- O quê?! - Ela levantou-se rapidamente, afastando-se. - Eu não tenho de te contar coisa nenhuma, não tens nada a ver com a minha vida! Eu nem conheço e…

- Eu estou aqui porque me chamaste. - Respondi calmamente, observando as suas maçãs do rosto a tingirem-se de um tom avermelhado.

- Eu…eu não sei porque o fiz, tá? Esquece, vai embora! - Gritou, enfurecida.

- Ok.

Levantei-me e comecei a caminhar em direção à saída, mas ela travou-me a tempo.

- Ok? Só isso? - A voz dela ecoa pelo pavilhão e eu não me importo. Normalmente detesto estes ataques de fúria femininos, mas sou capaz de lidar com isto quando se trata da Tinna. Ao aperceber-se da escolha de palavras ela mordeu o lábio, contendo um sorriso.

- A subestimar o valor de um “Ok”, Christinna? - Ela está tão próxima que é quase doloroso não poder tomá-la nos braços. Ela riu baixinho e eu ia jurar que esse é o som mais bonito que já ouvi, mas acabou cedo de mais.

- Desculpa. - Balbuciou, soltando o meu braço. - Eu só… eu menti. Quer dizer, não menti do todo…apenas disse que sempre tinha gostado de patinar, o que não é verdade. Embora agora seja apaixonada pela patinagem, foi uma paixão um pouco forçada na altura.

Ela suspirou profundamente e voltou a sentar-se, olhando para as mãos enquanto as esfregava uma na outra.

- Eu comecei a patinar porque a minha mãe me obrigou…eu queria jogar…Baseball.

- Tu quê?! - Não consegui controlar e comecei a rir às gargalhadas. Ela seria a última pessoa quem eu imaginaria a jogar baseball!

- Pára de gozar comigo! - Protestou, reprimindo um sorriso divertido. Sem pensar, peguei na mão dela e tomei-a entre as minhas, fazendo-a sobressaltar.

- O que estás a fazer? - Perguntou, corada e confusa.

- Ahn…a pegar-te na mão? - Belo serviço, capitão óbvio!

A expressão dela relaxou e desviou o olhar, envergonhada.

- Ok…certo… então, eu tinha uma tendência estranha para gostar de coisas pouco femininas, como subir às árvores, jogar futebol, e brincar com coisas nojentas como formigas e outros insetos. A minha mãe desde cedo se apercebeu desse meu lado mais…selvagem…e decidiu intervir. Primeiro foram as aulas de ballet, mas eu sentia-me como um pequeno leitão dentro de um fato-de-banho cor-de-rosa aos folhinhos. Então fiz birra todos os dias, e uma vez em que a minha professora de ballet disse que adorava o meu cabelo, como revolta, eu peguei numa tesoura e cortei-o pequenino como o de um rapaz.

Tenho consciência de que a minha boca deve estar a fazer um “O” perfeito, mas eu juro que de todas as coisas que ela me pudesse contar, esta seria aquela que eu nunca adivinharia.

- Quando começou a ver que aquilo não ia levar a lado algum, a minha mãe tirou-me do Ballet e pôs-me nas aulas de violino, mas eu parti-o quando o usei para servir de taco de baseball. Foi aí que descobri a minha verdadeira paixão…e levei uma coça por isso.

- Tu partiste um violino?

- Eu parti um violino…

- Ok.

- Pára de dizer ok.

- Ok.

Ela fez uma careta e eu sorri, incentivando-a a continuar.

- Quando ela já começava a desesperar e a ponderar mandar-me para um colégio de freiras, ela pôs-me na patinagem. Na altura estava a fazer os meus 7 anos...No inicio não gostei, era horrível sabes? Ter de me maquilhar e enfiar-me em vestidos brilhantes… Levei alguns anos até conseguir ir para as aulas sem fazer uma cena de gritaria pelo caminho. Eu via os meus amigos a divertirem-se livremente, a jogar na rua e a serem felizes à maneira deles e eu…bem, eu tinha de ser aquilo que a minha mãe queria que eu fosse. Era frustrante compreender isso em miúda, e mesmo agora ainda me custa entender como é que uma mãe é capaz de obrigar uma filha a ser algo que ela não é.

Love WingsWhere stories live. Discover now