqui está ele. Vou atrás da pessoa que tirou a vida da minha mulher, a vida de Amanda.

SurpreendidaOnde as histórias ganham vida. Descobre agora