Capítulo 18 - Não me ASSOMBRE

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Tinha dito que não beberia mais, entretanto, noites sombrias como aquela faziam aquilo ser mais difícil do que parecia e, algumas vezes, ficar bêbado era a única maneira de ficar animado. Odiava a sensação de melancolia que o assolava em momentos semelhantes e ainda não havia aprendido a lidar com a tristeza — nunca foi bom em consolar a si.

A foto velha na estante mostrava uma algo difícil de esquecer e, ao mesmo tempo, difícil de lembrar: o passado.

Três meninos sorriam parados no meio de um fundo qualquer.

Agora, eram apenas dois — o outro havia virado fotografia.

Observou o passado na estante.

Pausou a si, depois, foi até a foto e a abaixou, escondendo-a de sua visão.

Desculpa, mano. É que hoje não dá. Decidiu, um pouco arrependido pela ação.

Esconder não iria adiantar nada, era velho o suficiente para saber, só que não restava muitas escolhas naquela madrugada. Óbvio, tinha a opção de ligar para a mãe, chamar o pai, perguntar como estavam as coisas e se podia passar lá no dia seguinte, mas a hora — duas da matina — e a incapacidade de explicar ao certo o que o trouxe aquele sentimento impediu Lucas de fazer qualquer coisa, além disso, sempre se sentia meio incerto perante ao pai e não estava disposto a fingir um bom humor em relação a qualquer piada.

O preconceito velado permanecia sendo preconceito e machucava da mesma forma que o exposto, principalmente, quando vindo de dentro.

O espaço vazio da moldura em questão fez com a consciência o levasse em direção ao calor do outro estado e das cores vibrantes em conjunto com o frio do corpo de uma mãe ao receber a trágica notícia que seu filho do meio havia morrido. Eram três meninos na saída, eram três beijos depositados na cabeça de três pessoas diferentes e, de repente, três virou dois.

A vida costumava ser engraçada, uma hora tudo estava bem e em outra já não existia.

Não para alguns.

Desligou a televisão, o filme sobre perseguição policial não combinava com o sentimento que crescia dentro dele. Não, não odiava a polícia. Ninguém que conhecia odiava a polícia, no máximo, odiavam o motivo dela precisar existir e, por ignorância, descontavam sua raiva nos membros da corporação. A verdade é que parece fácil odiar qualquer coisa que venha do opressor.

A verdade é que o sistema era sujo e corrompia quem o servia, incluindo, a polícia. A desinformação constante de uma classe que, muitas vezes, não teve educação fazia com que a raiva fosse desviada a inocentes e isso era um ciclo constante.

Quase lançou um sorriso com as ideias que surgiram ao desligar a televisão.

A corrupção constante não se resumia ao dinheiro desviado, ela começava nos centros urbanos, nos morros da cidade, começava dentro de cada um que escolhia pisar no outro para subir um degrau a mais.

O Estado era corrupto e, toda a raiva que a sociedade sentia dele, se tornava corrupção dentro da mesma. Nos quartéis, nas favelas, na alta classe. Lucas entendia aquilo, havia tido o privilégio de debater sobre o assunto com os poucos negros que conheceu quando fez a universidade, com as pessoas que cada vez mais ganhavam voz nos meios virtuais, contudo como fazer que os outros entendessem? Principalmente, em meio a uma sujeira constante que impede os outros de pensarem em qualquer coisa que não seja o almoço do dia seguinte — sabia como era isso, sua família já teve fases assim.

Existiam pessoas ruins no mundo, de fato. Porém, existiam pessoas boas e colocar todas do mesmo lado julgando apenas pela cor da pele ou pelo local em que morava era uma falha cometida tantas vezes que gerava rancor — não era difícil ver um dos seus sendo parado por homens fardados apenas por andar, não era difícil ser o da vez, difícil era ter que explicar que estava apenas tentando voltar para casa e, quando não difícil, cansativo.

Não me TOC [COMPLETO]Where stories live. Discover now