II

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Você sempre soube o mal e o bem que me fazia. Sempre soube que eu sentia algo por você.

Mas você não sabia o que era. E eu não me dei o trabalho de contar.

Quando eu fiquei sabendo do seu novo namorado, a minha primeira reação foi espanto. Alguns dias atrás você disse que eu não devia me preocupar sobre ser suficiente pra você, pois você não seria feliz ao lado de ninguém.

Minha segunda reação foi felicidade. Por você, claro.

E minha terceira reação foi a destruição. Eu havia acabado de ser destruída interiormente e exteriormente.

Mas eu nunca poderia te culpar por buscar algo que você jamais teria comigo.

Apesar de acabar aceitando, eu sabia que não conseguiria ver vocês dois sendo felizes um ao lado do outro, por isso eu decidi que iria partir.

E eu pretendia fazer isso, da mesma forma que pretendia te esquecer e deixar você viver sem o meu fantasma para te assombrar.

Só que eu precisava me despedir, e como nós sempre fomos bons amigos, não foi difícil te tirar de casa pra beber algo com nossos amigos.

E você sempre exagerou nas doses que tomava, logo estava caindo e lá estava eu te levando pra casa. Sem intenção alguma.

Sua família não estava em casa, e eu esperava dar um banho em você, te colocar pra dormir e ir embora.

Mas em algum momento as coisas esquentaram pra você. E você quis fazer com que eu sentisse esse calor também.

Naquela noite, mesmo com a culpa transbordando por minha pele, nossos corpos ainda se moviam de forma frenética.

Eu via o homem que eu amava diante dos meus olhos, você não via nada.

O álcool em seu sangue estava transbordando também, e não era comigo que você queria estar.

Mas eu não consegui dizer não aos seus beijos e carinhos. O homem que eu amava estava dizendo que me amava também. E mesmo sabendo da mentira que saia da boca dele, eu cedi sem ter muito direito de escolha.

Eu sabia que no dia seguinte, quando você acordasse e se desse conta do que havia acontecido, você não me culparia. E não culpou.

Você enxugou as inúmeras lágrimas de culpa e arrependimento que escorriam por meus olhos.

Eu pedi pra você dizer para seu namorado que eu havia me aproveitado de você enquanto você dormia, mas você negou e disse que jamais faria isso.

Você brigou comigo quando eu disse que a culpa era minha por ter ficado com você enquanto estava bêbado, mesmo sabendo que você estava em um outro relacionamento. Você disse que eu não devia me culpar tanto.

Me pediu pra esquecer a idéia de que eu havia acabado com tudo e para que deixasse você resolver isso.

Mas você sempre soube o furacão que eu era. Você sempre soube que eu destruía tudo que eu tocava. E foi assim com você também.

Eu vi aos poucos você perder a confiança em si mesmo. Eu vi você se afastar das pessoas que estavam a sua volta por não se sentir mais a vontade ali.

Eu vi toda a felicidade que você não conseguiu construir comigo, mas sim com ele, se despencar e despedaçar sobre nossos pés. E eu não pude fazer nada pra mudar isso, pois eu havia causado.

E como eu havia prometido, eu não tive muito tempo pra ver você mudar completamente, pois eu parti e deixei tudo pra trás.

Eu deixei amigos, família e você. Você que era a pessoa que mais me importava no mundo.

Eu te deixei pra trás pois eu não sabia seguir em frente vendo você fazer isso sem mim.

E eu achava que seria melhor assim.

Mas não teve uma noite em que eu não chorei lembrando dos nossos carinhos e do seu falso eu te amo.

Eu nunca deixei de dizer que te amava, porque eu nunca deixei de te amar.

Mas eu vejo como você evoluiu. Eu vejo suas fotos em redes sociais e vejo como sua autoestima melhorou e como você parece mais feliz.

Você está com uma pessoa nova, e ela parece uma pessoa tão feliz. Tão perfeita pra você.

E então eu finalmente cai na real e vi como tudo finalmente fez sentido.

O único problema que te afastava de você, sempre fui eu.

E quando eu parti, o seu sentimento culpa e de insuficiência partiram também.

E olhando pra você hoje, eu só consigo sentir inveja.

Eu queria que me afastar de você tivesse tido o mesmo efeito em mim também. Mas hoje, em cada canto vazio dessas quatro paredes, eu vejo o cinza se alastrar e tomar conta dos meus dias.

(...)

discombobulateWhere stories live. Discover now