Capítulo 6

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O dia amanheceu movimentado.

Ilma corre de um lado para o outro com seu avental sujo de açafrão. Eu quase não respiro com todos os afazeres. Dona Yolanda, sua mãe, aparece para ajudar a organizar milhares de salgados encomendados pela prefeitura para a festa de final de ano.

Hoje a noite o prefeito reunirá seus convidados para uma confraternização tradicional da cidade. Apenas um grupo seleto irá participar.

― Agatha, pode me ajudar quando terminar aí? ― ilma aparece na porta da lavanderia ― Preciso agilizar a montagem dos assados.

― Claro. Vou em dois minutos.

O agradecimento vem com um sorriso.

Corro para ajudar. É quase uma operação de guerra, todos concentrados e atentos as contagens e proporções exatas. Muito estava pronto, o que facilitou tudo, mas sempre há trabalho pela frente.

Antes das 17h Ilma diz que devo atender um telefonema na recepção. Vou até lá limpando as mãos em um pano. Estou esgotada, cabelos para cima e pernas doendo.

― Alô? ― atendo desconfiada.

― Sou eu.

― Inácio? Como tem este número? ― oh idiota ― Esquece. Claro que você tem o número da pensão.

― Você está bem? ― pergunta muito mais sério do que me lembro de ontem. Ele está em seu modo "homem superior ao mundo".

― Estou bem. Ajudando Ilma com algumas coisas, porque tem bastante serviço hoje. Se você quiser me ver hoje, acho que teremos que marcar para mais tarde.

― Agatha.

― Talvez em uma ou duas horas. ― estou tão surpresa com sua ligação, que não paro de falar ― Tomo um banho rápido e...

― Agatha, ― interrompe falando mais alto ― Não nos veremos hoje.

Uau! Que banho de água fria.

Engulo as palavras. Congelo na garganta as frases elaboradas e deixo o ar voltar aos meus pulmões. Não que ele tenha obrigação de me ver, ou que tenhamos combinado algo. Apenas esperei que sim.

― Eu havia esquecido de um compromisso. Infelizmente não posso cancelar e deve terminar tarde.

― Tudo bem.

Não. Não está tudo bem.

― Nos vemos amanhã?

― Você me liga. Já sabe o número. ― solto antes que engasgue ― Tenho que ir. Ilma precisa de mim. Adeus.

Desligo.

O que acabei de fazer não tem nenhuma lógica. Eu sei. Mas do que interessa a lógica quando meu coração saltava feliz apenas com a voz dele verbalizando o meu nome do outro lado da linha?

É infantil e precipitado, mas fiz o que deu vontade. Amanhã posso não estar disponível. Quem disse que estarei sempre aqui quando ele puder me ver?

Que ódio!

Sem dúvida não é este o sentimento, mas é ruim. Péssimo na verdade.

― Que cara de velório, menina. ― diz dona Yolanda quando retorno.

Nego com a cabeça e volto ao que estava fazendo.

Paixão SúbitaOnde as histórias ganham vida. Descobre agora