Quando deixou o monastério,
o monge não tinha mais a energia
sequer o espírito elevado,
ou meios de exteriorizar a angústia que sentiaEle vivia seus dias como todos os outros monges e freiras e padres que turistavam por ali
Todo dia dedicava seu tempo ao trabalho
escrevendo suave sobre o papel de linho
aperfeiçoando cada letra do salmo como se sua vida dependesse daquele verso
e da perfeição de sua caligrafiaQuando chegava o fim do dia,
sentava-se ao lado da pequena estátua de Maria e perguntava clemente
"você pode me ouvir, senhorinha?"
Seus olhos cor de mármore atingiam o oceano a frente profundamente,
mas não pareciam atentos às suas palavras"se não me ouves, quem ouvirá?"
A resposta nunca chegou aos seus ouvidos
ou aos sonhos
nem nas meditações prolongadas dentro da capela,
"tem alguém aí?"
Ouvia sua própria voz ecoar no vazio de suas ideias, seus problemas
ansiedades
e questionamentos"por onde andam os anjos solenes,
as santas benevolentes,
os padres virtuosos,
o demônio errante
procurando me redimir?"Alguns dias depois,
com sua fé desgastada
e muitas conversas internas,
deixou um bilhete sobre o livro que escrevia há algumas décadas"a solitude é minha única arma contra a solidão"
e
partiu
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As margaridas do parque e outros poemas
PoetryUm livro que demorou quatro anos para ser finalizado. Começou em 2016 com os poemas de uma jovem Letícia e seus questionamentos sobre a essência da vida e lentamente tornou-se no diário de uma adulta transtornada. Tudo aqui é parte de um processo de...