Capítulo dois

216 19 3
                                    


PASSADO

7 MESES ANTES

— Cadê a porcaria do meu brinco?! — berrou a noiva, e, imediatamente, todas as doze madrinhas se colocaram em estado de alerta, gritando e correndo pelo quarto à procura do brinco, porque aquele já era o quinto ataque que a noiva dava em menos de quatro horas de preparação.

Como nenhuma delas parecia ser capaz de encontrar o brinco, começaram a jogar a culpa umas nas outras, em completo desespero, e não demorou muito para que todas encontrassem um inimigo em comum, alguém que podia e deveria levar a culpa.

Eu.

— Estava com a assistente da cerimonialista! — gritou uma delas, apontando o dedo magrelo e ossudo em minha direção, com a ponta de sua unha postiça vermelha perigosamente perto dos meus olhos.

Quando aqueles treze rostos ameaçadores me encararam, senti uma dor de barriga, mas mantive a pose. Afinal de contas, eu já vinha fazendo aquele trabalho há três anos, e uma noiva dando um ataque de pelanca não era nenhuma novidade.

— Fiquem calmas, moças, não vamos querer borrar a maquiagem logo agora, não é?

"Domine as feras, Felipa", disse para mim mesma. "Elas são como animais selvagens. Se sentirem o cheiro do seu medo, elas atacam".

— Querida — falei, dirigindo-me à noiva, que tinha as pupilas dos olhos dilatadas e estava desde às duas da tarde procurando uma desculpa para sair no braço com alguém. — Quando foi a última vez que você viu seu brinco?

— Eu não sei! Eu sou a noiva! Não sou em quem tem que cuidar desse tipo de coisa!

Criei imagens mentais em que eu esganava a noiva com seu véu, e aquilo ajudou a me manter calma e serena. Não consigo entender o porquê de algumas mulheres, no exato momento em que ficam noivas, começarem a agir como se tivessem sido escolhidas pelo universo celeste para serem a porta-voz da discórdia e do caos. O único objetivo da vida dessas mulheres é causar confusão e fazer tudo girar ao redor dos seus umbigos.

Toda vez que voltava de um trabalho como assistente de cerimonial, prometia para mim mesma que, quando chegasse minha vez, seria a noiva mais tranquila e bacana de todos os tempos. Não que eu pretendesse me casar. Ou namorar. Ou sequer cruzar meu olhar com o de algum homem por aí. Minhas experiências desastrosas com o amor já deixaram bem claro que era melhor ser solteira do que feita de idiota por um cara que consegue passar 17 horas consecutivas jogando videogame, mas não tem estrutura emocional para lavar uma pia cheia de louça suja.

— Tudo bem — falei, dando um sorriso amarelo. — Eu vou lá embaixo e vou procurar. Vocês, continuem aqui, fiquem calmas e bebam mais uma taça de champanhe. Tirem umas fotos, façam várias selfies e... divirtam-se!

Antes que qualquer uma daquelas cavaleiras do apocalipse pudesse dizer mais alguma coisa, eu corro pela porta e fujo para a sala da casa da noiva, onde encontrei Karina escondida atrás de uma estante.

— Karina! Você me deixou sozinha com aquelas malucas!

Ela arregalou os olhinhos puxados e mostrou o celular como desculpa.

— Desculpa, Pipa, mas eu estou ligando para a Suzana vir nos resgatar logo!

Fui obrigada a concordar que aquela era uma boa desculpa para o desaparecimento de Karina na última meia-hora. Suzana, a cerimonialista, era a única que poderia nos salvar desse inferno, mas, como de costume, ela estava na paz e no silêncio sagrado da igreja, certificando-se de que as rosas eram realmente vermelhas, e não apenas rosa escuro, como aconteceu no último casamento, o que quase fez a noiva enfartar.

Querido Estranho [DEGUSTAÇÃO]Onde as histórias ganham vida. Descobre agora