Revirei meus olhos e me afastei.

–Já volto.

Fui até a sala que servia como depósito de materiais de limpeza, abri o armário e peguei uma sacola lacrada com uniforme. Depois peguei o carrinho que as faxineiras costumavam usar e coloquei todos os produtos que Irina iria precisar.

Sinceramente, ser faxineira não era vergonha para ninguém. Era um trabalho digno, honesto. Mas para Irina isso seria o fim do mundo. Era trabalho da ralé, como ela já havia dito várias vezes.

Voltei para o escritório, empurrei a porta e parei atrás dela.

–Pronta para começar?

–Sim.

Ela se virou sorrindo, mas seu sorriso murchou ao olhar para o carrinho ao meu lado. Seus olhos ficaram arregalados e ela arfou, as narinas infladas. Levantou-se feito uma fera, a expressão transtornada.

–Que palhaçada é essa?

–Seu material de apoio.

–Você está brincando comigo não é? Isso... isso é um carrinho de limpeza!

–Exatamente. Tudo que você irá precisar para fazer uma boa faxina na concessionária. Isso aqui...

Ergui a vassoura e mostrei pra ela.

–É uma vassoura. Serve para varrer... você sabe não é?

Ela não respondeu, então continuei falando, explicando cada material, como se falasse com alguém vindo de outro planeta.

–Esse é o detergente. Não desperdice. Detesto isso. E esse...

Estendi a sacola pra ela.

–É seu uniforme.

Ela estava vermelha, seus olhos faiscavam, mas eu continuei com minha expressão impassível. De repente ela explodiu.

–VOCÊ FICOU MALUCO? BEBEU? FUMOU? ESTÁ QUERENDO QUE EU SEJA UMA FAXINEIRA?

–Qual o problema? Tem muita gente doida para trabalhar comigo sabia? Sabem que eu pago acima do mercado.

–O que você quer? ME HUMILHAR?

–E desde quando trabalhar é humilhante, Irina? Já ouviu dizer que o trabalho dignifica o homem?

–Aonde está vendo dignidade?

–Sabe... até uma prostituta tem sua dignidade. Ela não está roubando, não está matando, não está "LESANDO" ninguém.

Dei de ombros, ainda encarando a carranca de Irina.

–Está usando as armas que tem para garantir seu pão. É isso que as pessoas fazem para sobreviver Irina: lutam. Eu também comecei lá por baixo...e não me envergonho disso.

–EU NUNCA VOU LIMPAR CHÃO. NUNCA!

–Bom...você pode tentar ser modelo. Ha muitas vagas para a terceira idade. Ou pode fazer programas também. Como eu disse... pelo menos não estará roubando ninguém. Mas imagine só com quantos homens terá que se deitar, ou quantas horas terá que posar como modelo para ganhar o que deve em seu cartão de crédito?

Estendi o uniforme pra ela.

–É pegar ou largar.

Não sei precisar quanto tempo Irina ficou me encarando, os lábios tremendo. Mas a confusão era visível em seus olhos. No fundo ela sabia que eu queria apenas dar uma lição nela. Possivelmente, a possibilidade de ver suas contas pagas foi o que fez com ela estendesse a mão, pegando o uniforme.

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