Quatorze: Reconciliação

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— Obrigada pela conversa, senhor Josué Coelho. Vou levar tudo isso em consideração, eu prometo — garanti e apertei sua mão rapidamente.

— Foi ótimo te conhecer melhor, dona Sarah Rodrigues — retribuiu o gesto com um sorriso e depois disso, eu pedi licença e fui me acomodar na van com o resto das meninas.

A viagem de volta foi tranquila. No começo estávamos animadas compartilhando nossas experiências, mas com o decorrer do caminho o cansaço abateu o grupo de uma forma geral e a maioria acabou cochilando.

Depois de pegar um trânsito considerável e atrasar mais do que o previsto, nós finalmente chegamos ao instituto. Tanto eu quanto Lu fomos as últimas a deixar o veículo, pois não queríamos correr o risco de acordar os bebês dormindo outra vez.

Lu saiu com Arthur primeiro e eu estava logo atrás dela. Quando coloquei meus pés na grama, fui abordada por dona Socorro e ela parecia bem aflita.

— Sarah, deixe a bebê comigo e vá para o jardim. Tem alguém te esperando lá — mandou ela sem me dar a chance de fazer perguntas. A senhorinha apenas pegou Mabel com todo o cuidado do meu colo e me apressou para seguir até o lugar indicado.

Com medo e já prevendo quem poderia ser, eu pedi forças ao Senhor e aceitei a vontade dele pra mim.

Andando apressada, eu cheguei até o lugar mais bonito do Instituto. O jardim possuía uma variedade enorme de flores coloridas cultivadas pelas próprias moças. Era um local em parte iluminado pelos dois postes perto dos bancos e parte pela luz natural da lua. As meninas sempre descreviam ser ali o local ideal para um pedido de casamento, mas para mim algo muito mais sério estava prestes a acontecer.

De fato confirmei minhas suspeitas quando encontrei Victor parado observando o céu atentamente. Ele ainda carregava a bolsa tiracolo de couro pendurada em seu ombro e também o jaleco dobrado e apoiado em seu braço, indicando assim sua recente chegada do hospital onde trabalhava.

— Victor? — chamei, pegando-o de surpresa. Meu coração estava a ponto de sair pela boca, mas eu, pela graça de Deus, não desistiria de consertar meus erros naquele instante.

— Pensei que não iria querer me ver nem pintado a ouro — ele falou hesitante enquanto avançava em minha direção.

"Por favor, Senhor me ajude" eu pedia repetidamente.

— Pedi o conselho de algumas pessoas e cheguei a uma conclusão: nós precisamos conversar seriamente sobre muitas coisas, Victor — comecei e quando estávamos perto o suficiente notei o semblante entristecido e pálido de meu ex-namorado.

— Sarah, por favor, me fale a verdade — implorou e o tom desesperado era perceptível na sua voz. — Eu tenho mesmo uma filha?

Olhei para ele por alguns instantes balancei a cabeça positivamente.

— Oh, Jesus! — Ele colocou as mãos no rosto e começou a respirar irregularmente. Eu pedia pra ele se acalmar, mas não adiantava. — Sarah, por que você não me deixou participar da vida dela? Por que você não me deixou ser pai? Por que fez isso comigo?

— Você estava tão ocupado com sua carreira, nós tínhamos terminado nosso namoro...

— Não! — Ele me fitou com os olhos vermelhos e úmidos e partiu meu coração em mil pedaços. — Não é desculpa, Sarah. Eu tinha o direito de saber.

— Eu te contei! — gritei desesperada sentindo as lágrimas tomarem conta dos meus olhos. — Fui até sua casa no dia do seu aniversário há mais de um ano e conversei com sua irmã. Fui chamada de golpista e me expulsaram de lá como um cachorro. Depois me procuraram e ofereceram dinheiro em seu nome para abortar! O que você queria que eu pensasse, Victor?   

— Eu não fiz isso. Não te ofereci dinheiro algum e só descobri sobre a Maria Isabel no dia da consulta, eu prometo — deu sua palavra se mostrando impaciente. 

— Mas, como você pode ter descoberto no dia da consulta se me acusou de ter te traído hoje cedo? — questionei incrédula.— Eu não te traí — fiz questão de esclarecer aquele detalhe. — Isso precisa ficar bem claro. Eu nunca seria capaz de te trair.

— Sim, Sarah. Tenho plena consciência disso — garantiu e minha cara de confusão foi inevitável. — Quando você foi ao consultório, eu desconfiei por alguns motivos, mas com toda a sua raiva de mim, você jamais falaria se eu perguntasse. Por isso, sabendo como você desembesta a falar quando está irritada, dei um jeito de te incentivar.— Ele pensou um pouco. — Mas, assim como você não seria capaz de me trair, eu jamais seria capaz de tirar a vida de uma criança inocente. Eu sou quase um pediatra, caso não se lembre.

Coloquei as mãos na cintura e precisei de alguns segundos para respirar e tomar a decisão de assumir meus erros. — Sinto a culpa me corroendo até hoje por ter aceito aquele dinheiro sujo, mas eu era tão imatura e estava tão desesperada, com medo — confessei, sentindo as lágrimas escorrendo pelas minhas bochechas.

— Foi a Suellen quem te pagou, Sarah? Ela te pediu para matar minha filha? — ele colocou as mãos em meus ombros.

Neguei e embora tivesse medo de comprometer Raquel com seu filho e sofrer as consequências, eu contei mesmo assim. — Foi sua mãe.

Ele fechou os olhos e eu o vi erguendo a cabeça, talvez querendo negar a verdade. — Eu deveria ter imaginado! Como ela foi capaz de fazer algo tão baixo?

Dei um passo na direção dele e segurei suas mãos. — Eu sou responsável por ter me deixado levar na conversa dela, Victor. Por favor, perdoe Raquel e esqueça de tudo. Você não precisa confrontar ela.

— Sete meses, Sarah! Tenho uma filha de sete meses e perdi todo o desenvolvimento dela por culpa daquela mulher maldosa! Como posso perdoar algo assim? — ele retrucou bravo, se afastou e descontou a raiva socando o poste de luz algumas vezes.

Com medo de vê-lo se machucar, eu corri até onde ele estava e segurei firme em seu braço para impedi-lo de alcançar novamente a superfície de metal e lembrando das palavras de dona Socorro proferidas no dia anterior para mim eu respondi a séria pergunta de Victor com muita dor: — Como Cristo. Se o Senhor Jesus perdoou dois pecadores como nós, então nós podemos perdoar a sua mãe. 

— Mas, Sarah...

— E eu também te peço perdão por tudo, Victor — declarei em prantos. — Meus pecados tomaram proporções gigantescas e eu não aguento mais carrega-los em meus ombros.

O médico me olhou profundamente e sem pensar duas vezes me abraçou forte e eu ouvi os urros dolorosos do seu choro baixinho. — Deixe-me ver a minha filha — ele implorou em tom de sussurro.

— Eu tenho medo — confessei, me afastando dele rapidamente. — Sua família pode querer nos machucar e eu não posso permitir isso.

— Não, eu não vou deixar — afirmou convicto. — Ninguém nunca mais machucará a vocês duas. — reafirmou, mas eu ainda continuava insegura. — Por favor, Sarah. Não me deixe ainda mais longe dela.

Refleti um pouco sobre aquela proposta. — Amanhã. Venha nos encontrar amanhã a tarde e eu te apresento a ela formalmente.

Ensina-me amarWhere stories live. Discover now