Capítulo 6 - Não me CONTE

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Apesar de tudo, havia sido forte — e não chorou nenhuma vez, não dessa vez, estava se acostumando novamente a rotina. Deitou-se na sua cama com cuidado, deixando o cabelo molhar o travesseiro e esperou a noite chegar. Faltavam duas horas para as sete quando começou a se arrumar, a sua ansiedade estava a mil e ele não sabia qual roupa escolher — precisava ser algo simples e legal, que agradasse a Marina. Decidiu vestir uma gola polo cinza e uma calça jeans de alguma marca famosa, entrou no carro branco e se dirigiu à casa rosa, vestindo um par de luvas cinzas, que combinava com a camisa — havia ganhado de Sofia em seu aniversário no ano anterior.

Ao chegar na casa, não repetiu a cor rosa nenhuma vez, havia tomado um Rivotril e o remédio o deixava meio tonto, mas silenciava sua cabeça. Adams o tinha ganhado de um fotógrafo que o achou meio tenso em um ensaio — sabia que era errado tomar, pois poderia acabar viciado e sem meios de comprar mais, mas aquele era um dia especial. Toda vez que via Marina era especial.

Identificou um carro preto estranho e sabia — de alguma maneira — a quem ele pertencia: Pedro e Isabella, seus antigos colegas de classe, dois dos poucos amigos que nunca tiveram intenção de trabalhar na indústria da moda, pelo contrário, ele virou educador e ela policial. Eram estranhos, mas agradáveis — pelo menos, quando jovens — também haviam noivado há dois anos. Adams ainda nutria um pouco de carinho pelos dois, mas sabia que aquilo não era mútuo. Desde o término com Marina, ambos passaram a detestar o modelo. Gostaria de não entender a razão, de ser a vítima, mas não era. Não se culpava mais por isso — como fez na época que tudo acabou —, havia decidido apenas sobreviver.

Buzinou três vezes seguidas, porque apesar do efeito do remédio, buzina ainda possuía três sílabas. Viu o rosto de Luan demonstrar insatisfação — pensou em buzinar mais três apenas para irritá-lo, porém, aquietou-se. Aquilo não era por ele, era por ela. Também te odeio, pensou antes de descer do carro, colocando uma cara feia como se fosse uma criança, contudo, assim que fechou a porta, deu o maior sorriso que uma câmara poderia fotografar. Aquele era o jantar de Marina, era convidado dela, e Luan teria que o engolir.

— Você pode buzinar só uma vez, Toc Toc.

Toc Toc, odiava aquele apelido, era como os fotógrafos o chamavam às escondidas — mas Luan não precisava temer Adams, afinal, desde que era casado com a menina de pontas rosas, ele sabia que o modelo nada faria contra ele.

— Também estou feliz em lhe ver, Luan.

Era cínico, sabia disso. Em sua cabeça, o apelido rodava, queria esfregar na cara do marido da moça que tudo que ele havia conseguido foi com o apoio da família de Adams, porém, se controlou. Precisava ser forte, Marina não o perdoaria caso ele aprontasse algum escândalo em seu jantar especial.

Toc Toc, lembrou-se das risadas dos fotógrafos ao ouvir aquele apelido em uma roda de conversa pela primeira vez, um ano e meio atrás, ao ter sido internado no hospital por excesso de limpeza e ser obrigado a entrar na terapia. Na época, as revistas de moda lucraram horrores com sua história, porém, tudo que Adams adquiriu foi o maldito apelido.

Odiava vê-lo, não por quem era, mas por quem possuía. Ambos soltaram um falso sorriso por alguns segundos, enquanto Luan bloqueava a entrada de propósito — sabia o quanto Adams odiava ficar ao relento da noite — e, quando finalmente o deixou entrar, o abraçou forte, não por amizade e sim para incomodá-lo. Adams odiava abraços, odiava contato físico no geral — e Luan, como todos na indústria da moda, sabia disso.

— Luan, não faça isso! — Marina reclamou com o esposo, mas, no fundo, estava verdadeiramente feliz por ver os dois se tratando bem, ou, pelo menos, sem trocar olhares de ódio. Também se alegrou ao ver a naturalidade com que Adams havia lidado com o abraço, fazendo sua mente se lembrar de como ele era no passado, quando o toque não era uma ameaça para o jovem.

— Marina, oi! Está bonita, como vai?

E o modelo abraçou a ex-namorada, não por gostar de senti-la ou por conta do remédio, a abraçou com o simples intuito de demonstrar que era superior, mesmo sem ser. Na sua cabeça, o pensamento de que dois poderiam jogar aquele jogo dividia espaço com a cor rosa e os germes, que piscavam em uma sequência constante de quatro. Marina não o respondeu, estava surpresa demais pelo repentino abraço — o rapaz já não a abraçava há anos. Não sabia, é claro, mas na mente do rapaz o caos se instaurava. Odiava toques, mas tudo bem, porque Marina e a cara de Luan fazia valer a pena.

— Adams, você veio?! — Isabella ressoou, um pouco assustada e animada ao mesmo tempo, chegou perto dele e deu um leve beijo em sua bochecha.

Sentiu aquele beijo arder, como se fosse ácido. Sentiu que toda sua sessão de limpeza havia sido jogada fora, sentiu, além de tudo, vontade de queimar sua bochecha esquerda e, antecipadamente, também sentiu a água sanitária corroer sua pele. Quando chegasse em casa, iria passar álcool em sua face, ou enfiaria sua cara em um balde cheio do gel, seu único desejo naquele exato instante era sentir-se limpo.

Marina convidou todos para sentar na mesa, enquanto aproveitava o comportamento estranho do modelo, estavam reunidos em torno da mesa de sete cadeiras, com cinco pessoas. Os dois casais e Adams. Todos se sentaram em seus lugares, na cabeça do modelo, a culpa por conta da roupa que agora estava contaminada e teria que ser jogada no lixo passava — não correria o risco de expor à sujeira as outras blusas para salvar aquela. Era desnecessário.

O jantar ocorreu bem, até certa instância. Adams dava o seu melhor para respirar fundo e contar até 11, sempre se lembrando de manter a calma. Queria mostrar para a moça que poderia ser melhor que Luan, mais estável, que poderia ser mais do que já foi um dia. Ele não era mais Toc Toc, era Adams Sales, um modelo renomado que estava farto daquele jogo de conquista.

— Bem, eu disse que tinha que dar uma notícia muito especial e eu vou dá-la agora.

As pernas de Adams começaram a tremer, junto com as suas mãos que suavam por conta da ansiedade, as solas de seus sapatos começaram a bater no chão desesperadamente, estava assustado. Luan estava sorrindo para ele de forma vitoriosa, da mesma forma que sorriu quando foi anunciar seu noivado — como se aquele fosse seu dia e nada pudesse destruí-lo.

—Eu... estou grávida!

Isabella gritou de felicidade.

Sua mente parou.

Grávida, uma palavra.

Grávida, grávida, grávida. Três silabas, três palavras.

Grávida, grávida, grávida, grávida, grávida, grávida, grávida. Sete letras, sete palavras.

Isabella abraçou a amiga com força, animada pela notícia, e Pedro a parabenizou, colocando a mão em sua barriga, todos riam como se a melhor coisa tivesse acabado de acontecer. O modelo engoliu seco, todos estavam animados, menos ele. Ele estava apavorado.

Não me TOC [COMPLETO]Where stories live. Discover now