Prólogo I

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— Praga! Essa demora irá enfadar os soldados - comentou o conjurador para o rei, preocupado. - Eles não estão acostumados ao clima da Carélia.

O Rei Cinza, como era conhecido Nostriano, examinou seu exército preparado e perfeitamente enfileirado na fronteira demarcada e dividida entre as cavalarias de cada província. Sob o sol a pino do território da Carélia, as tropas invernianas esperavam impacientes a ordem de atacar.

O povo inverniano era conhecido nas terras septentrionais por ser um povo bravo e destemido, que não tinha medo de lutar. Por baixo da armadura existia um povo indômito e sedento pelo caos e pelo mundo. Suas estratégias no exército em geral eram boas e eles venciam seus conflitos com frequência. Mas os ares daquele território eram diferentes e do monte estratégico onde o rei, seu capitão e o conjurador estavam era possível perceber como havia alguns homens já cansados com o tempo estio e parado.

O Rei Cinza enrolou o mapa de volta no rolo e guardou no alforje.

— Logo a Carélia será nossa e isso não vai importar.

A Carélia era conhecida como o território final do ouro puro e o Rei Cinza definitivamente estava interessado em suas riquezas.

— Devíamos invadir a Casa do Margrave?

— Não é necessário. O plano é suficientemente bom e podemos contornar os campos fechados.

Uma trombeta soou ao longe em meio a balbúrdia. O barulho da guerra se aproximava com estrépito. Os soldados adiante já pareciam agitados com a movimentação das tropas da Carélia.

— Vai começar.

— Vamos acabar logo com isso - disse o rei. - Preciso voltar a tempo de ver o nascimento do meu segundo filho.

O conjurador lançou um olhar surpreso para o rei. Ele sabia que em algum momento a rainha daria luz ao segundo filho, mas não havia ideia de que poderia ser tão perto. O galeno havia dado o prazo de mais uma semana.

— Recebi uma mensagem antes de deixarmos o assentamento - explicou.

— Poderia ter retornado a casa. Podemos dar conta disso.

— Um guerreiro não foge da batalha - retumbou, resoluto. - Quando eu retornar à casa, será com a glória em meu encalço.

Às ordens do capitão, parte das tropas marcharam na direção das muralhas e outra parte cruzou um riacho, que cortava a terra viçosa em uma campina formosa, até chegar à planície verde. Quando houve a colisão violenta de corpos e espadas, cotas de malha e armadura foram testadas e perfuradas; elmos polidos foram arremessados; sandálias foram pisoteadas e deixadas para trás na lama.

Montado em seu cavalo preto, ele inspecionou o conflito com altivez e determinação. O Rei Cinza bradou do alto: Avancem! Avancem!

Os soldados invernianos obedeceram. Eles avançaram e avançaram, correram pelo campo, prontos para reivindicar a terra, prontos para a vitória. O chão tremeu, os rugidos ecoaram ensurdecedores, o ar convulsionou.

Homens caíram, derrubados por flechas e lanças. Cheios de furor, os soldados feriram, cortaram com espadas e machados. Corpos jaziam nos campos e o odor metálico de sangue preencheu o ar como o intenso perfume das flores nos dias de primavera.

O rei e o capitão abriram caminho pela densa massa de corpos, velozes e impetuosos, mortais e insidiosos. O conjurador ficou para trás, como sempre acontecia em conflitos com essas proporções, ele sempre estava mais atrás com seus planos, mapas e planos. Carne e metal se encontravam e os gritos ecoavam pelos campos. O exército do Rei Cinza era treinado, brutal e veloz, e em guerra eles sempre seguiam uma linha objetiva do plano principal e jamais se desviavam dele. Havia consequências para erros em combate que poderiam ser evitados.

A terceira tropa inverniana marchou em direção à muralha e o governador daquela província. O objetivo do Rei Cinza era sempre o mesmo: acabar com a guerra o quanto antes a fim de perder o menor número de guerreiros possível. E para isso ele precisava manter cativo o líder, a cabeça e peça principal do jogo, ele deveria desestabilizar seu oponente o derrubando pelas pernas, aa vigas da casa que sustentavam tudo.

Os invernianos rugiram em uníssono conforme avançavam. E eles avançaram por todo o campo de batalha.

O Rei Cinza, acompanhado do seu cortejo, perscrutou a multidão pelo governador. Para dar fim à guerra e angariar sua glória.

Horas violentas e excruciantes depois a guerra encontrou o seu fim. O Rei Cinza capturou o governador da Carélia e conseguiu a rendição de todo o povo naquela região. O fogo queimava pelo campo, o odor de morte preenchendo o ar. Naquela tarde crepuscular, ele assistiu os corpos amontoados queimarem, serem consumidos pelas chamas até virarem cinza.

Era uma vez um reino de frio e neve, situado entre as ermas planícies e terras escarpadas do norte e banhado pelo além-mar, que desejava se tornar um império. Nova Rakvere era governado por Nostriano Lefvbre, o destemido soberano daquelas terras. Nostriano Lefvbre era precedido e conhecido pela alcunha de Rei Cinza... porque ele assistia seus inimigos queimarem até serem transformados em cinzas.

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