Capítulo 2

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Desde que descobri que eu tinha câncer, minha vida não era nada emocionante. Eu ia e vinha de hospitais, clínicas, ficava internada, tentava um novo tratamento. Câncer é uma doença bem valentona, então não é nada fácil fazê-la ir embora. Ela não iria. Eu tinha tempo de vida, então decidi usá-lo bem para não ter arrependimentos no meu leito de morte. Decidi morar sozinha, ter um cachorro e um hobbie. Eu não trabalhava, já que ninguém daria um emprego por apenas alguns anos para alguém que poderia passar mal no expediente. Não precisava trabalhar, de qualquer forma. Ao longo desses 5 anos eu fiz viagens para lugares como Holanda, África do Sul, Ilhas Maldivas, e, claro, na Europa. Na maioria das vezes eu fui sozinha. Fora viagens assim, minha vida não tinha muitas emoções. Eu acordava, ia ao parque, voltava, fazia almoço, assistia um filme e ficava andando pela casa fazendo umas coisinhas aqui e ali. E, não foi nada diferente. Acordei, peguei meu cachorro e fui ao parque.
-Ei. – ouvi alguém falar perto de mim.
-Oh. Ei. – respondi.
-Ben. – ele disse sorrindo tímido. – O cara do frisbee...?
-Oh. Sim. – eu fiz uma cara de idiota. Como eu esqueci aquele homem? Não era alguém tão esquecível. Aqueles olhos. Aquele abdômen não era algo fácil de esquecer. – Claro que lembro de você, cara do frisbee. – eu dei um sorrisinho. – O único que vi usar aquilo sem ter um cachorro.
-Meu sobrinho gosta dessas coisas. – ele riu. – Gostos estranhos. Não sei se é por ele ser criança ou por ele ser australiano.
-Oh, é. Fica aí a dúvida. – eu o acompanhei na risada. Risada linda. Dentes lindos. Meu Deus, era uma obra prima. – Mas, então... E seu sobrinho?
-Ah, ele voltou para casa. Ele e minha irmã vieram me visitar por um final de semana.
-Oh...
-Eu vim só para... – ele hesitou. – Sei lá, ar puro, essas coisas.
-Entendo. – eu assenti. Nós ficamos em silêncio. Num silêncio horroroso e super esquisito. Eu troquei o peso dos pés e ele coçou a nuca.
-Vo-você veio trazer seu cachorro, não é?
-Ahn... – eu olhei para Mo que estava sentado aos meus pés. Era uma pergunta óbvia. Eu só sorri. Percebi o que ele queria. – É, eu sempre trago ele aqui.
-Eu sei. – ele soltou me surpreendendo. – Digo... Eu já vi você outras vezes aqui, então eu achei que... Bem, eu só...
-Sabe, Mo vai correr por aí loucamente por uma hora, mais ou menos. Eu vou sentar por ali e comer alguma coisa, você quer me fazer companhia? – eu disse. Eu sabia que ele estava sem jeito.
-Oh, sim, claro. Seria be-bem legal. – Ele sorriu animado. Soltei a coleira de Mo, que saiu correndo, depois de eu falar para não pegar nenhum brinquedo que não fosse dele. Fui em direção ao carrinho de cachorro-quente.
-Eu adoro o cachorro-quente daqui. Principalmente a mostarda. – eu comentei para quebrar o clima estranho.
-Eu não curto muito. A aparência não me agrada.
-Você não gosta porque a aparência não lhe agrada? – eu disse rindo e com minha comida na mão.
-Pois é... – ele pegou o dele e sorriu sem-graça.
-Então você é um cara de aparências? – eu disse sentando em uma sombra, na grama mesmo, sendo acompanhada pelo moço bonito do parque.
-Bom, a primeira vista. – ele sorriu. – Mas, eu não me deixo levar só pelas aparências. Eu gosto de conhecer e...experimentar as coisas. Daí vejo se eu gosto ou não. – ele disse me olhando. Olhei de volta e ele desviou o olhar. Estava vermelho. Ele tinha flertado comigo?
-Entendo. – eu fingi que não percebi a tensão. – Eu acho que sou boa em julgar as pessoas. Beleza interior é praticamente o que eu enxergo. Lógico que tem algumas belezas exteriores que não tem como não apreciar, você concorda, Ben? – eu perguntei segurando uma risada e evitando olhá-lo diretamente, mas consegui ver a reação hilária dele, pelo canto do meu olho.
-É. Eu acho. – ele disse e ficamos em silêncio. – O que você faz da vida, Anne?
-Nada, só vivo. – eu dei de ombros. Ele me olhou confuso. – Eu não estudo, não trabalho. Eu só vivo. – eu sorri. – E você?
-Eu sou professor e modelo, mas isso não é uma grande coisa. – ele disse envergonhado. É, eu não me surpreendi. Se ele não fosse modelo, ele seria um deus ou alguma coisa assim. – Por que você não trabalha? Você é rica ou alguma coisa assim? – ele perguntou e logo arregalou os olhos. – Oh, não precisa responder. Foi uma pergunta totalmente indiscreta.
-De fato foi. – eu ri. – Mas, digamos que eu não estou com disponibilidade para isso, eu estou ocupada vivendo. – eu dei de ombros.
-Entendo. – ele disse, totalmente sem-graça.
-Quem sabe a gente não possa entrar nesse nível de conversa algum dia...? – eu sorri e ele correspondeu. Mo chegou correndo e pulou em mim. Mesmo. Pulou – Au, Mo. Você não é mais um filhote, cachorro, você é pesado igual um cavalo. – eu disse entre lambidas e pelos na minha cara. – Acho que já está na nossa hora.
-Oh, que pena. – Ben disse. Eu levantei com a ajuda da linda, limpa, grande e forte mão dele. – A gente se encontra amanhã?
-Você está dizendo por aqui ou quer me encontrar? – eu disse sorrindo e ele ficou vermelho. Uma gracinha. Na verdade, tudo o que ele fazia parecia uma gracinha. Ele era a definição de gracinha.
-B-bom, e-eu... quero dizer, eu só...
-Ben, eu adoraria te encontrar amanhã no parque. – eu disse e ele sorriu.
-Ótimo. Eu também. Às 8h30. – ele disse bem animado. Quase pulando. Eu o olhei surpresa e ele ficou sem-graça, novamente. – Bom, até amanhã então.
-Até amanhã, Ben. – eu disse e segui para a minha casa. – Que parque maravilhoso. – eu disse para mim mesma.




:) só queria comentar que os capítulos não têm um padrão de duração. Alguns serão bem longos, outros serão ridiculamente pequenos. Kkk mwah!

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