Orgulho

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   O céu estava escuro e fazia frio. Joana vinha sentada no banco traseiro do taxi, pensativa. O motorista comentava com ela que tinha ouvido no programa de rádio que seria um dia de chuva intensa. Ela concordava, educadamente, mas sua mente estava em outro lugar. Enquanto passava pelas ruas em direção ao aeroporto, observava a ventania agitar o guarda-chuva de um pedestre, que lutava para que o objeto não saísse voando rua acima. A cena a fez esboçar um sorriso tímido. O motorista tamborilava os dedos no volante, enquanto o rádio tocava "Não pegue esse avião", de uma banda de forró das antigas.

Que filho da mãe. Pensou.

O clima e a música do rádio pareciam estar em sincronia. Todo o cenário parecia bem condizente com a ocasião.

    Minutos depois, ao chegar no aeroporto, desceu do taxi e vinha pelo saguão com as malas na mão. Seu voo estava programado para daqui a uma hora. Olhou o relógio e respirou aliviada por ter chegado a tempo, sem atrasos. Naquele momento não desejava estresse adicional. Olhou através dos vidros a chuva castigar a rua, pegando os desprotegidos e lavando a cidade. Pegou o celular e abriu o aplicativo de mensagens: nenhuma nova notificação. Seus olhos ficaram úmidos. Ensaiou digitar alguma coisa, mas apagou logo depois. O céu trovejava e uma criança próxima a ela começou a chorar, assustada. Isso a distraiu um pouco. Enxugou os olhos disfarçadamente e ajudou a mãe da criança a deixá-la mais confortável. Pegou uma balinha da bolsa e entregou a menininha, que agradeceu sorrindo. Seu celular vibrou e seu mundo todo se voltou àquela tela. Mensagens da operadora. Nunca sentiu tanta vontade de atirar o celular no chão.

    Ouviu a chamada para seu voo. Acariciou a cabeça da garotinha, pegou sua mala e foi em direção ao portão de embarque. Ao chegar lá, ouviu um rapaz chamar por alguém. Como reflexo, ela se virou naquela direção. No entanto o chamado não era para ela. Entrou no avião, que já estava com as turbinas ligadas e sentou na sua poltrona. A comissária dava as instruções de segurança, mas ela parecia não se importar. Olhou para o celular e nada de notificações. Bastaria uma mensagem para ela sair do avião e voltar. Não a receber significaria o fim de tudo. O piloto anunciou a decolagem e Joana apertou os cintos. Encostou a cabeça na poltrona, fechou os olhos e deixou tudo fluir. Desligou o celular. Não haveria mais volta. O avião subiu em direção ao céu escuro, cinzento e carregado de chuva.

    No chão, alguém observava a aeronave partir. Segurava um guarda-chuva e trazia um semblante triste. Fechou o assessório e caminhou pela rua, com a chuva a disfarçar suas lágrimas.

Não chegou a tempo. 

Campo de GirassóisWhere stories live. Discover now