Capítulo 1

5.4K 402 345
                                    

Quando termino de esvaziar a última caixa da mudança, volto animada para a sala, dirigindo-me à saída:

- Eu vou explorar a floresta - aviso, vestindo o cachecol e o casaco.

- Ainda não tirou essa ideia da cabeça? - minha mãe pergunta cansada. - Espere até amanhã e vá com um guia. Vai ter muito tempo para fazer isso agora que moramos aqui.

- Eu odeio guias e você sabe, e quero ir lá, quero ir agora. A história da branca de neve foi escrita baseada nessa floresta. Sabia?

- Sério? A da chapeuzinho vermelho também - ela fala com aquele tom de mãe.

- Volto assim que escurecer - pego minha câmera e saio antes que ela consiga prolongar a discussão.

Encaro a rua deserta e a floresta do outro lado. Berlim não chega nem perto disso aqui.

Atravesso animada, mas, infelizmente, minha mãe conseguiu me assustar, só um pouquinho, então procuro por uma trilha, ao invés de ir direto na vegetação.

E consegue ser ainda mais bonita por dentro do que é por fora. Na verdade, diria que é um dos lugares mais lindos que já visitei. Então claro que não perco tempo antes de pegar a câmera, tirando fotos de tudo dos melhores ângulos que encontro. Até perceber uma ave diferente de tudo que já vi, mas essa entra na floresta e não perco tempo ao segui-la.

Apesar da neve bater na minha panturrilha - provavelmente ninguém perde o tempo tirando-a da floresta, sendo que tem uma trilha -, avanço (com dificuldade) até conseguir a foto da ave que provavelmente está caçando.

Como já estou aqui dentro mesmo, avanço mais, apreciando a paisagem morta sob as camadas de gelo. Porém algo me para. Um lobo, um lobo cinza e branco caçando um coelho.

Escondo-me atrás de uma árvore e tiro várias fotos dos animais em movimento. Até que um barulho de algo quebrando atrás de mim desvia minha atenção. Viro lentamente e vejo outro lobo, esse preto, rosnando. Penso em tirar uma foto mas ele solta outro som assustador quando mexo os braços, e percebo que encara a mim, como o outro encarava o coelho.

Não tem como eu correr, a neve está muito alta. Pelo menos posso tirar uma foto boa antes que ataque. Rapidamente preparo a câmera, tirando a foto segundos antes dele começar a correr em minha direção. Tento me afastar, mas caio para trás, no mesmo momento que um garoto aparece e bate no animal com um pedaço de madeira, de modo que este cai longe, guinchando de dor.

O lobo se recompõe e rosna para o garoto que encara-o como se pudesse competir com ele. Tiro outra foto da cena, primeiro do garoto e depois do animal, o que faz com que este uive e saia.

- Você é estúpida? - ele pergunta apontando o pedaço de madeira para mim.

- O que disse? - empurro o objeto para longe do meu rosto.

- Uma foto vale sua vida?

- Foi uma foto muito boa... - sei que não vale, mas não posso evitar, sou viciada, se vejo uma boa oportunidade de tirar uma foto eu vou tirá-la.

Ele me puxa pelo pulso fazendo com que levante.

- Ele foi embora, não foi? - falo convencida tirando a neve da minha roupa.

- É, ele foi embora - fala com desdém. - Mas vai voltar com mais.

- Como sabe? - ele só quer me assustar, sei que não tem certeza disso.

- Não é da sua conta. O que faz dentro da floresta? - pergunta irritado. - Tem uma trilha.

- Tiro fotos, a trilha não é boa para isso. O que você faz dentro da floresta?

- Também não é da sua conta - reviro os olhos.

- Estupido - cruzo os braços irritada também.

- Só saia logo daqui - diz irritado.

Afasto-me dele pisando forte, ouvindo seu suspiro pesado.

- Não é por aí, idiota.

Ele aperta meu pulso com força e começa a me puxar para o outro lado.

- Está me machucando - tento soltar-me.

- E? - pergunta desinteressado.

- E eu posso sair sozinha - continuo tentando, quase caindo quando ele para de repente. Seu olhar irritado me faz encolher um pouco.

- Não, não pode. Do jeito que é idiota vai se perder e ficar dando voltas na floresta por dias até algum guia te encontrar, ou algum animal. ENTÃO VÊ SE PARA DE SE MEXER PARA EU TE TIRAR DAQUI - ele aperta meu pulso com mais força e volta a me puxar.

Dessa vez, fico quieta, mesmo ele estando andando rápido demais para o meu ritmo, o que resulta em várias quase quedas. Pelo menos, em pouco tempo, estamos fora da floresta. Estranhamente perto da minha casa.

- Vê se não volta, principalmente à noite - ele finalmente solta meu pulso dolorido.

- Para o lobo mau não me pegar? - brinco, mas ele me olha sério e entra novamente na floresta sem dizer mais nada. - Idiota arrogante.

Atravesso a rua e entro em casa irritada.

- O que foi, querida? - minha mãe pergunta ao ver meu humor.

- Um idiota que eu achei por aí - digo tirando os casacos e botas e posso ouvi-la rir.

- O jantar está quase pronto.

- O.K.

Entro no meu quarto e solto o corpo na cama, levando alguns segundos antes de começar a examinar as fotos. Passo por elas rápido, apenas apagando as que estão ruins porque selecionarei as melhores pelo computador depois. Até chegar na foto dele. Seu cabelo comprido, seus olhos penetrantes, seus braços definidos, tudo nele é perfeito, exceto o fato de estar só de camiseta e bermuda quando estamos com quase -20°C.

Como não percebi isso quando estava com ele? Não que ele fosse me explicar caso perguntasse. Suspiro, eu realmente quero voltar lá essa noite só porque ele disse para não fazer. Encaro as árvores altas pela janela como se me chamassem. Então levanto a manga da camisa e vejo a marca roxa de seus dedo, ele realmente colocou força.

- PODE VIR - Minha mãe grita e, depois de tirar uma foto do pulso e cobrir o local novamente, vou para a cozinha. - Não acredito que conseguimos essa casa - ela está muito animada porque sempre quis morar aqui e o valor foi muito em conta.

- Eu gostei - falo sem dar tanta importância e ficamos um tempo em silêncio. - Quero voltar lá - anuncio por fim.

- Na floresta? - ela pergunta e eu assinto. - Agora de noite você não vai. A antiga proprietária avisou, não vá à floresta durante a noite, há muitas criaturas perigosas.

- Não quis dizer animais? - pergunto rindo.

- Ela me disse assim. Não quero você saindo à noite e pronto.

- Okay - reclamo num muxoxo e, depois de terminar e lavar os pratos, saio da sala, voltando para o quarto. 

Olho para a lua no céu, é lua cheia e, em algumas horas, estará no ápice. Eu realmente quero ir. Com certeza terei uma foto perfeita.

Ela nem vai saber mesmo.

Passo pela janela e, depois de espantar o medo, pulo com a câmera na mão, entrando novamente na floresta. Começo a avançar correndo, não estou nem aí para minha mãe, para o garoto ou para o lobo mau, eu vou conseguir essa foto.

Depois de muito tempo correndo, encontro uma clareira, de onde tenho uma visão perfeita da lua.

The Curses of Schwarzwald - Cursed Moon (kth) (CONCLUÍDA)Onde histórias criam vida. Descubra agora