Convidado de Aluguel

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Surpresa muito maior, porém, ele teve quando Branca lhe ofereceu dinheiro em troca de visitas íntimas. Branca era bonita e sofisticada, e ensinara-o a se divertir. Gostava da companhia dela, do ensolarado flat de Boa Viagem onde costumavam se encontrar, e a palavra prostituição não lhe passou pela cabeça. Pelo contrário, sentia-se orgulhoso por ela o haver escolhido.

Após alguns meses, ele financiou seu primeiro carro. Percorrendo a Av. Conselheiro Aguiar protegido do calor pelo potente ar-condicionado, erguia a vista para as janelas dos ônibus e lembrava-se, com um sorriso galhofeiro, do quanto se esfalfava antes para juntar ninharias.

Estava indo do flat para o lançamento do livro de um político metido a escritor que sem dúvida já comprara uma matéria em todos os principais jornais e queria que a sessão de autógrafos lotasse ao ponto da claustrofobia. Ao se aproximar do Paço Alfândega, já de longe Delano enxergou o movimento intenso. Filmagem, carro de um jornal local. Claro. Decerto o evento lotaria de qualquer forma, com os babões e puxa-sacos de sempre. Mas o autor preferiu garantir. Melhor para Delano. Pagava bem e era fácil. Ele só tinha mesmo que entrar na fila de autógrafos para fazer volume. Nem precisaria ficar de conversa fiada com ninguém. Daria até para chegar cedo em casa.

No entanto, em geral sua rotina era outra. As noitadas prejudicavam os estudos. As madrugadas acordado e as bebedeiras atrapalhavam seu desempenho acadêmico e comprometiam seu rendimento no estágio, que já estava por um fio. Tinha que admitir que sequer a faculdade estava levando a sério. Estudar, formar-se, nada disso tinha o poder de ter as costas quentes. Perdera o interesse e mesmo o respeito pelo tal "trabalho duro". De rapazinho estudioso e dedicado, virou uma figura cínica.

Dona Verônica não estava preocupada. Nutria absoluta confiança no filho, achava-o um menino de ouro — o que ele de fato tinha sido até há pouco tempo. Ao ver seu "menino", antes tão quieto, agora envolvido em festas e noitadas, ela concluía, satisfeita, que na faculdade ele enfim encontrara sua turma.

De fato, ele acabou tomando gosto por festas e não se furtava às comemorações da universidade. Foi assim que conheceu Marta, numa calourada em frente ao Centro de Convenções. Arrumar assunto foi fácil: ser convidado de aluguel lhe conferira muita prática em puxar conversa mole. E ela estava acompanhada apenas por uma amiga, o que tornava a abordagem mais fácil que se tivesse que imiscuir-se num grupo. Após o mote inicial, algo sobre a banda que tocava, apresentou-se:

"Muito prazer, Delano."

"Um nome incomum," ela observou.

"Minha mãe era admiradora de Franklin Delano Roosevelt."

"Isso é verdade?"

"Não sei. Mas pode muito bem ser, não pode?"

Ela riu mais do que ele previra, bom sinal. Mas não se apresentou.

"E o seu?"

"Meu o quê?"

"Nome."

"Ah, sim. Bom, minha mãe era devota de Santa Marta... segundo sua lógica!"

Já eram um casal quando se despediram naquela madrugada. Em plena paixonite dos começos de namoro, Delano começou a evitar Branca. Nem sempre atendia aos telefonemas, deixava mensagens sem resposta, se esquivava, pois cada minuto que passava com a antiga amante era subtraído dos momentos que poderia aproveitar com Marta. Se antes sentia-se lisonjeado por Branca o haver escolhido, agora era com desgosto que beijava aqueles lábios tão murchos em comparação aos de Marta, que apertava aquelas carnes flácidas que faziam tão triste figura frente ao corpo jovem e rijo da namorada. Não obstante, precisava continuar a encontrar-se com uma se quisesse dinheiro para usufruir com a outra; a palavra prostituição afinal lhe ocorreu.

A vendedora de calcinhas usadas e outros profissionaisWhere stories live. Discover now