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 Estava uma tarde radiosa de sol e eu estava na minha cama, a fitar o tecto do meu quarto, chegara aquela altura do ano em que se sente falta dos amigos e colegas de turma. Mas não era nenhum deles em que pensava... A pessoa em que se situava a minha atenção era a rapariga mais doce que alguma vez conheci. A Matilde.

 A Matilde tinha a minha idade, era alta, de olhos azuis e cabelo ruivo ondulado. Éramos bons amigos, a sua presença acamalva-me a mente, no entanto, esta encontrava-se perturbada naquele preciso momento. Tínhamos combinado encontrar-nos na varanda da casa dela mais cedo naquele dia. Esperei uma, duas, três horas... Sentia-me perturbado porque era o último dia em que podíamos estar juntos antes das férias acabarem e eu planeava contar-lhe tudo o que sentia por ela. Nunca tinha tido nenhuma amiga como ela, ela era (e presumo que continue a ser) fantástica e extremamente simpática. Era daquelas amigas em que podíamos confiar sempre que estivesse-mos tristes ou preocupados, daquelas amigas que o simples facto de vê-la numa manhã de nevoeiro, faz com que o dia se pareça com um de verão, com o sol a brilhar alto no céu e os pequenos passarinhos a cantar em uníssono nos ramos das árvores floridas do parque da cidade.

 Ouvi o meu telemóvel vibrar, caí da cama e apanhando o telemóvel enquanto caía virei-me de costas para os mosaicos frescos do chão do meu quarto, estiquei os braços e aproximei o telemóvel da cara de modo a poder ler a mensagem: "Queres dar uma volta pela praia?" acabando a mensagem com um "emoji" a piscar o olho. Sorri, escrevi um sim muito à pressa e saí de casa a correr, peguei na bicicleta e dirigi-me para casa da Matilde. 

 Quando lá cheguei, toquei à campainha e observando o meu reflexo na janela, ajeitei o meu cabelo com as mãos e ouviu-se uma chave a rodar no trinco da porta. Coloquei-me na posição mais natural que consegui e ela sorriu:

 - 'Tão 'bora? - disse ela, enquanto sacudia o cabelo por cima dos ombros.

- 'Bora! - disse eu, esboçando o sorriso mais largo que esbocei desde esse dia. Dirigimo-nos à praia, soltando gargalhadas enquanto conduzíamos as nossas bicicletas rua abaixo. O seu cabelo voava por cima dos ombros e os seus olhos cintilavam, por um breve momento pareceu que tudo tinha ficado mais lento. O sorriso dela... os seus olhos azuis e a sua gargalhada estridente faziam parecer que não existia mal no mundo, que tudo estava bem...

 Quando chegámos à praia, sentámo-nos na areia e tirámos as sapatilhas. A areia estava quente, mas não demasiado, o mar encontrava-se calmo e longe do sítio onde nós estávamos as ondas arrastavam a areia. O sol brilhava à superfície do mar e decidimos dar um mergulho, corremos para o mar saltando alguns metros de água antes de submergirmos completamente, mergulhei e sentei-me no fundo, fechando os olhos e aproveitando todos os segundos que passavam. Emergi, a Matilde estava com o cabelo molhado colado à cara, com os olhos fechados e completamente desorientada, aproximei-me dela e afastei-lhe o cabelo para ela poder ver, visto que grande parte do cabelo estava à frente dos olhos dela. Lentamente, os seus olhos abriram, piscaram duas vezes antes de fixar-se em mim, o azul dos seus olhos aproximava-se à cor do céu naquele dia de verão. Naquele momento, pensei que fosse a altura perfeita para lhe explicar tudo, mas não quis agir por impulso. Flutuámos durante uns longos minutos falando sobre a escola, e o regresso dela a casa, senti-me triste como se toda a minha felicidade tivesse sido sugada e me encontrasse a boiar no espaço sideral, com frio, prestes a congelar.

 Pouco depois, deitámo-nos novamente nas toalhas olhando um para o outro enquanto fazíamos caretas para tentar fazer o outro rir-se. Sentei-me e ela seguiu o meu movimento rapidamente, sentando-se com os joelhos encostados ao corpo. Coloquei o meu braço por cima do ombro dela e disse:

 - Olha, há muito tempo que te queria dizer isto.. mas não sei por onde começar - disse com medo da sua reacção - a verdade é que, eu gost...

 - Eu sei, eu também gosto muito de ti, mas eu vou embora amanhã... - declarou com um ar tristonho.

 - Pois é... - suspirei.

 Avancei. Beijámo-nos demoradamente apesar alguns choques acidentais entre narizes, nunca me tinha sentido assim, a adrenalina corria-me pelo corpo inteiro, sentia-me capaz de dar uma volta ao mundo apenas a correr. Ela levantou-se rapidamente pegando na sua toalha, calçando-se à pressa, pegou na sua bicicleta e rumou a casa. Ao longe ouvia-se um chorar que era apenas interrompido por causa dos soluços que ela tentava disfarçar. Segui-a, sentia-me culpado por ela estar a agir assim e gritei o seu nome, sem resposta. Após chegar a casa dela, toquei à campainha e chamei-a:

 - Matilde, abre a porta por favor.. - supliquei eu - deixa-me explicar, a sério.. 

Não houve resposta, apercebi-me naquele momento que tinha estragado tudo, a minha única companhia durante aquelas férias e a minha melhor amiga não me queria ouvir, muito menos ver. Fiquei sentado à porta de sua casa durante várias horas, apenas voltei para minha casa por causa do escurecer da noite e do frio que se sentia havia algum tempo. Pedi-lhe desculpa novamente por mensagem e, deitado na minha cama, senti-me a ser levado para o vazio, um sítio totalmente escuro, onde o mal reinava, tudo tinha acabado... Por causa de mim.



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⏰ Last updated: Feb 11, 2018 ⏰

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