Quem sou eu

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Eu ainda estava atordoado, sem entender direito o que tinha acontecido. Olhei para Phet que me encarava com um semblante sereno.

— O que foi tudo aquilo?

— Aquele era o outro caminho. O universo guarda em si todas as possibilidades. Se você tivesse voltado com Quel-sí, acabaria aqui, nesse mesmo lugar. Mas não só o seu caminho seria alterado. Dirhen e Quel-si viveriam infelizes por muito tempo antes de se reencontrarem. Eles te procurariam por muito tempo e nunca teriam certeza do seu paradeiro. Seria muito mais difícil seguir em frente.

— Mas Ren e Kelsey ainda ficariam juntos?

— Sim. A linhagem deles é especial. Seus filhos são importantes.

— Mas se o destino de Kelsey sempre foi ficar com Ren, por que Durga levou suas memórias? Por que da aversão que ele sentiu por ela, por tanto tempo? E o ativador era um beijo entre eu e ela. A própria Deusa incentivou Kelsey a seguir em frente. Tanto sofrimento teria sido evitado se não precisássemos ter passado por tudo isso.

— O sofrimento é importante, tigre negro. É ele que nos ensina a valorizar os momentos de alegria. A felicidade não é mais do que a dosagem ideal entre alegria e sofrimento. Você precisava do amor de Quel-si. Foi isso que trouxe sua humanidade de volta e te tornou mais paciente. Perder Quel-sí ensinou Dirhen a ser humilde. E ter o amor dos dois homens especiais, fez de Quel-sí uma pessoa mais segura e confiante. Ela precisava do amor de vocês para se tornar a Deusa forte que ela se tornou. Cada um de vocês aprendeu com o outro. E cada um doou o seu melhor para o outro, tornando-se completos.

Pensei sobre isso e percebi que o xamã tinha razão. O amor de Kelsey me moldou e moldou o meu irmão. E Kelsey sem dúvida tornou-se uma mulher forte.

Nós dois voltamos ao acampamento, que estava muito diferente de quando partimos. Havia poucos homens e quase nenhuma barraca ou animal. Phet não parecia surpreso.

— O que aconteceu? Onde estão todos?— Perguntei.

— Eles se foram. Voltaram para casa. Durga não precisa de um exército. Ela enviou os soldados de volta para suas famílias. Os que ficaram foram aqueles devotados à Deusa, que desejam segui-la e servi-la.

— Mas nós saímos há poucas horas e ainda havia muitas pessoas aqui. Toda a comitiva indiana ainda tinha o acampamento montado neste lugar.

— Sim, mas isso foi há três meses.

— Como assim há três meses? Nós saímos daqui há duas, três horas no máximo.

Phet riu.

— O universo não é fácil de se compreender, tigre negro. Você está onde precisa estar.

— E onde está Anamika?

— A deusa está nas montanhas. Vá até ela. Ela vai te ajudar a entender.

— Você não vai me acompanhar?

— Não. Eu preciso ir a outro lugar. Por enquanto, você e a Deusa precisam ficar sozinhos.

Phet me entregou o amuleto e começou a andar na direção da luz. O sol ofuscou a minha visão e então, o xamã tinha desaparecido.

Encontrei Anamika no alto de uma montanha. Ela estava sentada na posição de Lótus e tinha os olhos fechados. Ela sorriu e falou, sem abri-los:

— Olá tigre de ébano. Sente-se melhor agora?

— Acho que sim. O que você está fazendo aqui Anamika?

Ana abriu os olhos e sorriu para mim. Ela não era Durga, mas Anamika. E tinha um sorriso de tirar o fôlego.

— Sabe Kishan, eu nasci predestinada a me tornar uma deusa, assim como Kelsey. Mas eu não tenho nenhum poder. Os deuses me escolheram e me trouxeram as armas e os presentes que me concedem poderes. Mas eu não tenho um poder próprio. Eu ainda não sou a Deusa que preciso ser.

Ela suspirou e continuou:

— Kelsey foi uma deusa poderosa. Ela trilhou um caminho de coragem e de sacrifícios, e ela fez tudo isso por amor. Ela conquistou os prêmios da Deusa e mereceu suas armas. Mas o caminho que ela trilhou lhe concedeu poderes próprios. Kelsey se tornou uma verdadeira Deusa. Então ela abriu mão de ser uma Divindade e me abençoou com as dádivas que ela própria conquistara. Agora eu preciso honrá-la.

Anamika esticou o braço e tocou em minha mão.

— Meu amado Kishan, você é tão intenso em seus sentimentos. Você tem tanta capacidade de amar. você amou Kelsey profundamente. Você amou Yesubai e você poderia me amar também. Nós poderíamos ter filhos e sermos felizes. Nossos filhos seriam seres humanos especiais, assim como seus filhos e netos. — Ela procurou meu rosto e me olhou nos olhos— Você poderia me amar Kishan?

— Claro que sim Anamika. Eu me sinto ligado a você. Eu gosto da sua companhia e te acho uma mulher deslumbrante— Ela corou e deu um breve sorriso — Eu acho que posso te amar um dia.

— Seu destino é amar a Deusa. Por isso você amou Kelsey e Yesubai. Porque você é um Deus. E um Deus precisa de seu Shákti, sua esposa.

— Eu não sou um Deus Anamika.

— Sim você é — Ela soltou a minha mão — Venha meditar comigo. Você precisa se descobrir. Phet me ajudou e eu vou te ajudar.

Eu nunca fora religioso ou místico. Nunca tive paciência para meditações. Mas resolvi acompanhar Anamika. Sentei-me à sua frente, cruzei as pernas e tentei relaxar. Ela tocou meu braço e eu senti um calor fluir de suas mãos através do meu corpo. Então eu me desliguei de repente. Eu comecei a ter visões, como as que Phet tinha me mostrado, usando o amuleto. Comecei a enxergar o universo, como uma pequena luz brilhando longe. Esta luz começou a crescer até me atingir. Mas ao invés de me envolver, a luz penetrou em mim. Então eu senti a força do universo dentro de mim. Eu vi outras luzes menores ao meu redor. E duas luzes tão fortes como a minha ao meu lado. A primeira luz, representava a energia criadora. A segunda, era a energia que mantinha o equilíbrio do mundo. A luz que vinha de mim era quase incontrolável. Era tão forte que poderia destruir tudo ao seu redor. Então, uma outra forma luminosa me tocou e a energia destruidora voltou para dentro de mim.

Eu compreendi finalmente quem eu era. Eu era Damon, o tigre de Durga. Eu era Shiva, o Deus da destruição. E Parvati era minha Devi. Eu precisava dela para controlar meu ímpeto destruidor. Eu entendi tudo. Entendi quem eu era, e quem eram os outros. Kelsey foi minha Devi, porque ela era um avatar de Parvati. Anamika era outro avatar da deusa, portanto era minha Devi. "Mas e Yesubai?". Eu ainda não tinha compreendido quem era ela.


O destino dos Deuses - A história de KishanWhere stories live. Discover now