Saffron

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A jovem baronesa Sedwick não tinha mais esperanças de que o marido quisesse participar da vida de sua família. E aquilo incluía o nascimento de mais um filho.

Ansiava que o bebê fosse um menino, para que Robert não mais a procurasse em busca de cópula. Não havia amor tampouco respeito; existia apenas uma obrigação e frieza em seus gestos, bem diferente dos risos que costumava ouvir pelos corredores da mansão. O comportamento de Robert tornava-se cada vez mais promíscuo, e não raro Elinor flagrava pessoas desconhecidas circulando pela casa, observando as joias e vasos caros da família, ou a olhando com evidente cobiça.

Ela sentia medo – não por si, mas por suas meninas. Annie e Tessa mal tinham idade para lidar com tudo aquilo, mas Elinor construira um mundo de fantasia para suas pequenas, suas bonequinhas. Não sabia se Annie, a mais velha, notava algo, mas a verdade era que nunca foi tão próxima do pai; e Theresa, ainda bebê, mal percebia se Robert estava ou não em casa.

No momento do parto, era acompanhada pela prima Jemima e tia Caroline, sempre fiéis e arrependidas de terem aceitado aquela união fracassada; além do médico, que a ajudava a trazer ao mundo mais um Blair. As crianças estavam junto com a babá, que – Elinor sabia – tinha um caso com seu marido. Engolia todas as humilhações em nome de sua família.

Quando percebeu, já estava com sua filhinha nos braços. Outra menina, bastante pequena e frágil, um reflexo de seu coração, mas que chorava alto, forte, cheia de personalidade. O sorriso de Elinor representava a alegria em ver sua princesinha ali, ao seu lado, com saúde. Acompanharia as irmãs em tudo, e seria a melhor amiga delas.

Enquanto fazia carinhos na criança, buscando acalmá-la das emoções primais de ter vindo a um mundo deveras confuso, Elinor observou surpresa a aparição de duas pessoas em seu quarto: uma delas era o marido, bêbado e alterado, cheirando a álcool, sem vontade alguma de estar naquele aposento.

O outro era um homem que aparecera recentemente na casa dos Blair, preocupado com as confusões nas quais Robert se envolvia – a exemplo de apostas e gastos exagerados. Não o conhecia, mas o barão parecia saber bem quem ele era, e sua presença se fazia sentir: era mais alto, mais forte e imponente que todos naquele quarto, e sua farda vermelha de oficial se destacava entre as faces pálidas das outras pessoas no aposento. Os olhos negros eram de águia, observavam tudo no quarto, e seu rosto era perfeitamente moldado de maneira masculina, com o maxilar definido e a estrutura óssea bem pronunciada. Nasceu para a vida militar.

Mais arrumado e distinto do que os outros, conseguia ser elegante mesmo com um bêbado ao lado, ameaçando retirar a peruca branca milimetricamente calculada, que fazia uma combinação curiosa com sua pele de avelã. Em tudo ele tinha uma máscara de controle, o que sempre impressionou Elinor, além do silêncio de seus gestos e passos. No entanto, não tinha medo de Arthur Danglier, tenente-coronel do exército britânico. Apenas custava a entender o motivo pelo qual ele tinha uma relação tão próxima com Robert, o seu contrário em tudo.

- A criança nasceu, Robert.

- Eu não... Eu não quero... – a voz do barão estava embolada: era evidente que se encontrava bêbado.

- Mas vai querer. É sua filha, não a rejeite.

Arthur empurrou Robert na direção de Elinor, para que ele conhecesse a menina. Enquanto o barão se aproximava meio trôpego, impressionado em quão pequenina era ela, Elinor apenas observou a visita. Fez uma mesura de cabeça, agradecendo a intervenção do militar. Ele apenas se despediu e disse que tinha questões a resolver. Elinor viu Arthur se afastando e Robert entrando na cena, olhando a menininha no braço da esposa.

De súbito, o coração bateu mais forte: aquele bebê indefeso, a menininha frágil e pálida, era sua filha. Sangue de seu sangue, seu tesouro. Passou a mão pelos cabelos ralinhos da menina e se enterneceu.

- Que princesinha linda! Está dormindo...? – olhou, preocupado, para Elinor, os olhos vermelhos e a atitude meio vacilante dos bêbados.

- Sim... Está dormindo, repousando, meu marido. – havia um toque de alegria e emoção em suas palavras. Há muito perdera as ilusões, mas será que aquele bebê iniciaria uma nova história em seu casamento e sua vida?

- Como a chamaremos? Podia... Podia ser "Katherine"... O nome de minha mãe... – sugeriu Robert, bastante amistoso naquele dia.

A jovem apenas sorriu, olhando pela janela as ruas já tomadas por folhas secas no chão, um indicativo de que o outono já estava entre os londrinos.

- Acredito que tive uma ideia...

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O primeiro capítulo sai agora às 23h e o segundo à meia-noite de sábado, seguindo a tradição das publicações iniciais dessa coleção. Fiquem de olho!

Folhas de OutonoWhere stories live. Discover now