Capítulo X

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Melinda

Will depositou um novo beijo em meu pescoço, e apesar de o contato ser bom — bem mais que bom, na verdade — não despertou em mim a mesma urgência que ele demonstrava sentir enquanto tocava minha pele com seus lábios e deixava o local avermelhado com pequenas mordidas.
As emoções eram conflituosas, contudo, eu discernia o bastante para saber que não queria que ele parasse. Uma das mãos macias me acariciava, ao passo que a outra segurava os cabelos da minha nuca, posicionando meu pescoço num ângulo que lhe fosse de fácil acesso. A sensação que o gesto me causou foi prazerosa, até Will deslizar uma das mãos por toda a extensão de minha coxa. O toque, antes delicado, tornou-se brusco, os dedos afundando em minha carne, tateando, descobrindo.
Foi impossível deter o retesamento que me acometeu, mas se Will notou, fingiu que não, porque seus movimentos continuaram. A língua deslizou desde meu pescoço, passando pela mandíbula até explorar o interior da minha boca. Definitivamente, não era àquele tipo de beijo que eu estava acostumada, ao menos não com Will, deitada no sofá de seu apartamento, com ele acomodado entre minhas coxas e subindo a barra de meu vestido.
Os dedos alcançaram o elástico da minha calcinha e, no ímpeto, agarrei sua mão, colocando-a de volta em minha coxa. Não estava cem por cento confortável com aquele contato, mas ele era mais fácil de administrar que o anterior. Aparentemente, entretanto, Will discordava, já que seus dedos refizeram o trajeto.
— Will, não, espera... — consegui murmurar quando os lábios dele se afastaram dos meus e se ocuparam com a pele do meu colo. — Will... — voltei a chamar, quando ele não se deteve. — Por favor.
Sua atenção era minha, por fim. Os olhos azuis me encararam, desejosos, e eu quase me senti culpada por não corresponder à altura, de tal modo, desviei o olhar.
— O que foi? — perguntou, a boca pouco disposta a se afastar da minha pele, fazendo-me sentir o hálito quente bater contra ela. — Machuquei você? Desculpe, meio que perco o controle, tendo você assim...
Engoli em seco.
— Não é isso, é que... não acha que estamos indo rápido demais?
Os olhos dele se estreitaram em minha direção, como se demonstrasse que ele e eu não estávamos exatamente na mesma página ou algo assim.
— Rápido? Mel, estamos saindo há semanas, e você sequer conhece o meu quarto.

Foi impossível não engolir em seco. Eu não era ingênua ao ponto de achar que Will estava disposto a manter um relacionamento casto eternamente, no entanto, me parecia um tanto quanto prematura toda aquela urgência. Era um passo bem longo, verdade fosse dita, e por mais que eu achasse que o momento estava se aproximando, tê-lo batendo à porta me sobressaltou.
— Will — chamei, afastando-o gentilmente, porque não me sentir pronta naquele instante, não queria dizer que pretendia erradicar toda e qualquer possibilidade. —  Eu não tenho certeza se esse é o melhor momento.
— Me parece um momento excelente, porque não consigo tirar as mãos de você — murmurou, a boca buscando a minha e encontrando a base do meu pescoço, quando desviei do contato.
— Eu realmente acho que estamos indo rápido demais — insisti.
— Entendo que primeiras vezes são sempre difíceis, Mel, mas sou eu, não precisa se preocupar.
— Não é minha primeira vez — retorqui, incomodada mesmo sem saber por quê.
— Comigo, sim — devolveu, sorrindo de lado, levando uma das mãos para tocar minha bochecha, num gesto que já havia se tornado costumeiro. — Olha, sei que saiu de um relacionamento há não muito tempo e que, talvez, comparações sejam inevitáveis, mas não é porque seu ex-marido era horrível na cama, que nós não vamos ser bons juntos.
— Ele não era horrível na cama! — refutei, ultrajada. Não sabia de onde o sentimento surgira, mas a expressão pouco confortável de Will e o modo como ele desviou o olhar do meu me fizeram pigarrear e tentar engolir as palavras de volta. Quer dizer... não é sobre isso, é só que... é algo tão íntimo, Will, e nós ainda estamos nos conhecendo.
Fitando-me como se eu fosse o ser mais absurdo de todo o mundo, Will se pôs de pé, estendendo-me a mão esquerda, a qual segurei, e me puxou para longe do sofá.
— Vem cá — convidou, driblando o sofá de dois lugares e me levando para junto do espelho enorme que fazia parte do adorno da sala de estar bem-decorada de seu apartamento. — Me diz o que você vê.
Analisei o reflexo por um breve segundo, ciente de que não precisaria me demorar muito.
— Eu vejo a mim.
— E o que você é?
A pergunta era meio estranha e me fez franzir as sobrancelhas. Ainda assim, a pausa de Will me disse que não era uma retórica, então decidi me pronunciar, por mais que não fizesse muito sentido.
— Uma mulher comum, como qualquer outra.
Vi seu sorriso se formar pelo reflexo no espelho. Uma das mãos arrastou meus cabelos para o lado, de modo a deixar meu pescoço e um dos ombros à mostra, onde Will depositou uma porção de beijos, mas que não me aqueceram o coração, do modo que deveriam.
— Sabe o que eu vejo? — instigou, no entanto, o olhar que me lançou através do espelho, me disse que desta vez, sim, se tratava de uma retórica. — Uma mulher espetacular, deslumbrante. Desde a primeira vez em que pus meus olhos em você, Mel, naquela boate, eu não consegui pensar em mais nada que não fosse te beijar. — Sorriu, apertando-me num abraço e depositando um novo beijo sobre meu ombro. — E é bem verdade que você não achou estar pronta para se envolver com alguém, mas aqui estamos nós. Eu estou muito feliz por não ter desistido de você, mas desde que senti o gosto do seu beijo, Mel, não consigo parar de pensar em ter você pra mim, inteiramente.
Antes que pudesse esboçar qualquer reação, Will e eu já estávamos de frente para o outro, sua boca na minha e suas mãos me puxando mais para si. Com o corpo enrijecido, não fiz muito mais além de me deixar beijar, contudo, a insinuação de um toque mais ousado, vindo de Will, me sobressaltou e eu o afastei.
— Eu não estou pronta para esse passo, Will, sinto muito — murmurei, envergonhada, recebendo seu olhar de decepção logo em seguida.
— É por causa dele, não é? — O olhar magoado fugiu do meu por um instante, mas logo retornou, os olhos azuis não conseguiam esconder o desapontamento. — Seu ex-marido — elucidou. — Ele reapareceu e agora você é outra pessoa. Me beija quando te beijo, me toca quando te toco... seus gestos são sempre espelho dos meus, nunca espontâneos, não como antes.
— Não tem nada a ver com ele — menti. Bem, era uma meia verdade, ao menos. Robert reaparecer me desestabilizou, mas ainda que ele não tivesse ressurgido, eu estava certa de que não seria capaz de dar um passo tão largo com Will naquele momento.
— Então me olha nos olhos e diz que já não o ama.
— O quê? — indaguei num fio de voz, totalmente pega de surpresa. Era difícil de acreditar que meus sentimentos estavam sendo postos à prova. Eu entendia o porquê da pergunta, o que não me deixava menos ultrajada por precisar ouvi-la. — Não pode estar falando sério.
— Não consegue dizer? — provocou, a mandíbula trincada, os olhos parecendo faiscar.
Abri e fechei a boca repetidas vezes, incerta sobre o que dizer. Não gostava do modo como Will me fitava, do escárnio pingando de cada palavra e da postura banhada de ameaças veladas.
— Ele me quer de volta! — cuspi, cravando as unhas nas palmas das mãos, tamanha a força com que cerrava os punhos. Não era justo que ele me lançasse aquele olhar recriminador sem que eu tivesse feito nada de errado. — Foi sobre isso que nós falamos, quando ele foi me procurar. Robert me quer de volta, mas eu lhe disse não. Se o amasse, por que estaria aqui com você?
A expressão de Will alternou-se diversas vezes em poucos segundos e pude assistir a surpresa e revolta serem substituídas por uma tranquilidade fingida.
— E você está?
— Estou o quê? — Uni as sobrancelhas.
— Aqui comigo.
Minha boca se abriu e, novamente, não emiti muito mais que um bufar incrédulo e exausto. A situação inteira era inacreditável. Caminhei para longe de Will, porque não queria estar perto dele naquele momento, como também não queria ser rude. Só precisava de espaço e esperava que ele pudesse entender.
— Will, amanhã é um outro dia. Você se provou paciente antes e olhe só pra nós. Me dê apenas um tempo, está bem? Pode ser bem menos do que você imagina. — Assim como pode ser bem mais do que eu imagino, completei para mim mesma em pensamento.
— E o tal Blackwell ter voltado, o fato de querer você de volta, não muda nada? — testou incerto.
— Não, não muda nada.
— Então prove.
— Will — murmurei, desejando mais que tudo fazê-lo desistir de tantos questionamentos, porque já estava exausta de ter que me defender.
— Seu dedo anelar ainda tem a marca da sua aliança — interrompeu-me, rompendo a pouca distância entre nós com apenas duas passadas e tomando minha mão esquerda entre as suas. — Tire esse anel e deixe esse último sinal desaparecer. De tal modo, quando eu for pedi-la em casamento, seu dedo estará livre para receber o anel de compromisso que vou dar a você. E antes que me diga para ir com calma, porque tudo está acontecendo rápido demais... — continuou, fazendo-me engolir meu protesto incerto. — ... quero deixar claro que não estou dizendo que isso vá acontecer amanhã ou depois. Eu sei esperar, Mel, me dê algum crédito — disse numa piscadela.
Ele parecia o mesmo Will leve e descontraído que me conquistou e a quem decidi dar uma chance, por isso não pude fazer muito mais além de concordar com um aceno de cabeça e assistir, impassível, enquanto ele retirava meu anel e o guardava no bolso. Entendi, então, a analogia de Robert, quando ele me disse que ficar sem a aliança era como estar nu em público. Era exatamente assim que me sentia.
***
— O que faz aqui a essa hora? — Christine me questionou com os olhos tão arregalados que mais pareciam prestes a saltar das órbitas, apertando com força o copo com água que trazia em uma das mãos.
— Eu moro aqui, esqueceu? Além do mais, nem é assim tão tarde.
— Eu sei! — esganiçou, limpando a garganta em seguida para continuar: — Eu sei. É disso que estou falando! Você não ia passar a noite com Will?
Foi minha vez de arregalar os olhos, engolindo em seco e sentindo meu rosto esquentar como se eu tivesse quarenta graus de febre.
— Bem, eu... não disse que iria dormir com ele. — Dei de ombros.
— Como não? Você disse, citando: "Estava pensando se não é o momento de dar o próximo passo..."
— Mas eu não me decidi!
Christine ergueu uma sobrancelha ruiva de modo pirrônico em minha direção, me deixando desconcertada enquanto cruzava os braços em frente ao corpo.
— Oh, mesmo, Mel? — provocou, utilizando o apelido que era exclusivo a Will. — Na verdade, você decidiu, sim, só não optou pela opção que deixaria Will feliz, se é que me entende...
— Nós estamos saindo há pouco tempo, Chris, você sabe que as coisas evoluem devagar comigo.
Ela me fitou como se seus ouvidos fossem traiçoeiros e a estivessem enganando. Um segundo depois, uma das mãos estava tampando-lhe a boca enquanto ela soltava uma risada tão verdadeira que me contagiou.
— Exceto quando se trata de Robert Blackwell, é claro! — ela deixou escapar entre uma gargalhada e outra, fazendo meu sorriso morrer de imediato. Minha expressão se tornou sisuda e ela forjou uma tosse, para disfarçar, sorvendo de um gole d'água generoso. — E então, o que houve? — perguntou, mudando de assunto no mesmo instante.
Dei de ombros em resposta, porque não queria colocar em palavras todos os motivos que fizeram com que eu rechaçasse os toques mais ousados de Will.
— Só não me sinto confortável ainda — soltei, esperando que aquilo fosse o bastante para deixá-la satisfeita.
— E isso não tem nada a ver com a pessoa que você não gosta de citar? — instigou, e eu revirei os olhos, impaciente, como se dissesse que aquilo era um completo absurdo. — Okay, então.
A conversa estava encerrada para mim, e mesmo parecendo a fim de despejar centenas de perguntas sobre mim, Christine apenas acenou levemente, lançando um olhar disfarçado em direção ao quarto. De repente, o ar surpreso e incrédulo que ela exalou quando cheguei ao apartamento fez sentido, e minha se abriu em choque e compreensão.
— Meu Deus, Trevor está aqui com você? Estou atrapalhando alguma coisa?
— Shhhhhh... — ela chiou para mim, em resposta, com o dedo indicador sobre os lábios, pedindo para que eu me calasse. — Trevor e eu terminamos, você não lembra? — perguntou quase inaudivelmente.
— Não, desculpe — murmurei de volta, espelhando seu tom.
— Que grande novidade, você nunca escuta o que eu digo, e desde que Robert deu as caras por aqui está pior do que nunca.
— Isso é uma bela mentira! — defendi-me, por mais que não houvesse muito com o que refutar, quando Chris estava coberta de razão e meus protestos não convenciam nem a mim mesma. — Não é minha culpa não conseguir acompanhar seus relacionamentos...
— Shhhhhhhh! — ela voltou a me repreender, quase horrorizada, olhando freneticamente para a porta de seu próprio quarto, ao final do pequeno corredor.
— Desculpe — sussurrei sem jeito. — Mas se não é Trevor, então quem é? Eu conheço?
— O quê? Não! Claro que não. Que pergunta é essa? Por que você conheceria? Não temos amigos em comum nem nada.
— Temos, sim, Javi — eu a lembrei ao mesmo tempo em que Chris sorvia de um gole de água, e o efeito foi desastroso. Ela tossiu ao engasgar, cuspindo água por todos os cantos, inclusive em mim. — Chris? — chamei, dando tapinhas em suas costas, sem saber o que mais poderia fazer para ajudar. Eu realmente acreditei que as diferenças entre Christine e Javier tivessem sido acertadas e não pensei que uma simples brincadeira pudesse ter um efeito tão desastroso. — Chris! — tornei a chamar, com um pouco mais de urgência, e ela acenou com a mão livre para me acalmar.
— Está tudo bem — murmurou, a voz ainda meio estrangulada. — Não foi nada, passou.
— Tem certeza? — Ela apenas concordou com um aceno enquanto tentava recuperar o fôlego. — Desculpe, foi uma brincadeira horrível, eu sei que você e Javi nunca...
— Tudo bem — cortou-me mais que depressa, e não era como se eu estivesse esperando um pedido de desculpas por ela ter cuspido em mim, mesmo que sem querer, contudo, foi estranho o fato de Chris ter me deixado ali, plantada, e ter saído correndo para o quarto, batendo a porta e trancando-a logo em seguida.
Um sorriso nasceu no canto dos meus lábios, ganhando espaço enquanto eu pensava no quanto era sortuda por ter Chris por perto. Não nos tornamos amigas de imediato, mas ela esteve ao meu lado quando mais precisei, junto com Javi e Eva, e eu me sentia muito abençoada por tê-los na minha vida.

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Oi, gente. Vim desejar a vocês um Feliz Ano Novo. Que em 2017 possamos estar juntos novamente, com DA e meus próximos projetos.
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Obrigada, gente. Beijinhos. :*

Doce Amargo - Livro IIOnde as histórias ganham vida. Descobre agora