Quando os que continuaram vivos perceberam que não tinham chance e se renderam, deixamos que fossem embora porque eles nos convenceram de que estavam cumprindo ordens e não sabiam o motivo do ataque. Quando questionados, os aligortes disseram também não saber por que foram atacados.

Isso está zunindo na minha cabeça. É tudo muito estranho. O que fez o povo da areia viajar por tanto tempo para atacar os aligortes?

Eu não gosto dos aligortes. Povo falso. O líder me dá nojo e seu filho quase me faz vomitar. Povo escroto! Fingem querer a paz, mas no fundo são gananciosos por poder.

Na verdade, tenho pena do povo aligorte. Os líderes é que são uns filhos da puta. Com certeza fizeram algo para incitar a ira do povo da areia.

Outra coisa esquisita: o povo da areia mandou apenas alguns guerreiros para o ataque e eles pareciam não serem dos mais fortes, em comparação aos lutadores crueis que já enfrentamos. Sei que eles poderiam ser melhores, já presenciei isso.

Pensando bem, acho que gosto menos ainda do povo da areia que dos aligortes. Eles matam sem dó, são o maior risco para nossa paz. Qualquer conflito e eles usam a violência.

Ok, estou sendo um pouco hipócrita. Eu sou a primeira a recorrer à violência quando algo me tira do sério. Mas não saio matando por aí. Que comparação esdrúxula, eu e os guerreiros do povo da areia!

Sim, já matei alguns. Mas somente quando muito necessário. Eu acho.

Onde será que está meu irmão agora? Por que ainda não voltou? A fortaleza o manteve preso? Será que nos culpam pelo conflito?

A fortaleza é engraçada. Diz repudiar a guerra, a violência. É a favor da paz, da harmonia entre os povos. Mas o que fazem os de lá quando alguém coloca em risco nossa paz? Matam! É uma ótima forma de repudiar a violência, punindo os infratores com a morte.

Sorte que eles detêm tecnologia. Senão, todos os povos já teriam acabado com essa porra de fortaleza. Bando de filho da puta! Ninguém é aceito: ou nasce lá ou nunca será considerado de lá. É o jeito que eles acharam para manter a linhagem pura. Deve ser por isso que Max nunca quis voltar.

Percebo que a raiva que sinto dos povos mais uma vez toma conta de mim e vejo claramente a imagem do meu irmão me repreendendo: Não mantenha esse ódio dentro de você, isso te faz mal. E não generalize. Já que vai odiar, odeie quem toma as decisões que você julga erradas. Um povo não tem culpa das decisões que seu líder toma. Estão apenas vivendo, seguindo as regras que lhe foram impostas. O que eles podem fazer? Às vezes, nem sabem o que seus líderes fazem. Às vezes, temem se rebelar e acabarem mortos. Não seja injusta. Coloque em prática o que mamãe nos ensinou.

Eu odeio essa última parte. Eu queria ser como minha mãe: doce, alegre, leve... Fico pensando se eu seria assim, se não visse minha mãe morrer na minha frente, se não fosse torturada aos nove anos para revelar informações que eu desconhecia. É, acho que hoje eu seria uma garota de 19 anos doce, alegre e leve. Eu seria como ela.

Sacudo a cabeça e espanto as lembranças. Não gosto de lembrar de minha mãe. Sempre que o faço acabo revivendo sua morte.

Olho em volta e percebo que já amanheceu. O tempo passa rápido quando paramos para pensar na vida.

Volto para o alojamento e decido conversar com Diná, antes do treinamento. Ela já está acordada, perto da enfermaria. Os velhos têm mania de acordar muito cedo.

Ela não precisa se virar para notar minha presença.

– É cedo demais para perguntas, menina.

2323 - Sobreviventes do Caos (Distopia)Där berättelser lever. Upptäck nu