02 - Lar doce lar

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Me deitei na cama afundando minha cabeça no travesseiro e permaneci naquela posição por alguns minutos. Apesar do cansaço físico, eu não estava com sono e ainda não era muito tarde. Deveria ser umas 9:00 horas.

Me ajeito em cima daquele colchão macio e tiro meu celular do bolso direito da calça jeans que estava usando. Checo as mensagens e vejo que tem uma de Brad.

"E ai, cara? Me conta tudo quando chegar na casa da sua avó."

Brad Lincon era meu melhor amigo desde a 5° série. Estudamos juntos quase que a vida inteira na minha antiga escola. Ele era um bom amigo, me ajudou bastante durante todo o processo de adaptação quando descobri a doença da minha mãe. Nossos hobbies se baseavam, praticamente, em assistir filmes de terror na minha casa aos sábados. Hoje estaríamos assistindo um, se eu não estivesse tão longe de lá. Ele costumava dizer que meus pesadelos eram consequência desses cinemas improvisados que a gente fazia. Quando soube que eu ia me mudar, ficou um pouco apreensivo, mas combinamos de continuar mantendo contato.

Deduzo que ele está acordado por causa do horário e mando uma mensagem de volta.

"Tudo normal até agora. Nada demais aconteceu."

Poucos minutos depois, meu celular vibra com outra mensagem dele.

"Qual é, me conta os detalhes."

Ri baixo, sua persistência era impressionante.

"Já disse, nada demais. Aqui é uma cidade como outra qualquer, não é como se o presidente fosse me receber."

"Tá bom, tá bom. Vou sair agora, depois nos falamos."

Mando um "ok" e deixo o celular em cima da escrivaninha. Noto que a primeira gaveta da mesma estava entreaberta e termino de abrir, dentro dela tinha uma espécie de livro de capa vermelha; o pego e me sento na cama. Ao abrir vejo que se trata de um álbum de fotografias da mamãe em seu tempo de escola. Havia diversas fotos dela com suas amigas, amigos e até mesmo com meu tio. Passo para a página seguinte e nela um grande sorriso estava posto no rosto da minha mãe que era acompanhada de duas amigas, pareciam muito felizes.

A cada página virada, eu via mais e mais fotos que revelavam a adolescência da linda moça Ethel Griffim. Me perdi ali dentro e fiquei imaginando todas as cenas que as fotos me proporcionavam. Não reparei por quanto tempo fiquei olhando aquele álbum e nem a hora que adormeci com ele em cima de mim...

Pequenos raios de luz insistiam em entrar no quarto pela brecha da janela e batiam em meu rosto demonstrando que havia amanhecido. Abri meus olhos lentamente, com preguiça de me levantar. Fortes batidas na porta do lado de fora do quarto fazem eu pular da cama.

— Acorda, Ignis! — gritou meu tio.

— Eu... Eu estou acordado — respondi baixo um pouco atordoado.

— Ignis! — voltou a gritar.

Olhei para os lados e encontrei o álbum no chão.

"Deve ter caído enquanto dormia" — pensei.

Apanhei e guardei de volta onde encontrei na noite passada. Fui em direção a porta e abri, meu tio estava lá, com uma expressão agitada.

— Cheguei a pensar que você tinha morrido aí dentro. O café da manhã está pronto.

— Eu já vou descer, só preciso de um banho antes.

— Hum... Tá bom. Vê se não demora, vou embora daqui há pouco.

— Fico pronto em 20 minutos, no máximo.

Meu tio balançou a cabeça em concordância e saiu. Fechei a porta e me encostei nela, processando tudo que acabou de acontecer. Precisava ser rápido, peguei uma toalha de dentro da minha mala e segui para o banheiro. Ao entrar, eu me vi. Olhei a figura a minha frente como se fosse um ser de outro planeta. Estava diante de mim mesmo, a imagem que o espelho refletia era de um garoto branco, um pouco magro e com algumas olheiras. Os cabelos ruivos estavam bagunçados e a cara de sono era impossível de não se notar. Abri o chuveiro e me coloquei debaixo dele, a água gelada entrou em contato com minha pele, relaxando todos os músculos do meu corpo. Depois escovei os dentes e vesti uma roupa: uma camisa amarela de gola e um short jeans.

Desci degrau por degrau da escada e escutei vozes vindas da cozinha. Meu tio e minha vó estavam sentados à mesa, conversando sobre a ida dele.

— Fique mais uns dias, filho. Isso não vai te matar.

— Não complique ainda mais as coisas, mãe. A senhora sabe que eu preciso ir.

— Bom dia! — falei me sentando em uma cadeira, interrompendo a conversa.

— Bom dia, querido! Se sirva à vontade, preparei panquecas — me passou uma bandeja de vidro cheia de panquecas.

Peguei uma e coloquei no prato que já estava na mesa, olhei de relance para o meu tio que me encarava com uma cara que dizia "Obrigado, chegou bem na hora, não sei por quanto tempo mais ia conseguir segurar a fera." Não que minha avó fosse brava e cruel como aquelas feras assustadoras de filmes e livros, mas era bem convincente quando queria.

— Está ansioso para as aulas começarem, Ignis? Já é amanhã! — disse meu tio.

— Um pouco. Ser o novato não é muito legal — me encolhi na cadeira, pensando nas dificuldades que ia encontrar por ser o "garoto novo da cidade".

— Não se preocupe, querido. Todos de Stowe são muito receptivos, tenho certeza que logo você vai se enturmar. Foi nesse mesmo colégio que sua mãe e seu tio estudaram — sua voz era nostálgica.

Stowe High School era o único colégio da cidade, possuía incríveis 383 alunos. 384 agora. Pelo fato de ser a única instituição de ensino, praticamente toda a cidade estudou nela, inclusive minha avó quando mais nova.

— Tomara, vó — dei uma garfada na panqueca.

— E você não pense que se livrou da nossa conversa. Precisa mesmo ir? — perguntou minha vó, retomando ao assunto inicial.

— Preciso, mas não é um adeus, mãe. Eu venho visitar vocês dois — meu tio disse com a voz cansada.

— Está bem — suspirou convencida.

O restante da manhã foi tranquila, meu tio foi embora após terminar o café da manhã; eu e minha avó o vimos partir da entrada da casa. Ficamos lá fora até perdermos o carro de vista. Foi um episódio engraçado levando em consideração que ele quase não conseguia ir devido a tantos abraços e beijos que minha avó depositou nele, mas por fim, conseguiu. Avisou que ligava quando chegasse em Montpelier.

No almoço, eu ajudei a preparar toda refeição. Em quesito de cozinha, eu era um desastre, mas foi fácil com minha avó dizendo o que fazer. No final: arroz, salada e frango grelhado foi nosso cardápio. Nos sentamos na mesa igual como de manhã, com diferença que agora era somente eu e ela. Coloquei um pouco de arroz e salada no meu prato e ela repetiu a ação.

— Vó, eu queria agradecer — precisava falar isso para ela.

— Pelo o quê, querido? — olhou para mim com toda atenção.

— Por me deixar ficar com a senhora, por mudar sua rotina por mim... por tudo.

— Eu que agradeço. Desde a morte do seu avô que essa casa é solitária, e eu também. Sua presença me deixa bastante feliz! — sorriu docemente.

— Prometo ajudar a senhora em tudo que precisar.

— Sei que é um momento difícil para você, para nós todos na verdade. Por isso que devemos passar por essa situação juntos, está bem? — estendeu sua mão e colocou por cima da minha.

— Está bem! Obrigado de novo — agora foi a minha vez de sorrir.

— Vamos comer antes que a comida esfrie.

— Vamos.

O dia passou como a manhã, tranquilo. Arrumei todas as minhas roupas no guarda-roupas, ajudei minha avó com o jantar, observei ela tricotando na sala e olhei novamente o álbum de fotos no meu quarto. Stowe era realmente uma cidade pacata e tranquila, pelo menos nada de extraordinário aconteceu até agora. Talvez fosse muito cedo para comemorar, afinal, amanhã seria o meu primeiro dia de aula aqui e na escola tudo pode mudar. Só torço para que tudo dê certo. 

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