Capítulo Um - Owen

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Um

É engraçado e trágico quando paramos para pensar sobre tudo o que conquistamos, tudo o que sonhamos e tudo que nos apegamos, mas sempre vai haver o ponto em que tudo isso se perde. Tudo o que estava em suas mãos vai embora com o vento, desaparecendo em meio à escuridão. Bem, foi quase isso que aconteceu comigo. Lembro-me da queda, lembro-me das risadas de minha família enquanto rodeavam a mesa esperando pelo jantar, lembro-me dos chamados de minha mãe que eram abafados pelo barulho das ondas, lembro-me do cheiro da água salgada que me encobria, e acima de tudo, eu me lembro da voz, do rosto e do toque daquele que me salvou. Tudo estava indo como um pesadelo, deixar minha família para trás nunca foi tão torturante, mas vê-los vivos fez com que uma chama acendesse em mim. Eu viveria por eles, eu precisava viver...

Todos os planos da noite foram mudados. Brincaria com meus irmãos no interior do barco, enquanto meus pais apenas assistiram com largos sorrisos, não esperávamos uma tempestade viria para atrapalhar nossos planos. A decepção em nossos rostos foi curta, logo os meninos arrumaram outra forma de brincar, e meus pais de sorrirem. O jantar estava pronto, e como sempre, minha mãe começa a gritar para que nos fossemos até a mesa, fomos criados com algumas regras, entre elas, jantarmos todos juntos a mesa. Eu estava parado próximo à proa do barco, algo na água havia me chamado atenção, mas não sabia o que era. A noite não poderia ficar mais estranha, pensei naquele momento, mal sabia que aquilo poderia ser confundido com um sonho perfeito, e não um pesadelo. Saio do transe quando Ronald aparece de meu lado com seu sorrisinho com janelinhas, não evito rir também.

– Owen, mamãe está te chamando. Acho melhor ir, sabe como ela fica quando o assunto é jantar, – ele me olha com desafio, dando de ombros e correndo de volta.

Acompanho com os olhos até que esteja dentro. Suspiro encarando o mar mais uma, não conseguia explicar, mas naquele momento soube que a noite seria mais agitada que o normal. Abaixo a cabeça e me dirijo lentamente até o salão de jantar do barco. Recebo um olhar de desaprovação por estar encharcado, mas com um aceno minha mão indica um lugar para mim na mesa. Vou até ele e me sento em silencio. As regras na família são rígidas, e parte dessa pressão cai sobre mim, por ser o mais velho carrego a responsabilidade de servir como espelho aos meus irmãos, como ela costuma dizer. É bom ver os olhos admirados de seus irmãos as ações que faço, mas muitas das vezes torna sufocante, não posso ser quem sou, tenho que ser a sobra da perfeição ou bem, apanharia como da ultima vez. Sou grande para servir de exemplo, mas pequeno diante os julgamentos diários de meus pais.

Eu era o mais velho de três irmãos. Ronald, com seis anos, é o mais novo. Hian, com oito anos, é o do meio e por ultimo eu, com dezesseis anos. Nunca cogitei a ideia que por fim, eu estacionaria para sempre nesta idade. O filho mais velho que posteriormente ficaria para trás. Olho em volta, todos na mesa, com exceção de minha mãe que tinha longos cabelos ruivos e olhos verdes, possuíam cabelos pretos e olhos azuis, traços fortes da família de meu pai.

– Owen, poderia iniciar a oração hoje? – Pergunta minha mãe virando-se para mim. Com "poderia", ela queria dizer que eu era obrigado a isso.

Aceno com a cabeça sem manter contato visual, não queria assistir a seus olhos me estudando e encontrando todas as falhas possíveis em mim. Coloco meus cotovelos sobre a mesa enquanto cruzava meus dedos e fechava os olhos. Recito as mesmas palavras no mesmo ritmo que sempre fiz. Quando termino, um trovão explode no céu fazendo-me encolher na cadeira.

– Essa tempestade veio apenas para atrapalhar... Se pegarmos pelo menos algumas dezenas de sardinhas ainda estaremos no lucro, – esbraveja meu pai enquanto se servia.

EDIUM - As Ondas do Oceano (PAUSA/NÃO REVISADO)Onde as histórias ganham vida. Descobre agora