1.1. Monstros na Fazenda

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Parece um final de tarde normal na Fazenda do Pombal. As nuvens rareiam, no típico clima seco do inverno. O céu, de azul desbotado quase cinza, é tingido pelos últimos raios de sol e adquire tons alaranjados e vermelhos. Os sons dos pássaros começam a se acalmar para o período noturno.

A família da Silva Xavier se posiciona para o encontro diário que marca o fim do dia. O cheiro do jantar, preparado pela mucama Nena, inunda a sala. Arroz com cenoura, carne de porco assada, couve refogada com muita cebola e alho, mandioca cozida e outros deliciosos aromas se misturam.

Quando a imagem do prato se forma na mente de Joaquim José, ele deixa escapar um veloz besouro, capturado instantes depois por Pedrinho.

Joaquim possui 9 anos de idade e é o quarto filho na linha de sucessão do casal Domingos e Antonia. Ele está na sala de jantar, brincando com alguns insetos que coletou no chão. Com ele está Pedro, o filho de Nena.

O irmão mais velho é Domingos Filho. Ele possui 17 anos e está sentado em escrivaninha de trabalho, onde examina antigos mapas de Portugal. Maria Vitória, quatro anos mais velha que Joaquim, está de pé e espia os documentos escrutinados pelo primogênito.

O chefe da família lê uma sequência de cartas, sentado em uma poltrona na sala ao lado. Lentamente sorve uma bebida destilada da cana, de cor amarela clara, produzida no sítio. Atrás dele uma estante escura ostenta 41 livros, uma das maiores bibliotecas daquela região da Capitania de Minas Gerais. O número de volumes, superior ao de escravos que viviam no local, mostra uma valorização do conhecimento pela família. Naquele ano de 1755, vários dos tomos custavam mais que um escravo jovem.

De repente, um grito alto e lento gela a espinha da família. O som vinha da parte externa da casa. Provavelmente do oratório! A mãe Antônia estava lá, onde, ao escurecer, sempre acendia velas e alinhava seu espírito ao da Santíssima Trindade, da qual era devota. Como todos os dias, Antonio, de dez anos, está rezando com a mãe. Domingos dá um salto, músculos enrijecidos, pega um bacamarte em uma parte oculta da estante e dispara em direção ao sinistro som.

Aquela não era uma arma de fogo comum. Era um artefato que Joaquim nunca tinha visto, e ali ele já entendeu a gravidade da situação. O irmão mais velho apanhou uma lâmina e correu com o patriarca. Joaquim, aterrorizado, sentia raízes que prendiam seus pés ao chão, mas fez um esforço enorme e correu atrás de seu pai.

Após cruzar a parte gramada, ao chegar no alpendre, a visão que mudaria a vida do menino. Um vulto escuro postava-se encostado a um dos escravos da fazenda, ou ao que restava do escravo. O corpo do cativo parecia ter secado, e uma mancha rubra era visível acima do ombro.

Tiradentes Jovem contra os VampirosOnde as histórias ganham vida. Descobre agora