- Vermelho e branco, as cores do nosso colégio! – o diretor parecia muito animado; aquela visão provavelmente era a parte mais empolgante da visita; era ali que ele ganhava os pais que ainda estavam indecisos. – Vamos?

Eles começaram a lenta descida pela escadaria de concreto e, por mais que a visão fosse muito privilegiada, Renata se pegou imaginando como seria subir todos aqueles degraus todos os dias pela manhã, com fome e sono.

Quando eles já estavam no plano, o diretor apontou para o primeiro prédio.

- Esse é o nosso ambulatório, com médicos de confiança e o melhor tratamento que a sua filha poderá receber, caso algo de pouca gravidade aconteça, como cólicas menstruais ou uma gripe. Caso algo mais sério ocorra, nós temos uma ambulância disponível 24 horas por dia para removê-la ao hospital público da cidade.

- O hospital público? – Renata olhou para o pai. – Vocês querem me matar nesse lugar, não é? Seria mais fácil colocar veneno de rato na minha comida!

- Ah, por favor, Rê, pare com o drama, nada de ruim vai te acontecer aqui – Laura respondeu pelo marido, abraçando a filha pelos ombros, que rapidamente se livrou do abraço.

- Você perdeu o direito de me chamar de Rê – ela resmungou, agindo como uma criança mimada.

Eles passaram pelo prédio do ambulatório e pararam na praça da fonte. Renata observou que a base dos anjos e querubins havia sido pichada com nomes e anos, como "Hugo 2006" ou "Gisele esteve aqui, 04/08/2008".

- Nós temos três prédios dormitórios. Um para os garotos, outro para as garotas e o último para os professores e funcionários. O padre e as freiras ficam do outro lado da propriedade, junto à capela e ao refeitório próprio. O prédio um abriga os funcionários, onde eu moro – ele apontou para o primeiro prédio, que ficava de frente para o ambulatório –, o prédio dois é o dos meninos e o três das meninas. São oito andares divididos em sala comum, capela e uma pequena cozinha com as máquinas que eu mencionei mais cedo. Os andares estão divididos em 18 dormitórios, com banheiros próprios por andar. Os dormitórios vão das meninas mais velhas nos primeiros andares até as calouras nos últimos. Como você é ingressante do terceiro ano do Ensino Médio, provavelmente vai ficar entre o primeiro e o segundo andar, o que é ótimo, já que não temos elevadores.

- Uau. Realmente... Agora a minha vida melhorou muito! –Renata resmungou, recebendo um olhar severo do pai.

- Bom, agora eu e seus pais temos alguns assuntos particulares para discutir, então vamos voltar ao prédio administrativo e deixá-la se instalar em seu dormitório e conhecer a sua nova colega de quarto.

- Colega de quarto? – Renata olhou desesperada para a mãe. – Eu vou dividir o meu quarto com uma desconhecida?

- E o banheiro do andar com outras 30 – Laura respondeu, sem qualquer tipo de remorso. – Talvez isso te ensine a ser menos egoísta.

- A inspetora Silva irá passar o número do seu quarto e as suas malas já devem estar lá – o diretor entregou um pedaço de papel para Renata, que o agarrou com as mãos trêmulas. – Aqui está o seu horário durante a semana de recepção. Pode se instalar com tranquilidade e, quando estiver pronta, nos encontre na sala 22 do prédio administrativo para que você possa se despedir dos seus pais.

- Boa sorte, querida – o sr. Vincenzo desejou, sério.

Renata poderia ser jovem demais para perceber, mas o coração do empresário estava em pedaços por deixá-la ali, sabendo que eles passariam os próximos meses separados. Mas ele tinha que fazer algo para que a filha não se tornasse uma delinquente juvenil. As primeiras desobediências foram até engraçadas e muito bem elaboradas, mas a última da herdeira havia sido perigosa e ilegal e não poderia passar em branco; se ela continuasse sem limites e sem disciplina daquele jeito, Giuseppe não se surpreenderia em ter que ir visitá-la no presídio, ao invés de um internato.

- Até daqui a pouco, filha – Laura sorriu com certo pesar. Por mais que ela soubesse que aquilo era o certo a se fazer, ainda não tinha certeza se concordava com a decisão do marido; sabia que a filha precisava de um corretivo, mas acreditava que algo poderia ser feito com ela dentro de casa.

Os olhos de Renata se encheram de lágrimas verdadeiras quando a sua família lhe deu as costas e recomeçou a conversar com o diretor daquele lugar infernal. Porém, ela era Renata Vincenzo e não uma garotinha chorona qualquer. Com os óculos escuros camuflando a sua expressão de tristeza, ela marchou em direção ao prédio três, abrindo a porta e sendo recebida por uma lufada de ar-condicionado muito bem-vinda.

A sala comum estava vazia, com apenas uma mulher beirando os 30 anos atrás de um balcão, mascando chiclete e digitando algo no computador que possuía. Os sofás eram de veludo no tom de um vermelho vivo, rodeando um tapete branco e felpudo. A grande TV de plasma estava desligada, para combinar com o silêncio daquele lugar.

- Hm, oi – Renata foi até a mulher, um pouco incerta do que fazer. – Meu nome é Renata. Eu sou nova aqui.

- Sobrenome? – a mulher perguntou, sem levantar os olhos, e Renata pôde reparar na plaqueta em cima do balcão que dizia "Silva".

- Vincenzo.

Silva, que tinha o tom de pele bem escuro e pintava o cabelo de loiro platinado, tinha três dedos das raízes pretas e uma expressão de poucos amigos no rosto oleoso. Renata queria poder lhe dizer que se ela não fosse cuidar do cabelo era melhor nem pintá-lo, mas achou melhor ficar calada.

- Segundo andar, quarto 27 – a mulher subiu os olhos escuros pela primeira vez, entregando uma chave magnética para a garota. – Não use a segunda cabine do banheiro e nem pense em fumar dentro do quarto. As escadas ficam no final do corredor.

Renata pegou o cartão e concordou com a cabeça, passando pela mulher, pela pequena capela e pela cozinha bem equipada antes de encontrar as escadas. Os degraus eram íngremes e de pedra, e ela os subiu de dois em dois. Quando chegou ao segundo andar, os seus pulmões pareciam que iam explodir, e ela de fato agradeceu por não ser uma caloura.

O quarto 27 ficava no final do corredor à direita, e a janela do andar dava vista para o prédio dos funcionários e a praça da fonte – não era uma boa vista, mas era dos males o menor.

O cartão magnético era rosa com alguns detalhes floridos, e Renata o enfiou com força na trava eletrônica, ouvindo o clique da porta. Irritada, ela a abriu com força e observou as suas malas em cima de uma cama de solteiro simples. E, em cima da outra cama, Lívia pendurava um pôster do AC/DC na parede.

Ela se virou ainda com os fones de ouvido, balançando a cabeça com um sorriso divertido nos lábios.

- E aí, Barbie! – ela berrou, mesmo que o quarto estivesse silencioso. – Acho que seremos colegas de quarto esse ano!

 – Acho que seremos colegas de quarto esse ano!

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