Capítulo 2

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Um homem andava calmamente em uma ruela da periferia de Londres. O caminho estava bem iluminado, as lâmpadas já eram presentes nos belos postes desde o início do século, e se modernizavam cada vez mais com as novas invenções. Assobiando uma música instrumental que não saia de seus pensamentos, ele rodava nos dedos um relógio antigo de pouco valor que havia herdado de seu pai.

Embora não houvesse ninguém, tinha a terrível sensação de estar sendo seguido. A cada passo olhava para trás, ainda que fosse inútil. Pegou o chapéu velho que usava, colocou-o contra o peito e apertou o passo: queria chegar logo em casa e dar um fim àquela estranha sensação.

As folhas caídas das árvores se moviam na rua com o vento que sussurrava ao passar pelas construções. As janelas fechadas eram um sinal de que a noite já havia chegado e as pessoas se recolhido ao conforto de suas camas. Cada barulho, por menor que fosse, o deixava em alerta. Estava tão focado em olhar para trás que só percebeu o obstáculo à sua frente quando se chocou com ele. O impacto contra o poste deixaria um galo feio em sua testa. Oh, Deus! Precisava sair dali logo.

Seu sangue gelou quando ouviu som de passos, engoliu em seco. No fim das contas seus sentidos não estavam tão errados como parecia. Uma gota de suor frio escorreu pelo seu rosto, pálido pelo susto, quando viu alguém se aproximar, usando uma capa preta. Não dava saber quem era, mas pelo volume do corpo decerto não era mulher. Olhou ao redor e viu um banco velho e os postes, não havia para quem gritar. Só tinha aquele relógio do pai e nenhum dinheiro, pensou em deixá-lo para trás e sair correndo, talvez isso despistasse o possível ladrão.

Encarou seu perseguidor novamente, mas ele não estava mais lá. Como diabos alguém poderia se mover tão rápido? Mal teve tempo de se virar para trás antes de ser atingido com um golpe forte que o fez cair ao chão, desacordado.

O homem foi jogado de joelhos no chão e o forte impacto fez com que acordasse. Ainda zonzo pelo golpe, mal conseguia se manter ereto. Onde estava? Não possuía dinheiro para ser dado em seu resgate. Será que seu raptor ainda não percebera isso?, pensou em meio ao puro desespero.


Abriu os olhos de repente e sua agonia aumentou quando se deu conta do saco de algodão preto que lhe cobria a cabeça. Quis arrancá-lo logo, contudo com os braços amarrados era impossível fazê-lo.

Sentiu um alívio tremendo quando alguém tirou o saco. O ar encheu seus pulmões como se tivesse ficado horas sem respirar, ainda que o tecido não o sufocasse. Quando suas pupilas se retraíram o suficiente para que pudesse enxergar, ele observou o lugar onde estava. Embora sua mente cogitasse os lugares mais imundos de Londres, certamente não era onde estava no momento. Nunca teria imaginado que a coisa macia sob os seus joelhos fosse um tapete oriental.

Pesadas cortinas vermelhas cobriam as janelas. A luz produzida por velas em belos castiçais de prata tremulava, dando ao ambiente um ar sombrio e causando sombras marcadas nos poucos móveis que compunham a decoração do lugar.

Um sapato sendo colocado contra o seu rosto forçou o homem a olhar para frente e encarar a bela mulher sentada em uma cadeira de veludo, bem adornada ao ponto de se assemelhar ao trono da rainha Vitória. Ao lado dela havia duas outras mulheres usando vestidos provocantes nada dignos de donzelas. Mas o que lhe chamou mesmo a atenção foi aquela que abaixava e virava o seu rosto com o sapato preto e pontiagudo. Ela era jovem, jovem até demais para alguém sentada naquela posição de comando. Com uma beleza capaz de fazer homens cometerem loucuras, tinha longos cabelos ruivos que caiam ao redor do seu rosto pálido em formato de coração, sobrancelhas finas e delicadas em um tom castanho claro e cílios negros enormes que só destacavam mais seus olhos...

O homem engoliu em seco, olhos vermelhos. As mãos dele começaram a suar frio e sentiu cada parte de seu ser tremer com uma sensação de medo terrível, ainda maior do que a vez em que fora seguido e trazido para cá. Algo na presença dela fazia seu sangue gelar: ainda que parecesse apenas uma mulher frágil, não se portava como uma.

Ela ergueu seu queixo com a ponta do pé e o fez encará-la. Olhar diretamente para aqueles olhos, ainda que por um breve segundo, o fez esquecer-se de qualquer medo que o afligia.

– Olá, qual o seu nome? – Ela sorriu ao curvar seu corpo na direção dele.

Aquela voz era a música mais bela que havia ouvido.

– Tho-Thomas, Piter Thomas. – O pobre mal conseguia falar ou mesmo desviar o olhar.

Ela o fitava profundamente, como uma serpente se preparando bote, e Piter, hipnotizado por seus olhos, não conseguia mover um único músculo, respirando com dificuldade. A presença dela conseguia ser extasiante e sufocante.

Sem mexer a cabeça tentou olhar ao redor. Uma porta de madeira trancada, uma mesa ao canto com alguns castiçais sobre ela, as janelas obstruídas; duas mulheres e um homem, provavelmente seu raptor, que não pareciam dispostos a ajudá-lo. Não havia para onde ir, mas a cada vez que encarava aqueles olhos menos tinha vontade de partir.

– Bom, acho que fez uma boa escolha, Elzor. – Disse ao homem, ainda encapuzado, parado atrás de Piter.

– Tudo para servi-la, Dária. – A voz do homem era grave e ecoava como um tambor enchendo todo o ambiente, e serviu para lembrar Piter o quão assustador tudo aquilo era.

Viu Dária se levantar com a enorme saia negra do vestido e vir na direção dele, em uma velocidade tão inacreditável que mal teve tempo de gritar antes de sentir presas pontiagudas lhe rasgarem a pele fina do pescoço e sentir seu sangue se esvair por onde ela sugava.

Instantes depois já não queria mais gritar, ou mesmo fugir. Sentia seu sangue começar a ferver e mal notou sua ereção involuntária. Queria agarrar aquela mulher e despi-la ali mesmo, contudo as amarras em seu braço o impediram de fazer qualquer movimento.

Embora estivesse louco de desejo pela desconhecida, sua virilidade não durou muito tempo, pois à medida que seu sangue era sugado sua visão ficava mais escura e sua força se esvaía... Até que Dária largou o corpo, que tombou caindo de lado no chão.

– Livre-se disso, Elzor. – Apontou para morto, como se este não passasse de nada, e sentou-se novamente em seu trono, limpando o filete de sangue que escorreu de seus lábios carnudos.


Do Sangue Ao Desejo (Desejos Sombrios 1) - DegustaçãoOnde as histórias ganham vida. Descobre agora