O outono que cobre meus sonhos

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Andar em um típico dia frio de outono enquanto me prendo em meus devaneios que me desprendem da realidade onde meu corpo pisa é, talvez, uma das atividades que eu mais faça. Eu poderia até chamar de um simples hobby se, claro, eu não o praticasse com tanta frequência. A questão é o que chamar de hábito e o que chamar de vício. O que chamar de perseverança em continuar caminhando vagamente em caminhos tão simplórios e decorados enquanto a mente, ao longe, desenha tantos outros traços em meio à esta vastidão cinza e tangível. E o que chamar, então, de teimosia em continuar, ainda assim, caminhando por estas trilhas tão longínquas e nada equidistantes das viagens e deturpações desta minha mente pródiga e, talvez, criativa até demais resistindo ao máximo para não sucumbir ao estado vegetativo de não querer mais simplesmente se prestar ao mundo como um simples objeto andando de um ponto a outro e conferindo faturas e cheques durante tantas horas. À medida que penso e tento criar definições para essa tão alternativa realidade que crio, vou ficando, a cada nova ideia, mais indiferente e sem poder mesmo diferenciar tantos planos em que vivo. Pensamentos estes, que se intensificam na calada da noite onde o ruído de tantas pessoas vazias cessa e o único sussurro presente é o do vento gélido passando por entre as frestas de minha janela já não muito conservada, enquanto olho para o teto, pensando em tudo isso e ao mesmo tempo em nada, iluminado apenas por finos raios lunares provenientes desta mesma janela e pela luz de um abajur antigo vindo de família, já velho e apagado, bem como meu ser interior se sente. Um conflito tão grande de ideias por algo que parece tão óbvio. Completamente acordado nessa cama, mesmo querendo me encaminhar aos braços calorosos de Morfeu, as palavras e vozes ecoam em minha cabeça. Ambas dizendo que, de certa forma, eu secretamente amo passar por tudo isso e me questionam se eu realmente almejo ser livre, e ainda se teria algum propósito melhor se assim o fosse. As horas da noite aceleram e passam como segundos por entre esses dilemas mentais que se dispersam brevemente ao tropeçar no barulho incômodo do despertador. E assim, ao colocar meus óculos e vestir meu velho sobretudo com um bom par de jeans e sapatos escuros, viajo novamente em mais um dia do que eu ainda duvido que seja uma existência ao fechar a porta rangente que já sequer tranco mais por pura fadiga mental. Encontro-me novamente naquele mesmo ponto de constatação, envolto em folhas secas e amareladas de mais uma manhã acinzentada, com passos curtos por entre mais folhagem já caída, levada e esquecida ao ser abraçada pelo vento suave. O corpo segue pela trilha amarelada das folhas sobre o concreto que ecoa o som de meus passos por toda a praça vazia como meu olhar, que já não enxerga através das lentes propositalmente sujas e embaçadas para não notar os inúmeros defeitos dos asfaltos e prédios que me cercam. Enquanto, é claro, minha mente retorna ao seu estado normal e segue livre pelos infinitos mundos e sonhos que já arquitetei e nunca viverei de forma física e sucinta. E, dessa forma melancólica, sigo o resto dos meus dias de vida, ou, ao menos, os que eu aguento viver. Sigo apenas... Divagando e andando...

Meia Dúzia de Pensamentos InertesWhere stories live. Discover now