Capitulo 3 - Velho Mundo

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_Imagina só, os mortos ganham vida, levantam dos túmulos e saem por ai mordendo as pessoas. Não seria uma estória genial? – Scotth termina a narrativa e olha pro irmão enquanto mastiga seu café da manhã.

_Não. – Sam sorri nervoso. – olhe em volta, isso seria plágio. Alguém já escreveu isso e aposto que agora está rindo de nós.

Os irmão se encaram sem muita emoção. Pela janela podiam ver Dave, Ben e Hanna fazendo um funeral improvisado para os pais de Dave e o outro homem; os dois e Sarah ainda sentiam-se intrusos na casa e optaram por ficar na cozinha. Durante a noite ajudaram a queimar os corpos e ajudaram a cavar os buracos, depois retiraram-se. Agora permaneciam distantes e puderam ver pela janela o momento em que tudo acabou. Dave entrou pela porta principal e subiu as escadas, ele passara a noite em claro preparando o quintal e recolheu-se para descansar. Ben permaneceu no quintal encarando as lápides improvisadas como se aqueles fossem os primeiros mortos que tinha visto na vida e Hanna tentava conversar com ele.

_Nós estamos sobrando aqui, vamos dar um tempo... Procurar uns suprimentos talvez? – Scotth esperou que eles respondessem.

_Eu vou com você – Sarah recolheu a louça da mesa e buscou sua mochila na sala.

 _Sam?

_Eu vou ficar. – o plágio ainda ecoava em sua mente, se ele descobrisse quem teve a maldita ideia... – tudo bem, vocês podem ir, eu vou me comportar.

Scotth murmurou algo como “juízo” e saiu com Sarah depois de buscar suas coisas e se preparar.

**

_Eu ia naquele show. – Sarah parou de repente em uma esquina encarando um outdoor rasgado no alto de um prédio.

_Sarah... – Scotth parou ao seu lado. Ele não queria ser indelicado mas não era conveniente que permanecessem ali no meio da rua. Então percebeu a porta da cafeteria da esquina aberta – vem, entra aqui.

Eles entraram, ele encostou a porta e conferiu o local antes de ficar mais relaxado, deixou a mochila sobre uma mesa e revistou atrás do balcão. Voltou com duas latas de chá e sentou-se encarando as revistas expostas. Nas capas as manchetes do mês anterior, as fofocas da mídia e os resumos da novela.

_Eu trabalhava em um mercado, tinha um suporte de revistas igualzinho a esse do lado do meu caixa. Tinha uma prateleira de doces também.

_Esse mundo não existe mais né?

_Não. – Scotth respondeu encarando sua lata de chá e pensando que pouco importava se ele estaria vencido. – Esse mundo não existe mais Sarah.

**

Sam recolheu algumas garrafas vazias de cerveja e vodka que encontrou na garagem e levou para a sala, ajeitou elas formando um triangulo e admirou seu serviço. Voltou para a garagem inquieto, parou e passou os olhos pelo local até encontrar o que precisava, pegou uma bola de basquete em um canto e a levou para a sala.

Dave descia as escadas e estranhou o movimento no andar inferior, quando se deu conta do que estava acontecendo terminou de descer irritado e entrou na sala a tempo de parar a bola com os pés. Fechou os olhos e respirou fundo tentando manter seu autocontrole, uma, duas, três, quatro vezes. Abriu os olhos a tempo de ver Sam se jogando no sofá.

_ Eu costumava jogar boliche – foi a única coisa que disse em sua defesa. Encarou seus tênis desamarrados, voltou a olhar o menino a sua frente e continuou – essa estória é uma droga! Uma porcaria, como você cria um inimigo que não pode derrotar? Uma coisa que infesta o mundo inteiro! Se esse roteiro fosse meu essa estória seria muito melhor. – ele apoiou os cotovelos sobre as pernas segurando a cabeça.

Nesse momento Scotth entrou na sala vindo pela porta da frente, ele trazia duas sacolas. Uma estava cheia de revistas, HQs e algumas coisas aleatórias, essa ele deixou sobre a mesa; a outra tinha latas de refrigerante, garrafinhas de suco, salgadinho, bolacha e barrinha de cereal. Ele tirou uma latinha de coca quente e ofereceu a Dave. Observou o irmão por um momento e voltou-se para o garoto ao seu lado.

_ Não liga, ele está passando por uma crise criativa. – Então ele notou as garrafas e a bola – A gente era acostumado a muitas coisas no velho mundo sabe... Essa coisa de viver de silencio é complicada.

Dave havia pego a latinha e agora tomava a bebida quente, ultimamente aprendera que era delicioso. Alguns dias era a única coisa que tinha pra tomar, as vezes nem água encontrava. Ele escutava Scott enquanto observava Sam e quase ficou surpreso quando o roteirista voltou a falar.

_Eu já disse que essa estória é uma porcaria? Quem escreveu isso?

_Vai dar uma volta, menino. Vou falar com meu irmão.

Dave acenou com a cabeça concordando e saiu para o quintal deixando-os sozinhos. Boliche... Dave nunca jogou boliche na vida e essa era uma coisa que ele nunca saberia como é. Ele sentiu por um momento o gosto do refrigerante com saudades das maquinas dos cinemas, com copos e gelo. Então chegou ao quintal e parou de repente, nos fundos da casa estavam as lápides improvisadas. Ele ainda não tinha certeza de como se sentia em relação a isso, havia passado muito tempo enfiado na casinha da arvore se comportando como se os pais não fossem seres humanos, mas ao mesmo tempo não conseguira ele próprio matá-los. Optou por desviar seu caminho e encontrou Ben sentado na caixa de areia ao lado da arvore onde a casinha fora construída.

_Você está bem? – Dave sentou ao seu lado

_Estou. Eu... sinto muito pelos seus pais.

_Tudo bem, cara. Eles já não eram meus pais. Eu ajudei meu pai a construir essa casinha sabe... nós fizemos juntos, minha mãe ajudou a pintar...  Mas não essas coisas, essas coisas não eram meus pais já faz tempo.

_Não, não eram. Eles estão em paz agora né.

_Uhum.

_Dave... – Ben encarava a casa principal – você, sabe... tá legal mesmo?

_Estou cara, só arrumamos uns malucos pra morarem com a gente. – ele esboçou um sorriso pra mostrar ao amigo que ia ficar tudo bem ainda que nem ele acreditasse muito nisso.

_Nós podemos ser uma família. Sabe, a Hanna é legal e os caras que você encontrou também.

Dave considerou seriamente se devia contar que um dos caras que ele encontrou era um roteirista maluco passando por uma séria crise criativa que quase fizera um boliche na sala atraindo todos os zumbis da cidade para a casa. Mas, claro, fora isso eles eram legais sim. Acabou concordando com Ben com um sorriso pra não deixar ele chateado.

_E você, está bem mesmo? – Dave perguntou despenteando o cabelo de Ben.

_Acho que sim. Eu nunca pensei que fosse sentir tanta falta da escola e outras coisas...

_A gente pensava que vivia no inferno, que tudo era uma droga, olha só pra gente agora.

_Você acha que um dia as coisas vão voltar ao normal, Dave?

_Completamente ao normal? Não. – ele percebeu que uma lagrima escorria pelo rosto de Ben e tentou ser mais ameno. – As coisas não serão como antes cara, mas vão melhorar viu.

_Você acha?

_Acho sim. Esquece o mundo que a gente conhecia ,ele não existe mais, o velho mundo... Mas olha, esse aqui que existe agora ainda vai melhorar. – e abraçou o amigo.

Além dos Mortos (Pausado)Where stories live. Discover now