Capítulo 1

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Revelator Eyes – The Paper Kites

Uma perna quebrada.

Foi o que eu consegui. Apenas uma perna quebrada.

Nem para cometer um suicídio descente eu presto. É engraçado de tão trágico que é.

Isso nem de perto é tão ruim, quanto o olhar que a minha mãe está dirigindo a mim nesse momento.

- Me diga, por quê? - Diz ela, com olhos cheios de lágrimas.

Essa foi a primeira frase que ela me dirigiu, desde que eu abri os olhos, a algumas horas atrás. Estamos só nós duas no leito da emergência em que fui internada. O resto da família foi proibida de entrar pela psiquiatra de plantão, "ela está instável, é melhor ficarem longe por enquanto", foram as palavras dela.

- Fala alguma coisa, Ophelia. – Tentou ela novamente.

Eu simplesmente não consigo falar. Estou frustrada e envergonhada. Isso está me travando. Só consigo olhar para ela, sem fazer expressão alguma.

Ela me mostra a carta que escrevi para ela, que está toda manchada, provavelmente pelas lágrimas dela. Olha para mim e continua a falar:

- Você não tem noção do que eu senti ao encontrar essa carta, Ophelia. Nunca fiquei tão desesperada na minha vida. Por que você não disse que estava com problemas. Eu ira te ajudar, você sabe disso.- Só consigo continuar a encara-la. – Ainda não consigo acreditar que você ia me deixar.- Ela começou a chorar mais ainda.

Como se fosse ela pudesse me ajudar. Eu venho tentando isso a um longo tempo. Quando eu peço para conversar com ela, é sempre a mesma desculpa, " tenho que trabalhar", " estou atrasada" ou a mais usada "depois conversamos". Sei que ela não fez por mal. Mas não tem como negar que fui negligenciada.

E o meu pai? Você deve estar se perguntando. Nem mesmo eu sei onde ele está, ele sumiu depois do nascimento de Francis. Não queria a responsabilidade de criar e sustentar seis filhos. Minha mãe nos criou sozinha. Passamos muito trabalho no início, mas depois, o resto da família começou a nos ajudar. Conforme fomos crescendo, as coisas foram melhorando. Agora vivemos em uma situação confortável.

Talvez essa situação do meu pai tenha contribuído para a minha depressão. A sensação de rejeição começou ali.

Outro fato é a minha autoestima. A falta dela no caso. Não consigo me olhar no espelho por muito tempo. Tenho horror de tirar fotos e nunca me arrumo. Isso foi acontecendo com o ganho de peso conforme os anos foram passando. Eu sou realmente gorda. Para completar tenho cabelos cacheados que tem vida própria e olhos castanhos comuns.

Tenho um sério problema de socialização. Não consigo falar com as pessoas que não sejam da família, não atendo telefones e não tenho redes sociais. Por isso não tenho amigos. Até tentei algumas vezes, mas acabei desistindo. Não sinto que sou suficiente para isso.

É raro eu sair de casa. Só saio para ir à escola, porque eu sou obrigada, se não nem para isso eu sairia. Almoços de família e eventos da cidade são realmente dispensáveis para mim. Não gosto de aparecer em público.

Minha mãe continua com seu monólogo e eu só consigo pensar em sumir. Nesse momento, o médico se aproximou de nós.

- Sra. Robinson, avaliamos o caso dela, fizemos vários exames e constatamos que a sua filha não tem nenhum trauma além da fratura na perna. Ela está liberada, mas com uma condição. Ela terá que fazer acompanhamento com a psicóloga do hospital. Pelo menos uma vez por semana ela deve vir aqui, ok? – Disse ele.

OpheliaOnde as histórias ganham vida. Descobre agora