Sorriso

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"Você vai me ouvir quando eu falar?

Você sente a dor comigo?"

-Come To This, Natalie Taylor.

Pov Alan.

25 de Outubro de 2016.

Alan sentiu dor antes mesmo de abrir os olhos. Seu corpo inteiro parecia doer, em especial suas costas, e ele sabia bem o por quê, embora a dor fosse mais amena do que ele se lembrava.

Ele piscou algumas vezes, os olhos pesados pela sonolência. Quando ele finalmente concentrou seu olhar em um ponto, encarou um armário grande, as portas escuras com detalhes dourados. Ele também reparou que estava numa cama muito confortável, e sentiu que havia algo na pele de seus braços; algo frio, como pomada.

Ele também sentia algo envolvendo seu tronco; ataduras, provavelmente. Maethe havia cuidado dele enquanto dormia, pelo visto.

Alan sentiu algo em seu peito ao pensar nisso, e suspirou. Ela lhe causou dor e ele ainda não conseguia odiá-la de fato. Sentia raiva, sim, mas não parecia real. Era como sentir raiva do seu melhor amigo; apesar da grande irritação e mágoa, isso era impossível.

Alan mordeu os lábios ao pensar nas palavras Síndrome de Estocolmo, pela primeira vez. Não sabia muito sobre isso, mas segundo descreviam, o sentimento da vítima era algo como admiração.

Alan não admirava Maethe. Apenas achava que ela era confusa, sentimental e um pouco estranha, mas a maior parte das pessoas era assim. Talvez o que sentisse por ela fosse compaixão, mas não tinha certeza.

Ele se considerava alguém muito confuso, também.

Alguém bateu na porta do quarto, e ele respondeu um "Entre" baixo. Maethe entrou com um copo grande na mão, um líquido espumoso e esverdeado. Alguma vitamina, supôs.

-Fico feliz que esteja acordado. Parece um pouco melhor. -Ela comentou, sorrindo minimamente. -Dormiu bem?- ela se sentou na cama, encarando-o.

Ele reparou que ela parecia abatida; os olhos vermelhos e com olheiras, uma postura cansada, parecia até mais magra. Ela usada um vestido azul-marinho, que lhe servia perfeitamente. Apesar de tudo, ela ainda parecia bonita.

-Sim, eu acho. -Respondeu, a voz um pouco rouca. -Quanto tempo eu...?

-Três dias. Algumas horas por conta do medicamento, mas depois foi por conta própria - ele viu os dedos dela apertarem o copo. -Eu... Não sei o que falar sobre isso, porque foi tudo culpa minha, mas eu queria tanto que você conversasse comigo e... Ah, eu não sei. -Os ombros dela estavam caídos, e ela abaixou o olhar para o lençol da cama.

"Meus pais calaram a boca" continuou em tom baixo. "Bem, eles pararam de falar o tempo todo, mas é como se eu ainda ouvisse alguns sussurros... Nada que eu não possa ignorar", ela sorriu para  ele, como que o reconfortando.

-Por que você acha que... Ouve eles?- não sabia se deveria ficar quieto ou continuar a conversa, mas a segunda opção lhe pareceu boa.

Maethe balançou a cabeça.

-Não sei, talvez seja apenas um  tipo de maldição por tê-los matado ou sei lá, mas eu não quero falar deles- ela respirou fundo, o olhar ainda baixo, encarando as próprias pernas. -Faz diferença falar ou não sobre os mortos? Eles não voltarão para reclamar. -Ela deu de ombros, dispensando o assunto.

-Às vezes gostaria que pudessem só para vê-los de novo... -Comentou baixo, se lembrando do amigo e de alguns parentes próximos; parecia que ele só trazia a morte e desgraça para aqueles que amava, mas ele só havia percebido isso num sonho recente. Ele viu todos aqueles que lhe importaram um dia lhe dando as costas, indo embora como seu pai fez, e as lembranças lhe passaram como uma torrente.

Ele nunca soube se sonhar com o passado era algo bom ou ruim, mas sonhos como esse eram raros; normalmente, ele não sonhava. Às vezes ele agradecia por isso.

Ele viu que Maethe o observava com um ar preocupado.

-Você... perdeu alguém importante?

-Acho que todos nós perdemos coisas importantes. Até você, não é mesmo?- ela arregalou os olhos minimamente e ficou boquiaberta, mas se recuperou rapidamente, ajeitando a postura.

-É. Até mesmo eu tenho sentimentos, apesar de tudo- ela riu sem nenhuma graça. -Sempre ouvi as pessoas me chamarem de louca e psicopata, mas se eu realmente fosse assim, eu teria me livrado dos meus pais de um jeito que não levantasse suspeitas para mim. -Alan tremeu levemente pelo tom adquirido pela garota; parecia o de alguém que sabia demais, e todo o conhecimento lhe tornara insano.

"As pessoas acham que não temos sentimentos porque fazemos coisas impensáveis no conceito delas, mas elas nunca pensaram que temos nossos próprios motivos para isso? Que, na verdade, se estivessem em nosso lugar, fariam o mesmo que nós?". Ela sorriu com deleite, e Alan engoliu em seco, observando que ela ainda segurava o copo de vidro com força.

Reparando em seu olhar, Maethe lhe estendeu o copo, e ele o segurou entre os dedos um pouco hesitante.

-Bati algumas frutas com água, e misturei com uma vitamina. Vai te dar forças, mas acho que é um pouco agridoce- comentou, balançando levemente o corpo para frente e para trás, num ato um tanto infantil. Alan tomou um gole da bebida, e viu que ela tinha razão: ele sentiu o gosto de laranja e limão, mas de certa forma era muito bom.

-Obrigado- sussurrou, tomando mais um gole da bebida. Maethe mordeu os lábios num ato de frustração.

-Por que está me agradecendo? Você é idiota ou o quê?! Fui eu que fiz isso com você, Alan!- ela disse alto, quase berrando. -Por que você não me odeia ou grita comigo? Por que não diz logo isso e para de bancar o bonzinho? -havia uma súplica incomum em sua voz, uma pontada de desespero eminente.

Alan respirou fundo, encarando o copo em suas mãos, e reparou que tremia levemente. Ele encarou os pulsos, e viu as cicatrizes de dias atrás; quase havia se esquecido delas.

-Eu... Não acho que precise ouvir isso- disse seco, escolhendo as palavras. -Esse seu desespero todo, as vozes dos seus pais... Você já me parece bem atormentada. Não quero aumentar o seu fardo.

Além disso, odiar é um sentimento horrível, que eu prefiro não cultivar. Especialmente por você, pensou, bebendo mais um copo da vitamina.

Maethe o encara incrédula e surpresa. Parecia se surpreender com tudo que Alan fazia ou dizia, na verdade.

Ela mordeu os lábios, parecendo nervosa.

-Meu fardo é algo fácil de se suportar, depois que você se acostuma, mas acho que é assim com todo mundo.

-Nem todos suportam isso- disse num suspiro.

Maethe sorriu para ele.

-Acabei de perceber que essa foi a conversa mais longa que tivemos- comentou. -Acho que posso considerar isso um bom avanço.

Ele sorriu de lado para ela, e Maethe pareceu prender a respiração. Ele riu.

-Será um avanço se eu continuar acordado depois dela- disse irônico, e ela sorriu sem mostrar os dentes.

-Então de fato temos um avanço- ela lhe deu um beijo na bochecha e saiu, deixando Alan segurando um copo meio vazio e com um pequeno sorriso nos lábios.

Ele nem se lembrava mais da ideia da Síndrome de Estocolmo.

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Talvez Malan fique fofo por um tempo.... mas só um pouco :)

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Até quarta! :3

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