Capítulo IX - Deriva

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Sentando-se na areia, levou sua face aos céus, como um pedido de socorro ao divino. Constou então que a noite estava clara, a lua era refletida no espelho d'água que o mar formava, tudo tão límpido, exceto pela sua mente anuviada. A brisa tocava-lhe, bagunçando seus cabelos e eriçando os pelos do braço, mas sem causar calafrios glaciais. Sozinho naquela imensidão obscura ele se permitiu chorar, pela primeira vez, depois de todos os acontecimentos recentes ele chorou. Um choro sofrido vindo de sua parte mais interna, aos soluços permaneceu irredutível por longos minutos, mostrando aos céus sua indignação.

Gabriel era tão alegre, tão alto-astral, tão...expressivo. Artista inato! Não conseguia compreender, não se esforçava para isso, ele perderia o ano letivo, alguns colegas; Jake, seu fiel amigo, o garoto enclausurado naquela ilha estava sentindo sua falta, ainda que não houvesse tanto tempo de sua apartação. Tinha também Pietro, um velho amigo e ex amante que retornou para ficar. Ele não aguentaria passar um ano cativo naquela ilha. Precisava bolar um jeito de fugir, de ser ouvido, de voltar para casa.

Se bem que ele não seria bem-vindo lá, sua "mãe" o havia magoado visceralmente, eles nunca se deram muito bem, nunca houve harmonia naquela casa; não queria ter que voltar para a mesma. Sendo assim, ele não tinha para onde ir. A não ser que sua tia, Jade, o acolhe-se; ou até mesmo Jake, seu melhor amigo, este último, não perderia, mas teria que passar o ano todo longe dele, e de Pietro, agora que havia voltado. Na verdade ele não sabia o que fazer, não tinha mais um lugar ao qual pertencia. Era prisioneiro de seus próprios atos. Este seria o ano mais longo e instável de sua vida. Não valeria a pena fugir, não havia segurança para isso. Estava a trinta quilômetros do continente e a história clichê e fictícia de se salvar com uma jangada ao mar aberto não passava de um pensamento distante e maluco, apenas coisa de cinema.

Sem perceber o tempo passar, Gabriel chorou, chorou e chorou. A face rubra e os olhos espremidos evidenciavam o lamentar copioso. Depois de desabafar suas mágoas e refletir muito sobre tudo, ele levantou-se batendo na calça para sacudir a areia. Estava decidido! Até poderia derramar outras lágrimas, para ajudá-lo a desabafar, mas não abaixaria mais a cabeça para a situação. Ele nunca foi de se deixar levar e não seria agora que isso aconteceria. Convicto de si, ele voltou ao seu quarto, a expressão firme em seu rosto misturada com o edema e vermelhidão de quem acabara de chorar apenas endureceram ainda mais sua feição.

Tentou remover o máximo de areia de si, remexendo-se de um lado para o outro, mas no fim, não logrou real efetividade. Emporcalhando todo o quarto, pode, por fim, sentar em sua cama. A pessoa que dormia acima de si ressoava uma fraca respiração, indiferente a todo o seu redor. Gabriel estava exausto, não fisicamente, mas de todo um resto. Ele sujaria sua cama de areia, assim como fez com todo o chão do dormitório, mas isso não importava mais. Gabriel precisava dormir o resto de noite que tinha, não saberia como seria seu dia, nem o que iria lhe acontecer. Deveria, ao menos, descansar o máximo que ainda podia.


[Tyler Devon]

Incomodado por não estar em sua casa, muito menos em sua cama, Tyler despertou antes do previsto. Os primeiros raios de sol clareavam no horizonte, indicando que um novo dia estava começando. Desorientado, o garoto desceu cuidadosamente de sua cama, que era a de cima. No sentir o chão áspero ao pisar nele, estranhou, não obstante, notou que havia uma trilha de areia pelo pequeno cômodo, tendo por fim a cama debaixo, onde um garoto loiro descabelado, descansava, com a expressão amena. O encarou brevemente, desviando o olhar em seguida, curioso e revoltado ao mesmo tempo, pela imundice no qual o quarto se encontrava.

Não sabia ao certo que horas eram, nem o que deveria fazer, tampouco para onde ir. Mas ao deparar-se com o relógio na parede, anunciando seis e meia, teve uma de suas indagações respondidas. Por não conhecer a rotina do ambiente não sabia se estava adiantado ou atrasado, mas de qualquer forma resolveu se arriscar. Trocou de roupa e calçou um chinelo, por fim.

Delitos (Romance Gay)Where stories live. Discover now