Único.

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Fazia mais frio do que a previsão havia relatado, a sensação térmica prevista não passava dos cinco graus celsius negativos, mas Chenle tinha certeza de que seu pequeno corpo sentia no mínimo doze graus negativos, ele vestia uma fina blusa de moletom branco colado ao seu corpo, e por cima, uma blusa de lã cor de mostarda, além de uma grossa calça de moletom também branca, nenhuma roupa ou cobertor estava o ajudando a esquecer o frio que fazia, o que dificultava sua vida. "Entre, Lele, você vai congelar aí fora." Sua mãe gritou de dentro da casa, encarando o garoto pela vidraçaria da porta principal, o vendo prostrado ali por pelo menos vinte minutos, teimoso demais, ela pensou. "Jisung disse que chegava em quinze, mas deve ter tido algum problema com a neve, não se preocupe tanto." Ela continuou, praticamente sendo ignorada pelo filho, que simplesmente continuava encarando a rua, esperando por uma bicicleta aparecer, um carro, qualquer coisa.

O tempo parecia estar passando em câmera lenta, um minuto durava no mínimo cento e vinte segundos, tudo porque o garoto estava ansioso pela chegada do amigo, louco por não o ver por um longo tempo, devido as aulas canceladas por causa da neve. Quando olhou no relógio mais uma vez, percebeu que já havia passado uma hora desde que havia saído para o esperar, portanto, por medo de morrer de hipotermia e desistindo de ficar ali, entrou e se sentou no sofá da sala, se cobrindo com um cobertor grosso que o esperava e finalmente relaxando seu corpo gelado.

A lareira estava acesa, o fogo queimava desde o momento que a primeira pessoa daquela casa havia acordado, Chenle se deu o direito de fechar os olhos e apenas sentir as ondas quentes chegando ao seu corpo e esquentando cada parte gelada dele, assim que soltou um longo suspiro, ouviu a porta abrir e fechar, vindo um vento gélido em sua direção, e ele supôs que sua mãe havia saído, dessa forma continuou estirado no sofá, o pensamento ia para outro universo e voltava, estava finalmente relaxado. Relaxado até o momento que sentiu algo em cima de suas pernas, algo pesado, ele levantou pronto para sair no soco e jogar longe quaisquer objeto que estivesse ali, mas quando abriu os olhos, deu de cara com Jisung sorrindo para ele, o rosto pálido, dando espaço para apenas o topo de suas bochechas e o nariz vermelhos de frio, os cabelos ainda com neve, uma luva colorida e um moletom enorme, parecia quentinho, mas o garoto não dava a entender aquilo, visto que estava desesperado pelo calor vindo da lareira. "Cheguei, correr na neve não é legal." Ele falou e ambos riram.

Zhong encarou a enorme mochila que o amigo deixou ao lado do sofá, concluindo que os pais dele haviam o deixado dormir em sua casa. "Sim! Vou ficar aqui até a neve diminuir, não dá para passar carro nenhum e não vou voltar correndo, então terá que me aguentar." Park dizia com calma, sabendo que era exatamente o que queriam, o que tinham programado, mas que tinha altas chances de dar errado; um milagre aconteceu. "Vamos fazer algo quente para bebermos, e vamos assistir um filme?" Chenle perguntou, recebendo uma resposta imediata, sabia que o amigo nunca recusaria uma bebida quente e um filme, era a melhor programação para os dois.

Foram para a cozinha, os dois eram um desastre cozinhando, mas tentariam não colocar fogo em nada dessa vez. Pesquisaram a receita de um chocolate quente e fizeram com sucesso, apenas havia ficado muito doce, não que isso fosse um problema para eles; encheram suas canecas e colocaram dois marshmallows em cada um, aos poucos derretendo, dando o sabor que faltava para a bebida; enquanto Jisung voltava para a sala, Chenle alcançou um pote grande de biscoitos de nata, o preferido dos dois, e em poucos segundos, estavam sentados ao lado um do outro, procurando um filme que agradasse aos dois, enquanto se esquentavam com o calor corporal, o cobertor e a lareira.

Assistiram a dois filmes, uma comédia e um suspense, cada um havia escolhido um, e Chenle havia quase dormido enquanto a comédia passava, e Jisung foi obrigado a tirar seu cobertor, logo o acordando com o frio, e enquanto um ria o outro estava desesperado pelo cobertor.

Programaram longos dias, ocupados por risadas e construindo memórias que ficariam para o resto de suas vidas, o único problema era que o tempo era impiedoso quando estavam juntos, então cada dia parecia passar num estralar de dedos, e eles sabiam que em pouco tempo a neve desapareceria, a escola voltaria, e com o calor, as responsabilidades também viriam a tona; mas eles não se importavam, na verdade, pensavam apenas no hoje e nunca no amanhã, com esse pensamento, ocorreu o inesperado, no desenvolvimento de diferentes sensações e sentimentos, Chenle se viu completamente apaixonado pelo melhor amigo, desde o início, quando se conheceram, ele sentia uma pontinha daquela chama que veio a crescer sem parada enquanto estavam juntos. Um problema, com certeza. Mas amor é o contentamento descontente, é ferida que dói e não se sente, dessa forma, Zhong apenas continuava a agir como sempre fizeram, eram francos um com o outro, mas este sentimento do garoto, podia arruinar a amizade dos dois, e ele sabia disso.

Houve um dia em que trocaram roupas, fora um momento engraçado, Jisung sequer havia percebido que havia vestido as roupas do amigo, e então decidiram que ficariam daquele jeito apenas por aquele dia. As roupas do Park tinham o cheiro do perfume dele, não era forte porque ele não passava todos os dias, e estava misturado ao cheiro natural dele, estranhamente formava um aroma cítrico e viciante, que impregnou na alma de Chenle. Naquele dia ele se sentiu mais aquecido que o normal, e sabia que era apenas impressão sua. Saíram para uma caminhada, cada um com um cachecol e uma touca combinando, mas eles não tinham luvas ali, Zhong as odiava, e a única que Jisung havia trazido, estava lavando. "Posso colocar minhas mãos em seus bolsos?" O mais novo perguntou inocentemente, sendo respondido por um sorriso largo do amigo, era difícil andar, mas eles deram um jeito, sempre davam.

Todos os dias Jisung acordava com uma estima diferente, um ar diferente, cada dia era como conviver com uma versão nova dele, o que era divertido, pois quando Chenle comentava sobre isso, ele simplesmente respondia com um: "Estou normal, como assim?" Ele se divertia, se divertia até o dia em que Park resolveu perguntar. "Você que está estranho, o que aconteceu?" Pronto, ele havia percebido, o mais velho se desesperou por dentro, pensou em todas as probabilidades de resposta, e não disse nenhuma, apenas se fez de desentendido. "Estranho? Como assim?" Qualquer um que os visse, acharia que estavam tirando sarro um do outro, mas não estavam, não poderiam estar mais sérios. "Você está me tratando de um jeito diferente do normal, eu fiz alguma coisa?" Jisung perguntou com um ar preocupado, como se a culpa estivesse realmente nele, mas mal ele sabia que a culpa era no amigo, que não soube se controlar. "Não, eu acho que ando meio confuso, só isso." Uma resposta vaga, para algo tão sólido como sentimentos.

Aos poucos, Chenle decidiu que finalmente começaria a dar indiretas ao amigo, para ver se ele pegava, se corresponderia seus sentimentos ou simplesmente daria um pé em sua bunda, mas como ele era extremamente sortudo, seu melhor amigo era desesperadamente lerdo, então os chutes em meio aos filmes de romance, as vezes que ele usava a roupa que não o pertencia, apenas faziam Jisung rir, o deixavam confuso ou geravam dúvidas que ele simplesmente não respondia. Estava sendo muito mais difícil do que Zhong pensava, e aos poucos ele foi desistindo, e finalmente guardando aquele sentimento para que sumisse na mesma velocidade que apareceu.

A neve desapareceu, o frio ainda se fazia presente, mas não na mesma intensidade na qual estava quando as aulas haviam sido canceladas, e com isso, elas retornaram, os pais do Jisung foram o buscar, e Chenle voltou a ficar sozinho, estava agora apenas ele e as lembranças que ele tinha do melhor inverno da sua vida. Quando foi procurar sua roupa para voltar ao colégio, encontrou um moletom que não o pertencia, o encarou e como sempre fazia, cheirou sua gola, encontrando o cheiro familiar do Park ali, só que mais forte que o normal, pensou em devolver, mas sua carência não deixou, o instigando a deixá-la ali até que o amigo pedisse por ela.

Se viram na escola como se nada tivesse acontecido, porque na verdade não havia acontecido nada mesmo, tudo o que poderiam ter feito apenas passava pela cabeça de Chenle, iludido e sonhador, quem sabe ele superasse até os limites de alguém bobo de amor. Havia um garoto novo depois de tanto tempo sem aulas, e como os garotos eram muito próximos, foi automática a pergunta do desconhecido para os dois: "São só amigos?" Sendo respondido com um sim claro vindo de Jisung, orgulhoso de responder aquilo, enquanto na verdade o Zhong apenas queria dizer: "Não quero ser apenas seu amigo, eu quero beijar seu pescoço."

Jisung nunca reparou que havia esquecido seu moletom na casa do amigo, na verdade poderia ter reparado, mas não ligou muito, o que satisfez a carência de Chenle por um longo tempo, este em que ele acordava e se deitava todos dos dias e ia colocar as mãos nos bolsos e lembrar dos momentos bons, sentir o cheiro do seu amado, este que aos poucos foi desaparecendo, e como ele queria que o amor evaporasse junto, mas marcas assim não desaparecem tão fácil, principalmente ferida não curada como um amor não correspondido.

Too Cold • ChensungWhere stories live. Discover now