111. À meia-noite

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As velas estão dispostas em um perfeito círculo na terra preta do chão. Tudo é contraste e cor iluminados pela lua. O vento assobia contra as chamas dançantes, dificultando meu trabalho em mantê-las acessas. Lilith também não ajuda, saltitando entre elas, apagando os símbolos feitos com giz no chão. Logo suas orelhas negras ficam em pé e seus olhos vermelhos brilham. Ela para muito quieta e de seu peito largo vem um rosnado que eu conheço bem demais para temer: sua risada.

– Eles sempre vêm, não é mesmo? – comento ajeitando a postura, puxando o colarinho do casaco para cima. Conheço perfeitamente o efeito da lua contra minha pele pálida e o tremeluzir dourado das velas em meus olhos escuros. Tudo para eu parecer perigoso, o que de fato eu sou e a pessoa que se aproxima também sabe. O que ela não imagina, nem em seus piores pesadelos regados à orgias com familiares anões vestidos de palhaço, é o quanto eu sou perigoso.

Ela não sabe é que está aqui para morrer.

O cara é baixo e demora até chegar com suas pernas curtas feito uma péssima mentira. O pouco cabelo que lhe resta está escondido sob o capuz de seu mais velho abrigo, que salta nas extremidades carnudas. Não lembro de seu nome e isso também não importa.

Mas ele lembra o meu. Eles sempre lembram. É para figuras exatamente como a minha que caras exatamente como ele rezam antes de se masturbar e dormir.

– Lúcio Alighieri – ele gagueja em reverência e não sabe muito bem o que fazer, para onde olhar. A cadela cheira sua mão e ele praticamente pula para longe, mas admiro sua tentativa de coragem ao continuar onde está, mesmo que tremendo.

– Está vendo essas velas? – minha voz rouca reverbera pela encruzilhada vazia. Lilith rodeia o referido círculo três vezes e uiva para a lua. Tudo tão bem ensaiado que me pergunto quando ele começará a mijar nas calças. Eles sempre fazem – Entra no círculo.

Ele assente e eu tranco a risada ao ver a patética cena que se desenrola enquanto ele levanta uma das pernas para chegar ao meio do círculo, tentando não encostar nas chamas das velas. Porém, suas pernas curtas quase fazem com que ele caia ao se desequilibrar e trotar até o local indicado.

Se eu ainda soubesse o que sentir é piedade, ele seria um bom exemplo do tipo de gente que mereceria com que eu gastasse um pouco.

Quando o homem finalmente para de tremer no círculo, Lilith cansa de rodeá-lo e até o vento parece interromper seu sopro para aprimorar a cena, eu me coloco a sua frente, inflando o peito de tal maneira que sei que pareço ainda maior que sou.

– O que tua alma deseja, humano? – observo seu pomo-de-adão subir e descer e a veia verde em seu corpulento pescoço pulsar. Estou com sede, temos que andar logo com isso.

O homem murmura alguma coisa que eu me recuso a ouvir. Lilith volta a dar sua risada de cachorro. A garota realmente se diverte com essas coisas.

– Se desejas genuinamente, fale como homem – ordeno e as chamas voltam a tremeluzir, mas, pela primeira vez, o humano parece corajoso ao inflar o peito como eu agora a pouco e praticamente gritar sua resposta.

– Quero beleza.

Lilith chega a rolar no chão pelas risadas e eu nem me abalo. É um dos pedidos mais comuns. Beleza, riqueza, poder e, às vezes, muito de vez em quando, pedem por amor. Talvez acreditem que com beleza, riqueza e poder, fica mais fácil conseguir amor.

Prefiro não pensar nisso agora e me volto ao patético homem a minha frente.

– O que exatamente você quer?

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⏰ Última atualização: May 01, 2017 ⏰

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