✎ capítulo um

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Eu havia prometido para mim mesma que, após o nono macho escroto me dar um pé na bunda, eu nunca mais iria chorar por desilusão amorosa. E eu estava indo muito bem, obrigada, até que o Matheus Número 3 veio me dizer que não queria mais nada porque o meu cheiro lembrava muito a falecida cachorrinha dele.

Oi?????????

Bem, depois disso, não teve muito o que fazer. Eu tentei reler as partes tristes do Marley & Eu para fingir que meu choro era só por causa do cachorro morrendo, mas não dava pra enganar a mim mesma para sempre. No final daquela noite, fui dormir chorando em posição fetal sentindo pena de mim mesma, enquanto eu tinha total certeza que o outro lado da história ainda estava acordando numa festa qualquer rindo da minha cara de trouxa.

Era isso o que eu era. Uma trouxa. Com todas as seis letras e o sentimento de humilhação envolvidos.

Meu período de auto-pena teve que terminar dali a dois dias, quando a semana começou e eu fui obrigada a voltar para a escola. Não foi a pior coisa do mundo, porque na verdade eu já estava acostumada a mostrar minha cara de derrota nas segundas-feiras – depois de tantas vezes, os professores pararam de se importar quando eu aparecia toda inchada de chorar – e, também, depois de tanto quebrar a cara eu acabei desenvolvendo um jeito de não sofrer tanto assim nos períodos das trevas que sucedem um pé na bunda.

A primeira coisa que você tem que fazer é contar suas vitórias diárias. A gente acaba percebendo que não somos um lixo ambulante quando nos orgulhamos das pequenas coisas que fazemos, que de vez em quando não percebemos o quão importantes elas são. A primeira vitória do dia é: levante da cama.

Nunca deixe que qualquer um te abale tanto que você não tenha forças para ir viver. Levante da cama. Todos os dias. Nem que seja só por o pezinho no chão.

Levante da cama. Vai por mim. Depois disso, tudo fica mais fácil.

A segunda coisa é fazer uma maratona de filmes. Primeiro, um filme de menininha pra te fazer chorar mais ainda; depois, assista o mais violento que você consiga aguentar – de preferência, algum que a mocinha mate um monte de homem nojento.

Antes que você pergunte, não é como se eu fosse aquela amiga encalhada louca dos gatos dedo podre que todo mundo tem. Eu só tive muito azar e aprendi a lidar sozinha – não é todo dia que suas amigas estão com paciência para ouvir sobre como o menino não apareceu no segundo encontro – com toda essa coisa de quebrar a cara.

Quer dizer, não foram tantas as vezes que eu me ferrei por causa de homem assim. Foram só quatorze desilusões amorosas.

Bem, talvez eu seja a amiga encalhada louca dos gatos dedo podre, só que com exceção dos gatos.

Era nisso que estava pensando quando cheguei na escola, só alguns minutos antes do sinal da primeira aula tocar – qual a probabilidade do terceiro Matheus também te dar um fora com direito à humilhação garantida? – e estava convicta que não iria abrir a boca pra ninguém sobre o ocorrido no sábado quando encontrei o Renato, conversando com alguém aleatório perto da porta da classe. Eu me aproximei e quando ele me viu, se afastou para vir falar comigo.

-Renato, por acaso eu cheiro a cachorro? – indaguei, antes que ele pudesse sequer me dar um oi.

-O quê? – ele respondeu, franzindo a testa.

-Você me ouviu – falei, andando rápido para entrar na sala, como se todos que estavam à minha volta soubessem da minha recente humilhação e estivessem me julgando.

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⏰ Last updated: Aug 25, 2018 ⏰

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A dança das abelhas Where stories live. Discover now